Pena de morte (2)

Alguns comentadores na blogosfera defendem a actuação da polícia dizendo que salvou a vida dos reféns. Mas há que notar que um assaltante não é um assassino. Nada move os assaltantes contra os reféns. A função dos reféns para um assaltante é de servir de barreira entre ele e o seu dinheiro roubado, e a polícia. Não é racional para o assaltante diminuir o tamanho dessa barreira, assassinando reféns.

O único efeito positivo para o assaltante que resulta de assassinar um refém, é o de tornar a ameça sobre os restantes reféns mais credível, fortalecendo a barreira. Mas o assaltante só retira este benefício se tiver na sua posse três ou mais reféns. Se apenas possuír dois, como no caso de ontem, assasinar um deles tem um efeito nulo na credibilidade da ameaça, na medida em que a polícia sabe que o assaltante não tem qualquer incentivo a assassinar o último refém, ficando desprotegido. Ao aceitar libertar o terceiro refém, os assaltantes revelaram não haver qualquer ameaça de vida sobre os restantes dois. O assassinato dos assaltantes foi em vão.

21 pensamentos sobre “Pena de morte (2)

  1. Carlos Duarte

    Porra, já não chegava o JM…

    Não, Carlos, está enganado.

    A ideia de manter um refém é, de facto, de manter uma ameça permanente de força letal. Se a polícia vier me prender, eu mato. É indiferente se é um refém ou 200, o tipo de ameaça é semelhante. A diferença está em que é mais “fácil” dominar e manter um refém do que 2 ou 10 ou 200.

    É óbvio que a sua argumentação de que, ao ficar só com um refém, o sequestrador eventualmente fica à mercê da exaustão é verdadeira. Mas então para quê mantê-lo? Mantém-no porque existe SEMPRE a possibilidade da vingança, do matar porque não me fizeram a vontade. Depois venham e prendam-me que não me interessa. O problema é avaliar se o sequestrador irá sucumbir à exaustão ou à tensão nervosa primeira. E, em caso de dúvida, não se pode arriscar.

    O importante em qualquer operação de resgate é a protecção dos REFÉNS. Os sequestradores vêm sempre em segundo e se, a qualquer instante, existindo dúvida sobre se os sequestradores se vão entregar, é possível salvar os reféns abatendo o sequestrador (e sendo o sequestro violento e com ameaça aos reféns, como era o caso), abate-se.

  2. Carlos Guimarães Pinto

    Caro Carlos Duarte,

    Assassinar por vingança o último refém serve de muito pouco ao assaltante. No melhor dos casos triplicará a sua pena de prisão. No pior dos casos, deixa-o sem barreira de protecção e passando para fora a ideia de que tem poder de fogo e está disposto a usá-lo, justifica uma acção violenta da polícia que pode acabar com a sua morte.
    Pareceu-me que ontem o momento em que a vida dos reféns correu maior perigo foi quando foi disparado o tiro pela polícia que terá passado a centímetros do corpo da refém. De resto, acredita que um sequestrador que deixe saír uma refém por esta ter um ataque de ansiedade é capaz de assassinar?

  3. Está a atribuir uma racionalidade excessiva a uma situação inerentemente irracional!

    É prematuro fazer juízos até conhecer o estado em que os assaltantes estavam quando libertaram os últimos reféns. Suspeito de um final em desespero hollywoodesco.
    É aliás a desespero e não ao calculismo que mostra que se assemelha toda a indecisão e comportamento dos assaltantes. Não é um filme é a tristeza da miséria.

    A policia teve um sucesso com a libertação dos reféns com saúde mas porquê alvejar os assaltantes sem qualquer protecção humana ou outra a não ser que estes tenham reagido desesperadamente??

    Temo generalizações xenófobas á grande e valiosa comunidade brasileira em Portugal…

  4. bruno costa

    afinal aquilo durou 8 horas e este tipo resolvia a situação em 5 minutos. a policia portuguesa é muito incompentente, então não sabe que só havendo dois reféns eles nunca iriam fazer nada aos reféns.

