Como ser xenófobo? Lição número 1.

A xenofobia é um instinto básico como a inveja ou o medo. Há motivos evolucionários para estes instintos básicos. Mas nem só de instintos básicos se faz o ser humano. A cultura tem uma forma de causar impacto e aliviar algumas destas heranças biológicas. Nós aprendemos a não ter medo de automóveis, comboios ou aviões que assustariam um dos nossos antepassados se fossem transportados no tempo para o presente. Apesar da popularidade do socialismo em muitas sociedades, também aprendemos (com esforço) a não sentir inveja e reconhecer que uns podem obter mais bens do que nós sem que isso signifique estar-nos a privar de alguma coisa. Também aprendemos a livrar-nos da xenofobia e do racismo.

Mas alguns leitores certamente não terão tido acesso à educação certa ou não tem a capacidade para domar esse instinto. Para o leitor para quem esse instinto seja muito forte, o melhor que tem a fazer é direccioná-lo de forma politicamente correcta para que os outros não o julguem por isso. Em alguns países mais, chamemos-lhe assim, “desenvolvidos”, estão a pensar criar bonecas sexuais com a forma de crianças para que os pedófilos possam aliviar os seus “desejos” (pessoalmente, acho que uma dose de cianeto funcionaria muito melhor, mas eu não sou especialista no assunto). Em Portugal a boneca de plástico dos xenófobos de armário são os turistas.

Daí o objectivo desta lição: como ser xenófobo de forma politicamente correcta sem afectar a sua imagem pública? A primeira lição é: escolher o alvo. Alguns exemplos abaixo sobre a forma certa e errada de extravasar a sua xenofobia:

Errado

“Ninguém quer ter uma família de ciganos no andar de cima: fazem muito barulho, não cumprem as regras do condomínio, acumulam lixo à porta, e entram e saem a qualquer hora do dia com malas de produtos que vendem nas feiras. É preciso limitar o número de apartamentos que famílias ciganas podem alugar em Loures.”

Certo

“Ninguém quer ter um apartamento com turistas no andar de cima: fazem muito barulho, não cumprem as regras do condomínio, acumulam lixo, e entram e saem a qualquer hora do dia com malas que trazem para as férias. É preciso limitar o número de apartamentos que podem ser alugados a turistas em Lisboa.”

Note-se como o leitor xenófobo pode exibir o seu preconceito à vontade se o direccionar para o alvo certo. É verdade que há muitas famílias ciganas que exibem esse comportamento, mas a maioria não o faz. Assim como os turistas. Mas se a primeira generalização é preconceito, a segunda já é xenofobia socialmente aceitável porque toda a gente sabe que ingleses e alemães são uma espécie barulhenta. Vejamos outro exemplo:

Errado

“Os imigrantes estão a destruir os centros das cidades: onde antes havia lojas históricas onde o meu bisavô comprava as suas bengalas e chapéus de coco, hoje estão instaladas lojas de chineses, indianos ou africanos, onde esses imigrantes compram a sua comida barata, descaracterizando as zonas históricas”

Certo

“Os turistas estão a destruir os centros das cidades: onde antes havia lojas históricas onde o meu bisavô comprava as suas bengalas e chapéus de coco, hoje estão instaladas lojas de souvenirs e fast-food, onde turistas compram álcool barato, descaracterizando as zonas históricas”

Esta mensagem tem o benefício de o leitor xenófobo também poder exibir toda a sua dimensão intelectual ao mencionar, sem nunca detalhar, as características das zonas históricas. Se o preocupa ver coisas novas em sítios por onde passa todos os dias, então liberte-se desse sentimento criticando as lojas dedicadas aos turistas.

Se o leitor é um xenófobo daqueles mesmo incontrolável, então o próximo exemplo é para si:

Errado

“As cidades hojes estão cheias de pretos e monhés. Passeia-se pela rua e quase não se vê um branco como antigamente: eles ocupam os autocarros, os parques e os cafés. Já não se pode estar à vontade em lado nenhum. Lisboa aos lisboetas! Porto aos portuenses! Portugal aos portugueses!”

Certo

“As cidades hojes estão cheias de turistas. São alemães, ingleses, espanhóis e chineses por todo o lado. Passeia-se pela rua e quase não se vê um português como antigamente. Eles ocupam os autocarros, os parques e os cafés. Já não se pode estar à vontade em lado nenhum. Lisboa aos lisboetas! Porto aos portuenses! Portugal aos portugueses!”

