A questão UBER é muito interessante porque é uma consequência concreta em um sector industrial específico de fenómenos que se estão a passar em vários outros, como por exemplo os media, com uma intensidade e disrupção semelhantes.
O que a plataforma Uber e outras semelhantes permite é a desintermediação e a certificação não centralizada. A primeira é um impacto que se está a fazer sentir há 20 anos em todas as indústrias que dependem de distribuição. A segunda, mais estrutural, vai-se sentir cada vez mais, e tem um impacto profundo nas políticas públicas e é o aspecto mais importante do caso “Uber”. Durante décadas a discussão sobre a certificação em algumas atividades económicas centrava-se na dicotomia estado/sociedade civil. Em algumas atividades existe valor na garantia à priori que de que o fornecedor tem a capacidade e idoneidade para o ser. O consumidor não tem uma forma simples de verificar pelos seus próprios meios sem experimentar e logo existe valor na certificação da qualidade do fornecedor. As guildas/ordens/corporações são a resposta espontânea da sociedade civil. Durante o século XX o Estado meteu-se cada vez mais na certificação, ou dando força monopolista as certificações privadas ou substituindo-se aos certificadores. A questão política era como o Estado devia intervir nestes sectores, se directa ou indirectamente.
A evolução das tecnologias à volta da internet e mobilidade mudam a discussão de maior ou menor papel do Estado para maior ou menor descentralização da certificação. Quem deve certificar que um fornecedor de serviços de transportes de passageiros privado tem ou não condições para o fazer? Preferimos um conjunto de burocracias e regras com o objectivo de garantir que o fornecedor tem qualidade ou confiamos mais na opinião de outros consumidores como nós? Na media, no turismo e nos transportes a certificação descentralizada parece inevitável. Não é de estranhar que estatistas tenham receio do que vem aí. Agora são estas atividades a verem os consumidores a prescindirem do papel do Estado. Mais cedo ou mais tarde serão outras como a educação e a saúde.