  5. A única lógica possível é esta:

    – um assaltante incorre em risco de captura; esse risco é agravado para outros níveis caso haja vidas inocentes em perigo, e aqui cabe separar o valor de uma vida inocente do valor de uma vida pertencente a alguém que voluntariamente (com a agravante de não ser cidadão nacional podendo até invocar pretensas atenuantes como a crise, as dívidas, etc. e sim um imigrante que largou o país de origem e veio para cá viver à conta das benesses dos socialistazinhos de duas caras) decide lançar essa vida à sorte dos dados

    – um inocente tem de ser protegido, ou em alternativa ter o direito de se proteger a si mesmo, de assaltantes

    – numa situação de escolha obrigatória, deve escolher-se o inocente em detrimento do assaltante; quem fez a escolha merece a presunção de tê-la feito lúcido, ponderado e objectivo

    – o problema dos humanistas é ficarem à mercê dos não-humanistas. Mas eu “tenho de estudar a guerra para que o meu filho possa estudar matemática”.

  6. O equlíbrio de nervos e tensão mudou entre o momento em que a refém foi libertada e as horas posteriores. Daí que é bem provável que tenha havido objectividade na decisão de atirar. Imagine-se que os sequestradores cediam à situação e entrava o esquema do perdido por cem, perdido por mil.

  7. lucklucky

    “Pareceu-me que ontem o momento em que a vida dos reféns correu maior perigo foi quando foi disparado o tiro pela polícia que terá passado a centímetros do corpo da refém. De resto, acredita que um sequestrador que deixe saír uma refém por esta ter um ataque de ansiedade é capaz de assassinar?”

    O maior perigo foi estar uma arma apontada á(s) cabeça(s) dos reféns.
    Primeiro a lógica não funciona sempre. Há quem queira ser martir a la Bonnie & Clyde quando já não vê hipóteses de saída.
    Por outro disparo acidental de armas compradas muitas vezes por tuta e meia no mercado negro não é algo extraordinário, para mais numa situação de tensão.

  8. vasco

    Com o devido respeito, esta reflexão faz lembrar os comentários de TV dos especialistas em crime no filme Natural Born Killers.

    O problema aqui não é o da falta de lógica, é o do APARENTE excesso de lógica de CGP. Parte-se da premissa de que todas as acções dos assaltantes obedecem a um raciocínio impecável. Ora, não é preciso sequer tomar os assaltantes por idiotas para perceber que isso não faz sentido. As pessoas não funcionam assim, sobretudo em momentos de stress.

    Mas se é para insistir nestes jogos académicos da lógica, também me parece que CGP é pouco imaginativo e que o seu argumento tem uma falha grave. Um refém pode ser usado para aumentar a ameaça sobre ele próprio sem que se o perca como barreira. Já pensou nisso? Imagine-se que os assaltantes davam um tiro no pé do refém… Enfim, se o argumento de CGP cai por terra com um cenário em que há apenas um refém, creio que é escusado discutir o cenário dos dois reféns. Mas é sintomático que João Miranda se tenha interessado por este argumento.

  9. Ó Carlos eu também sou contra a pena de morte, acredite. No entanto, e como escrevi no meu blogue, existem situações em que ela se justifica: antes morrer um criminoso que um inocente. Toda essa conversa dos benefícios e mais não sei o quê fica muito bem em teoria (vocês até têm uma label para isso) mas a verdade é que nem sempre os assaltantes são racionais, principalmente ao fim de 8 horas de sequestro: tudo pode acontecer. Acho que tudo isto poderia ter acabado de outra forma, preferia vê-los condenados a uns bons anos de prisão à simples morte, no entanto, e dadas as circunstâncias a execução foi inevitável. Proponho-lhe um exercício: coloque-se no lugar dos polícias primeiro e no dos sequestrados depois – não é demagogia, é apenas um exercício mental.

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  11. Carlos Guimarães Pinto

    Caro Tiago, o que pensa da hipótese de os ter deixado fugir com o dinheiro e sem reféns?

  12. Nelson Gonçalves

    Estimado,

    “Não é racional para o assaltante diminuir o tamanho dessa barreira, assassinando reféns.”

    Estamos a falar de dois indivíduos que assaltaram o único banco que não tinha dinheiro nem “caixa”. Teoria de jogos não me parece que seja o forte deles…..