Repare como com esta frase o leitor pode ir para além de preconceitos em relação ao comportamento de estranhos para demonstrar a sua irritação com a simples presença deles. Mas, como dito antes, tenha muito cuidado com o alvo que escolhe.

Finalmente, se mesmo assim o leitor for confrontado com a sua xenofobia, pode sempre usar o argumento de “que lá fora é igual”. Mas, mais uma vez, tenha cuidado na forma de o utilizar:

Errado

“São inúmeros os casos na Europa de cidades descaracterizadas pela imigração. As populações estão fartas dessa invasão. Muitos movimentos de extrema direita anti-imigração estão a ganhar popularidade por isso.”

Certo

“São inúmeros os casos na Europa de cidades descaracterizadas pelo turismo. As populações estão fartas dessa invasão. Muitos movimentos de extrema esquerda anti-turismo estão a ganhar popularidade por isso.”

Agora sim, os caros leitores xenófobos de armário podem exteriorizar esses sentimentos reprimidos sem que isso afecte o seu futuro na política, jornalismo ou comentário televisivo. Não tem nada que agradecer.

 

20 pensamentos sobre “Como ser xenófobo? Lição número 1.

  1. Pingback: Como ser xenófobo? Lição número 1. — O Insurgente | O LADO ESCURO DA LUA

  2. jcardososite

    Já ontem estava a pensar sobre isto, o que grande parte da esquerda sente pelo turismo é de facto xenofobia (xeno – estranho, fobia – medo), definição: “Aversão aos estrangeiros, ao que vem do estrangeiro ou ao que é estranho ou menos comum”

    Mas já andam aí a inventar “turismofobia” como se xenofobia não descrevesse perfeitamente o sentimento, aconselho o uso expresso de “xenófobos” cada vez que se queixarem do turismo ou algo relacionado.

  3. jcardososite

    Até porque “xenofobia” é uma palavra muito mais pesada e com outras conotações mais graves – “turismofobia” é meh… sem sal.

  4. Pelo que percebi das palestras de psicologia clínica que vi a xenofobia é um traço evolucionário de personalidade. Países com taxas de doenças infecciosas altas são em média mais xenófobos.

  5. A. R

    Excelente. Mas os que perseguem o turismo que traz dinheiro e empregos são os mesmos que querem receber invasores de outras “culturas” e obrigar os contribuintes a pagar-lhe cama, mesa e roupa lavada quando muito português dorme debaixo de cartões.

  6. jcardososite

    mal posso esperar quando alguém do BE começar com a lenga lenga do turismo alguém lhe atirar “temos que acabar com estas atitudes xenófobas no nosso país” hahahahahahaha :^)

  7. jcardososite

    pois mas ninguém leva a sério ser chamado “turismofóbico”, conhecendo as peças ainda são capazes de admitir que sim são “turismofóbicos” tal como “capitalfóbicos” pois é a exploração etc etc etc. Do “xenófobos” não conseguem fugir e encaixa que nem uma luva, é de facto a definição da palavra,.

  8. lucklucky

    O turismo aumenta a independência das pessoas face ao Estado pois é uma maneira distribuída de ter rendimentos.

    Lógico que os Marxistas estão contra pois o turismo cria naturalmente milhares de pequenos empresários na população.

  9. Há tanto para dizer sobre este texto “populista” do Carlos Guimarães Pinto (CGP) que, por pura economia de tempo, limitar-me-ei ao essencial:
    1) Os instintos (i.e. biológicos, inatos, hereditários) não são função da “educação” recebida numa dada sociedade – conforme o CGP quer dar a entender – caso contrário não seriam instintos [e quando se diz que são “instintos básicos” esse seu carácter (“básico”) reflecte a sua utilidade na sobrevivência e em termos evolutivos: uma expressão enfática e algo redundante, portanto].
    2) Aqui, o termo “básico”, que alude a “essencial, vital”, é constante e deliberadamente confundido com “irracional” (dando aso a julgamentos moralistas… e a uma panóplia de rótulos modernos do tipo “X-fóbico”).
    3) “nem só de instintos básicos se faz o ser humano” – uma expressão perfeitamente aceitável, caso não se esconda aqui uma intenção de negar esses mesmos instintos. Uma expressão que, de modo análogo, pode ir de encontro com “nem só de dinheiro se faz o ser humano” – expressão esta que diagnostica mais assertivamente a nossa visão moderna do mundo ocidental (com particular intensidade nos ditos “liberais de direita”).
    4) Endoutrinação: o CGP teve “acesso à educação certa” e “tem a capacidade para domar” instintos – deste modo se inverte a ordem de percepção da realidade, onde o ser humano primeiro sente e depois pensa: aqui, o CGP primeiro pensa e depois sente (como consequência), ou então não sente [instintivamente] e apenas pensa. Ou então estará a esconder, a “controlar” os instintos (será ele um “xenófobo de armário”?).
    5) “xenófobos de armário” – o CGP, aqui, parece um padre que, subindo ao púlpito, exclama para a assembleia “Vós, pecadores!” [excepto eu que sou interlocutor do “deus” liberal].
    6) Não deixa de ser caricata a alusão ao PNR (a.k.a. “bater no ceguinho”), com se eles tivesse qualquer relevância ou fossem um partido xenófobo [se o fosse não encontraríamos membros e associados doutras origens étnicas nas suas fileiras].

