Da Perseverança

Um colega meu iniciou o Domingo passado tentando votar. Apesar de não ter mudado de residência, foi informado que teria de votar noutro local. Deslocou-se ao novo local, onde passou uma enormidade de tempo numa fila para saber o número de eleitor e respectiva mesa de voto. Quando chegou a sua vez, o senhor que operava o único computador disponível disse-lhe que um problema informático estava a dificultar a obtenção dos dados. Voluntarioso e perseverante, o meu colega foi para trás do balcão e ajudou o senhor a resolver o problema informático. Obteve finalmente os dados necessários. Tinham entretanto passado mais de três horas. Dirigiu-se à respectiva mesa de voto. Votou em branco.

O “segundo” Cavaco

Agora que Cavaco Silva foi eleito para o seu segundo mandato como Presidente da República, parece haver um número relativamente vasto de pessoas que espera que ele “ponha na linha” o Governo. É uma expectativa que não se compreende. É verdade que, na campanha, Cavaco terá prometido uma “magistratura actuante” (a pessoa responsável por este slogan merecia viver para a eternidade num país governado por José Sócrates), mas nada garante que daí venha algum bem. Aliás, se olharmos para os últimos cinco anos, para o mandato que Cavaco Silva realizou, os únicos sinais que se vislumbram são de que pouco de positivo pode ser esperado. Durante cinco anos, Cavaco Silva viu o Primeiro-Ministro mentir (ao Parlamento, aos cidadãos), ser envolvido em negócios obscuros, ignorar a situação dramática do país, em resumo, arrastar a vida política portuguesa para um lamaçal cada vez menos digno. Durante esses cinco anos, Cavaco parece não ter achado que o “regular funcionamento das instituições” estava ameaçado, parece ter achado que seria melhor manter o Governo no poder do que provocar uma crise política, o que, dado o particular grau de gravidade a que as coisas chegaram, me parece evidenciar pobres faculdades de julgamento. Dirá o leitor que Cavaco apenas manteve o Governo no poder porque estava no seu primeiro mandato, e provocar uma crise política arriscaria a sua recondução no cargo; agora, reeleito, sentir-se-á livre para tomar a opção correcta (aparentemente, é esta a opinião dos dirigentes do PSD, que salivam com a perspectiva de governar de mãos atadas. Cada um tem as manias que tem). A ser verdadeira, não me parece que esta hipótese seja mais abonatória de Cavaco. Entre um presidente com mau julgamento, e um presidente com bom julgamento mas disposto a sacrificar o país em benefício dos seus interesses pessoais, não vejo grande diferença. Seja qual for o verdadeiro “primeiro” Cavaco, não faz antever nada de bom vindo do “segundo”.

Números esmiúçados

E integrais, no blog Os Comediantes.

Há dez anos, na reeleição de Jorge Sampaio, a abstenção teve níveis semelhantes mas os cadernos eleitorais de então detinham um erro de perto de 8% em relação aos votantes reais – ao contrário de ontem, onde a votação dispunha de cadernos eleitorais “limpos”, com um desacerto que não deveria ultrapassar o nível de 1,5%.

Escreve Carlos Abreu Amorim, é a campanha da desinformação que já ontem tinha sido levada a cabo por Pedro Adão Silva e Luís Delgado na SIC Noticias. Nunca é demais referir: em 2001, estavam inscritos 8.950.905 eleitores. Em 2011 o número de inscritos, após a “limpeza” dos cadernos eleitorais a que CAA faz referência, disparou para 9.629.630. São só 678.725 eleitores a mais. Portugal deve ser dos países no mundo com maior crescimento populacional. Ou isso, ou desde 2008 terão sido acrescentados cerca de 600 mil eleitores por via do recenseamento automático e a “limpeza” dos cadernos eleitorais deixou muito a desejar.

Energia eólica prejudica candidato progressista

Após, nos anos 60, um amargurado Manuel Alegre perguntar insistentemente novas do seu País ao vento, que olimpicamente o desprezava e nada lhe dizia, a ventania ciclónica que se fez sentir ontem em todo o território continental veio enfim condescender em dizer algo ao velho combatente de mil lutas, apenas para lhe dizer que não vale meio Cavaco e, pior, que vale apenas quatro palhaços madeirenses. Manuel Alegre reagiu de imediato, ainda que continuasse manifestamente agrilhoado ao seu confrangedor papel de apoiado pelo BE e pelo PS. “Este vento maldito resulta da alterações climáticas provocadas pelo imperialismo desenfreado dos ianques e pelo neo-liberalismo da banca que financia as petrolíferas”, explicou, antes de acrescentar que, “porém, a ventania prova o acerto na aposta do engenheiro Sócrates em energias renováveis, nomeadamente na energia eólica”.

In Inimigo Público.

Que grande surpresa!

O PPM começa a responder à dúvida que eu e certamente muito outros temos. E se se verificar que foi o governo que patrocinou as informações – como Cavaco Silva evidentemente desconfia – serão muito interessantes de acompanhar as cenas dos próximos capítulos. Porque Cavaco, agora e para pesadelo de Sócrates, só tem de fazer contas perante si próprio. Até perante a História Cavaco deve ter a mesma posição de Churchill: será benigna porque a escreverá ele. (Mais uns livros da autobiografia política nos esperam.)