  13. Jose Simoes

    Citando

    “Se apenas possuír dois, como no caso de ontem, assasinar um deles tem um efeito nulo na credibilidade da ameaça”

    Se possuir 3 reféns, assassinar 1 tem efeito nulo porque isso o põe na condição de ter 2 reféns, o que já se provou ter efeito nulo (ver linha anterior)

    Se possuir 4 reféns, assassinar 1 tem efeito nulo porque isso o põe na condição de ter 3 reféns, o que já se provou ter efeito nulo (ver linha anterior)

    Se possuir n reféns, assasinar 1 tem efeito nulo porque isso o põe na condiçõa de ter (n-1) reféns, o que já se provou ter efeito nulo (ver linha anterior)

    Ou seja, provei por indução matemática que assasinar 1 refém tem sempre efeito nulo qualquer que seja o número de reféns.

  14. Carlos Duarte

    Caro Carlos (GP),

    “Assassinar por vingança o último refém serve de muito pouco ao assaltante. No melhor dos casos triplicará a sua pena de prisão. No pior dos casos, deixa-o sem barreira de protecção e passando para fora a ideia de que tem poder de fogo e está disposto a usá-lo, justifica uma acção violenta da polícia que pode acabar com a sua morte.”

    Não tem a ver com lógica, tem a ver com o domínio da situação. Se a lógica imperasse, nunca tinham havido reféns… ou acha que algum assaltante com 2 neurónios pensaria que sairia daquela situação livre?

    O refém é um “símbolo” de poder por parte do sequestrador. Ele sabe que enquanto mantiver o refém (e não se expor, que não foi o caso…) está a salvo de uma intervenção mais violenta da polícia. Em bom português, ele tem a faca e o queijo na mão. E porquê? Porque existe SEMPRE a ameaça latente de ele matar o refém. Vc. diz que ele não ganha nada com a morte do refém… na realidade ganha, marca uma posição e, psicologicamente, permanece no controlo da situação (i.e. “Estão a ver? Matei-o COMO DISSE QUE FAZIA, agora podem vir buscar-me PORQUE EU DEIXO”). Este tipo de raciocínio é quanto basta para, num momento de tensão / irritação ele executar (e aí sim, é uma execução) o refém.

    “Pareceu-me que ontem o momento em que a vida dos reféns correu maior perigo foi quando foi disparado o tiro pela polícia que terá passado a centímetros do corpo da refém.” “De resto, acredita que um sequestrador que deixe saír uma refém por esta ter um ataque de ansiedade é capaz de assassinar?”

    O problema não foi tanto o tiro ter passado a uns centimetros da refém (que é um risco calculado e pequeno para quem é devidamente treinado, como aquele par de homens concerteza era) mas não terem sido disparados os dois tiros em simultâneo.

    “De resto, acredita que um sequestrador que deixe saír uma refém por esta ter um ataque de ansiedade é capaz de assassinar?”

    Acredito perfeitamente. Como disse anteriormente tem a ver com controlo. Um sequestrador que deixa sair um refém faz-lo POR SUA INICIATIVA (i.e. mantém o controlo). Agora, eu não estava lá, mas pelo que vi e li, os sequestradores estavam-se a preparar para sair e aquilo “empancou” e gerou-se alguma tensão. Numa situação dessas, uma pessoa desesperada faz QUALQUER COISA para manter o controlo. E isso inclui enfiar uma bala na cabeça do refém.

  15. joao

    “O assassinato dos assaltantes foi em vão.” Tem a certeza? Ou é algo que atira para o ar a ver se alguém apanha?

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  17. Luis

    Isso é verdade se acharmos que vale a pena correr o risco de morte dos reféns, por mais pequeno que seja, pela protecção da vida dos criminosos, o que na minha opinião é totalmente incorrecto.
    Eu acho que a partir do momento em que a vida dos reféns é colocada em risco, por menor que seja esse risco, já era justificado um balázio em cada um dos assaltantes (isto claro, desde que mandar esses balázios não aumentasse o risco de morte dos reféns).

  18. Ó Carlos estamos a roçar o absurdo. Agora quer que deixemos criminosos fugir sem punição nenhuma? Havia de ser lindo. Agora vamos todos aos bancos e mantemos dois ou três reféns que passadas umas horas fugimos com dinheiro!

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