    Assim, podemos afirmar com exactidão que:
    7) se tudo é uma questão de educação, isto significa, consequentemente, que as pessoas e as sociedades são substituíveis (engrenagens que mantenham este paradigma liberal)
    8) isto é, recebendo a necessária “educação”, ter um grupo de pessoas procedente do Senegal ou de França é totalmente indiferente (com a excepção do aspecto exterior, o lado “estético”, o fenótipo)
    9) o turismo massificado (o consumismo, no geral) não é algo de mau “em si”, bem pelo contrário é algo desejável, dado que estimula economicamente as localidades (via hostels, hotéis, voos low cost, taxis, restaurantes, esplanadas… e todo um vasto leque de actividades e serviços subjacentes)
    10) tudo é permitido desde que haja benefício (€), germinando assim toda uma rede de prostituição económico-social.

  10. Gabriel Orfao Goncalves

    Já agora, conexo com o tema do turismo, deixo a seguinte reflexão sobre fiscalidade:

    IVA do papel higiénico: 23%
    IVA do gel de duche: 23%
    IVA do champô: 23%
    IVA do detergente para a máquina da roupa: 23%
    IVA de uma lata de grão pré-cozinhado: 23%

    IVA da restauração: 13%
    IVA das dormidas nos hotéis, pensões, pousadas: 6%

    Nem a esquerda nem a direita têm pessoas minimamente inteligentes. De contrário o cenários fiscal nunca mas nunca seria este.

    Já no tempo de Passos Coelho lhe escrevi a perguntar o que achava ele deste manicómio fiscal.

    A António Costa voltei a fazer o mesmo.

    Não se percebe como, estando os hotéis praticamente lotados, não se aproveita esta conjuntura altamente favorável para aumentar o IVA da hotelaria.

    Não, não se trata de “taxar tudo o que está a crescer”. Trata-se de fazer política contra-cíclica para que, quando for preciso, se possa diminuir o IVA e/ou o IRC.

    Diz-se que os turistas vêm para cá fazer turismo barato – para a capacidade económica de quem nos visita. E ninguém se lembra de ganhar alguma coisa com isso? Nem a geringonça se lembra disso? Nem a Sra. deputada Catarina Martins nem a Sra. deputada Mortágua? Não seria bom aumentar o IVA da hotelaria agora para que se possa baixar, por exemplo, o montante de quanto pagamos de juros da dívida pública por ano, e que actualmente se cifra nos 8 mil milhões de euros (8 biliões americanos)? (Igual a 16 submarinos como os que comprámos. Por ano!)

    Ou vamos esperar por que o turismo atravesse uma fase difícil, que a bolha imobiliária chinesa rebente, que haja mais um “ataque à dívida portuguesa por parte dos especuladores neo-liberais” para que, uma vez mais, venha um Primeiro-Ministro anunciar um apertar do cinto… na pior altura possível? Como aqui:

    O que se vê a partir dos 08:54, sensivelmente, pode ser visto também aqui:

    , continuando aqui:

    até ao fim.

    (Tanto quanto sei, estes são os únicos 3 vídeos na net que documentam a conferência de imprensa em causa, havendo uma sobreposição entre o final do 1º vídeo e o início do 2º. Se alguém souber de um vídeo único, do princípio ao fim, com mais qualidade, agradecia que me indicasse para gabriel.orfao.goncalves@gmail.com)

    Quanto mais tempo se levar a manter o IVA da hotelaria nos actuais 6% mais violenta terá de ser a reacção de correcção a este erro fiscal.
    É em tempo de vacas gordas que se aperta ligeiramente o cinto, para não se ter de apertar o cinto com mais força em tempo de vacas magras. E fazer política contra-cíclica também se faz SECTORIALMENTE.

