À espera da direita

O meu artigo de hoje no Diário Económico.

À espera da direita

Os partidos do Governo estão num dilema: como ganhar as eleições prometendo maior carga fiscal e cortes nos salários e nas pensões? É que se pensarmos bem, o ano político será marcado pelo confronto entre os partidos mais à direita, que defenderão as políticas seguidas desta legislatura, e os partidos da oposição, a quem bastará discordar deste rumo.

Assim, a não ser que a maioria do eleitorado se mostre altruísta, o mais provável é que os socialistas possam vir a vencer as legislativas deste ano.
É de crer que o PS quebre as promessas eleitorais e siga o rumo de Bruxelas, mesmo que este seja corrigido com uma eventual cedência à Grécia. O possível constrangimento que António Costa possa sentir não compensará o incómodo dos partidos do actual Governo, pois perder por uma causa sem futuro não agrada a ninguém. É que o beco sem saída em que PSD e CDS se meteram deve-se à falta de visão governativa da direita.

Contar-se-ão pelos dedos de uma mão os militantes destes dois partidos que questionem o papel do Estado como essencial para o crescimento económico. A grande maioria crê que ao Estado e, naturalmente, aos seus governantes, ou seja, a eles próprios, cabe a implementação de políticas sem as quais não há crescimento económico, baixa do desemprego, e menos ainda bem-estar social. Prisioneiros desta convicção ideológica chamada socialismo, a direita nacional não só não tem sido verdadeira alternativa no governo, como pagará caro por tentar equilibrar as contas públicas dum Estado nada habituado a ser devidamente fiscalizado.

Talvez por isso mesmo, desde Sá Carneiro que nenhum político da direita venceu um acto eleitoral, mas beneficiou da derrota do adversário. Foi assim com Cavaco, em 1985 contra o Bloco Central, nas suas reeleições quando havia dinheiro para distribuir e com Durão e Passos Coelho. Sem programa alternativo, a direita não vence, nem governa. Espera. Umas vezes no governo, outras na oposição.

A verdade é que a saída deste dilema não é fácil. Pressupõe uma mudança de mentalidades que se espera morosa. Se o PS se prepara para defender o conceito de Estado empreendedor, uma alteração de nomenclatura para empresas públicas, e a desvalorização da ideia de poupança, caberá à direita percorrer o caminho inverso: a defesa das liberdades individuais, da propriedade privada, da poupança como garante último da liberdade de cada um; a confiança na solidariedade espontânea que existe entre os portugueses, enquanto pessoas que são. Uma direita que limite o poder, entre eles o estatal, escrutinando-o através da descentralização fiscal e da introdução dos círculos uninominais. Acima de tudo, precisamos de uma direita que acredite nos cidadãos, que os leve a acreditar neles, na sua capacidade de gerar riqueza, e não se reduza à contabilidade do estado.

11 pensamentos sobre “À espera da direita

  1. Bruno Carrilho

    É preciso um rearranjo das força “à direita” (cuja utilização só faz sentido como oposição à esquerda, pois é demasiado heterogênea) de forma a que surja um partido realmente liberal e um verdadeiro conservador, em vez desta confusão actual em que estás duas correntes se misturam entre si e com os “sociais democratas” (que não são muito diferentes dos socialistas e deviam juntar-se a eles – a grande diferença hoje em dia, para além da perspectiva meramente “clubista”, é serem um pouco mais sinceros e fiscalmente responsáveis) em doses um pouco diferentes em torno do psd e CDs.

  2. “….a confiança na solidariedade espontânea que existe entre os portugueses,”

    O é a “solidariedade espontânea”?

    Escolha múltipla:

    A- levar comida aos sem abrigo;

    B- dar esmola aos pobres;

    C- colocar roupas nos contentores para os descamisados;

    D- contratar, pontualmente, um desempregado jovem ou de longa duração para tratar do jardim e da piscina?

  3. jo

    “Assim, a não ser que a maioria do eleitorado se mostre altruísta, o mais provável é que os socialistas possam vir a vencer as legislativas deste ano.”
    Altruísmo é fazer sacrifícios em prol dos outros. Se todo o eleitorado tem de fazer sacrifícios, quem beneficia deles? Quem são os outros?
    Temos o empobrecimento como objetivo.
    A seguir vão pedir autoflagelação.

  4. hustler

    “Altruísmo é fazer sacrifícios em prol dos outros. Se todo o eleitorado tem de fazer sacrifícios, quem beneficia deles? Quem são os outros?”, são, entre outros, os funcionários públicos, que, blindados por uma lei que os protege, não podem ser despedidos ; são também os pensionistas, que recebem muito mais do que o que descontaram! É difícil lembrar isto, ou tem uma memória selectiva?

  5. Fernão Magalhães

    A mensagem é simples: “Man is not free unless government is limited”
    Mas os cronies de todos os lados não deixa esta mensagem passar, são uma elite que adora tanto os pobres que faz tudo para os multiplicar… que sem alternativas acabam por se entregar e desistem de lutar pela sua própria felicidade…
    Em Portugal, vai ser díficil deixarem passar alguém com esta clareza:

  6. F,

    A Isabel Jonet faz mais pelos descamisados do que a Segurança Social. Não se esqueça que direitos positivos pagam-se com uma miséria constante; e que ajudas pontuais podem reencarreirar uma pessoa.

    Eu prefiro pessoas encarreiradas que miserrimamente dependentes.

  7. Os Pobrezinhos

    “Na minha família os animais domésticos não eram cães nem gatos nem pássaros; na minha família os animais domésticos eram pobres. Cada uma das minhas tias tinha o seu pobre, pessoal e intransmissível, que vinha a casa dos meus avós uma vez por semana buscar, com um sorriso agradecido, a ração de roupa e comida.

    Os pobres, para além de serem obviamente pobres (de preferência descalços, para poderem ser calçados pelos donos; de preferência rotos, para poderem vestir camisas velhas que se salvavam, desse modo, de um destino natural de esfregões; de preferência doentes a fim de receberem uma embalagem de aspirina), deviam possuir outras características imprescindíveis: irem à missa, baptizarem os filhos, não andarem bêbedos, e sobretudo, manterem-se orgulhosamente fiéis a quem pertenciam. Parece que ainda estou a ver um homem de sumptuosos farrapos, parecido com o Tolstoi até na barba, responder, ofendido e soberbo, a uma prima distraída que insistia em oferecer-lhe uma camisola que nenhum de nós queria:

    – Eu não sou o seu pobre; eu sou o pobre da minha Teresinha.

    http://www.citi.pt/cultura/literatura/romance/lobo_antunes/ala92.html

Deixe uma Resposta

Preencha os seus detalhes abaixo ou clique num ícone para iniciar sessão:

Logótipo da WordPress.com

Está a comentar usando a sua conta WordPress.com Terminar Sessão /  Alterar )

Imagem do Twitter

Está a comentar usando a sua conta Twitter Terminar Sessão /  Alterar )

Facebook photo

Está a comentar usando a sua conta Facebook Terminar Sessão /  Alterar )

Connecting to %s

This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.