Austeridade clássica versus Neoausteridade

A austeridade clássica equilibrava as contas cortando no rendimento de trabalhadores do sector privado e funcionários públicos. A neoausteridade corta na qualidade dos serviços públicos.

A austeridade clássica reduziu o salário de professores, mas aumentou a qualidade do ensino de acordo com os ranking internacionais. A neoausteridade repos o salário dos professores, mas fechou algumas das melhores escolas da rede pública.

A austeridade clássica reduziu o salário dos maquinistas do metro. A neoausteridade devolveu o salário aos maquinistas sacrificando a manutenção das carruagens e aumentando os tempos de espera.

A austeridade clássica baixou o salário dos funcionários da protecção civil. A neoausteridade devolveu-lhes o salário, mas reduziu as verbas para combate a incêndios.

A austeridade clássica aumentou o horário de trabalho de médicos e enfermeiros para 40 horas para poder continuar a oferecer o mesmo serviço sem contratar mais. A neoausteridade sacrificou a qualidade do Sistema Nacional de Saúde para devolver as 35 horas a médicos e enfermeiro.

A austeridade clássica usava orçamentos rectificativos para baixar a despesa quando a receita não chegava. A neoausteridade recorre às cativações para fazer logo quatro orçamentos de uma vez para ir podendo aplicar o mais apropriado ao longo do ano.

A austeridade clássica reduziu o investimento público ao patamar mínimo necessário para garantir a manutenção da infraestrutura existente. A neoausteridade conseguiu ir mais longe e baixar o investimento público para baixo desse patamar.

A austeridade clássica cortava nas pessoas para salvar bancos. A neoausteridade também.

A austeridade clássica foi desenhada para que todos sentissem na pele os efeitos da bancarrota. A neoausteridade foi desenhada para agradar a uma maioria de eleitores.

Ironicamente, a neoausteridade veio provar definitivamente que dois dos argumentos mais utilizados por socialistas nos últimos 10 anos estavam errados. O primeiro é de que o investimento público é condição necessária para o crescimento. Como se viu nos últimos trimestres desde 2016, Portugal conseguiu ao mesmo tempo as maiores taxas de crescimento económico desde a crise e os níveis mais baixos de investimento público desde que há dados publicados. Por outro lado, a popularidade das medidas neoausteritárias, em relação às da austeridade clássica, vieram comprovar outra coisa que os socialistas sempre negaram: as pessoas preferem mais rendimento a mais serviços públicos. Sendo verdade que quase todos esses euros acabam por ir para impostos indirectos, a verdade é que a política de devolução de rendimentos à custa de cortes nos serviços públicos foi popular. Se os portugueses aceitam sacrificar a qualidade dos serviços públicos por mais uns euros ao final do mês é porque os liberais sempre tiveram razão: há estado a mais em Portugal.

9 pensamentos sobre “Austeridade clássica versus Neoausteridade

  1. JMS

    Ficámos a saber ontem que o governo declarou o estado de calamidade pública. Com quase 2 anos de atraso.

  2. Este governo nao passa de um sindicato de voto, dá tudo em termos de salarios e pensoes, mesmo as milionárias, para tirar em tudo o que é qualidade de serviço, manutençoes, atrasos nos pagamentos a fornecedores, etc., etc. E a dívida externa sempre a crescer, o saldo negativo da balança comercial sempre a crescer. E um PR a bater palmas…tipo menino do coro!!!

  3. O PR não bate palmas porque é “menino do coro”, mas porque integra o “sindicato de voto”. É evidente, desde 2011, que o “sindicato de voto” ao serviço do qual este governo está inclui todos os “senadores” da nossa ditosa pátria, de capitães de Abril a ex-ministros do Salazar, de ex-bombistas a ex-banqueiros, da claque do Cavaco, à quadrilha do Soares. Aliás, cada vez mais me convenço que o Sampaio da Nóvoa foi um “homem de palha” que apenas se candidatou para levar aqueles que tinham jurado que nunca votariam num “cata-vento de opiniões erráticas” (como eu) a colaborar na eleição do “Grande Pacificador”.

  4. Gabriel Orfao Goncalves

    Há Estado a mais e Estado que não presta.
    A prova está em que os funcionários públicos não desistem da ADSE. Eles lá sabem por que razões os serviços de saúde oferecidos pelos privados são melhores do que o SNS.

    Já perguntei a vários funcionários públicos para os quais “a saúde não pode ser um negócio!” se, entre ter de escolher a ADSE e falecer, qual dos “negócios” preferiam. Ainda nenhum preferiu falecer.

    http://www.esquerda.net/artigo/estado-paga-privados-cem-milhoes-em-cirurgias/43001

    É uma sangria de dinheiro… para os privados! E as pessoas não se deixam falecer de maneira nenhuma, já viram? A lata!

  5. “A austeridade clássica aumentou o horário de trabalho de médicos e enfermeiros para 40 horas para poder continuar a oferecer o mesmo serviço sem contratar mais. A neoausteridade sacrificou a qualidade do Sistema Nacional de Saúde para devolver as 35 horas a médicos e enfermeiro.”

    O regime horário dos médicos funciona de maneira diferente, com legislação diferente das dos funcionários públicos normais; se percebo bem, creio que passaram para 40 horas ainda no governo Sócrates e nas 40 horas continuam.

  6. Gabriel Orfao Goncalves

    Há uma discussão engraçada a decorrer aqui:

    https://sol.sapo.pt/artigo/576309/pib-portugal-cresce-acima-da-media-da-zona-euro-ha-nove-meses

    limitei-me a fazer uma pergunta muito simples: se, chegado o fim do ano, a dívida pública for, em % do PIB, superior ao que era no término do ano passado, concordam que vamos no mau caminho?

    Uns não respondem. Outro até diz que, por virtude da almofada financeira que este Governo está a criar (provavelmente para fazer face a outro Pedrógão Grande), não há problema em que a dívida bruta aumente.

    É ler para crer o que escrevem actualmente os avençados da Rataria.

    Carlos Guimarães Pinto, excelente post, como sempre!

    Acrescentava esta:

    A austeridade clássica ia aos mercados endividar-se a juros tendencialmente cada vez mais baixos para amortizar dívida antiga com juros mais elevados.
    A neoausteridade vai aos mercados endividar-se para fazer face… a despesa corrente.

    Há um anónimo no JdNegócios que afixa regularmente este comentário: “Party like it’s 2007”. Ora bem!…

    O “virámos a página da austeridade” vai sair-nos muito, mas muito caro.

  7. ESTE GOVERNO SOU EU
    Durante a quarentena que me impus apenas isto vai saltitando:
    -Portugal aqui, agora e como sempre somos nós os bons dos portugueses,
    e os portugueses como sempre, o espelho dos governantes que suportam-

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