    Sei que muitos liberais e libertários não querem ouvir falar de aumento de impostos. Mas se é assim, por igualdade, pelo menos, de razão, não podem deixar de criticar o facto de produtos de primeira necessidade pagarem actualmente uns escandalosos 23% de IVA.

  11. André Miguel

    Turismofobia é só reflexo do nosso provincianismo, o célebre orgulhosamente sós, temperado com a inveja pelo sucesso alheio. Inveja de quem pode fazer turismo e inveja dos que ganham com isso. Marxismo e nada mais, ou seja: merda.

  12. A. R

    “O turismo aumenta a independência das pessoas face ao Estado pois é uma maneira distribuída de ter rendimentos.” É isso mesmo …bem vindo Lucklucky.
    Por isso um gangue chamado CUP em Espanha quer expropriar os negócios turísticos.

  13. Carlos. Muito bem escrito.
    Eu gosto de responder a quem diz que só vemos turistas, o seguinte:

    Não vês portugueses porque estes estão a trabalhar, nos cafés nos restaurantes, nos hotéis… a servir os turistas e a ganhar dinheiro.

    O fator moral tem que estar sempre presente.

    Achas que os portugueses não deviam ganhar dinheiro?

    Como o energúmeno comuna Pedro Duarte, acha que trabalhar é prostituir-se.

    Não podem as esquerdas estar mais erradas:

    Eu tenho um patrão mas trabalho para mim.

    Há uns meses uma fisioterapeuta questionar-me porque eu trabalhava horas extra Para o meu patrão: Ao que áspera mas instintivamente lhe respondi “Eu trabalho para mim, não para o meu patrão”

    Depois percebi de onde esta fisioterapeuta vinha… vinha da esquerda.

    Nunca mais quis falar sobre as injustiças de ganhar dinheiro. Pois podia ficar moralmente esclarecida e injuriada.

    Pois a inveja ainda é moralmente reprovável e como a inveja é o cerne da esquerda, é muito fácil ganhar a esta moralmente,…. facílimo até.

  14. Mais uma forma de ser xenófobo, a minha, malthusiana.
    Sou contra a imigração porque acho que há gente a mais no mundo. E a população ou é controlada localmente (pela mão invisível), ou nunca o será.
    Já o turismo, neste aspecto, que não o do consumismo, não levanta problemas.

  15. Este “VASCOJAFOSTE” deve ter umas grandes palas nos olhos para rotular de “comuna” todos aqueles que não batem palmas à turistificação de Portugal e da Europa (i.e. massificação, consumismo). São estas pequenas mentalidades e a visão de curto alcance (das nossas elites políticas, primeiramente) que dominam, que não permitem à sociedade ver para além do seu próprio “negócio”, do seu lucro (€) pessoal. Portugal parece uma prostituta, na berma da estrada, a salivar pelo dinheiro. É o fruto da mentalidade pequenina, da mentalidade de servilismo de bandeja, bajuladora e meramente utilitarista (€). “Felizmente”, há mais vida para além do dinheiro. Ou não? Se calhar não, para estas mentalidades de escravo que se topam como servos deste modelo (liberal) económico. “Eu trabalho para mim” [€€€] mesmo que seja algo repugnante aquilo que eu faça] isto é, trabalho para poder sobreviver neste lamaçal, “anda tudo ao mesmo” – como se costuma dizer – a prostituição “é uma profissão digna como qualquer outra”.

  16. O que é pior?

    – Grafitar paredes, urinar em monumentos, tomar banho (despido) nas fontes, pôr cadeados nas vedações das pontes?
    ou
    – Passar à frente na filas, usar serviços sem pagar, estar imune a multas e a sanções sociais por mais abusos que se façam?

    Ou são igualmente graves ambas as situações?

    O problema não está nos turistas nem nos ciganos, nem em quem defende uns em detrimento dos outros, o problema está numa demissão colectiva do dever de imposição de regras básicas de convivência social – por outras palavras, estão aqui a faltar muitos pares de estalos em gente imbecil, abusadora e mal comportada!

    Mas isso é algo que as modernas democracias ocidentais já provaram não saber alcançar, pelo que a aurora das novas ditaduras não deverá estar longe, para o bem e para o mal.

  17. Pingback: Como ser xenófobo?!? – Um canceriano sem lar.

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.