Uma execução orçamental sólida

Afinal havia mesmo outro caminho. Infelizmente para todos nós, é bem pior.

João Vieira Pereira: “O PS estimava que o investimento público crescesse 14,6% este ano. Está a cair 19,4%. O maior baluarte da política de esquerda está, afinal, a ser sacrificado para que seja possível repor rendimento. Porém, as piores notícias estão no quadro 14 da execução orçamental de Julho. Estava prevista a injecção de €2,2 mil milhões de capital em empresas públicas. No primeiro semestre apenas foram gastos €600 milhões. Se olharmos para os empréstimos a estas mesmas empresas, dos €2,5 mil milhões necessários, só €84 milhões foram disponibilizados.


Mesmo que estas despesas não tenham um perfil de execução constante, estamos a meio do ano e as empresas públicas não têm o dinheiro que precisam. Ou seja, estão paradas e não há investimentos.


E é deste modo que o Governo controla os gastos. Cortando na injecção de dinheiro na economia produtiva, privilegiando mais rendimento para funcionários públicos e pensionistas” (Expresso/Economia).

via Facebook do Paulo Gorjão.

Está na hora de rever (uma vez mais) o OE2016

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O Orçamento do Estado 2016 ainda não foi submetido a votação final, mas já precisa de uma nova errata que corrija a errata, que por sua vez corrigiu uma errata da versão original, que já de si é um erro.

O BCE reviu em baixa, de uma forma muito expressiva, as previsões de inflação para a Zona Euro. Ora, um dos artifícios do OE2016 é precisamente depender de uma variação significativa dos preços para empolar a receita fiscal. Em sentido positivo, claro está. Sucede que a revisão é em baixa, e prevê uma inflação de 0.1% para 2016, quando em Dezembro previa 1%. Esta diferença de 0.9 p.p. tem um enorme impacto nas contas do OE2016, pois reduz consideravelmente a receita fiscal. Segundo as contas do OE2016, a receita fiscal total é cerca de 44.1% do PIB nominal. Se o PIB nominal cair 0.5 p.p. face ao estimado (admitamos que internamente os preços sobem mais do que na Zona Euro), então esta variação terá um impacto de aproximadamente -400M€ na receita fiscal.

Actualmente, o OE2016 prevê um deflator do PIB de 1.8%, que combina o efeito da variação interna dos preços, medida através do Índice Harmonizado de Preços ao Consumidor (IHPC), estimado em 1.4%, com o efeito do aumento dos preços externos, o que inclui a Zona Euro. Esta revisão em baixa torna completamente inverosímeis as estimativas do Orçamento do Estado 2016, reforçando ainda mais a necessidade de adoptar o plano B, que, em boa verdade, sempre foi o plano A. Idealmente ainda antes do próximo resgate.

A magia do OE2016

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O crescimento do produto apresentado no Orçamento do Estado de 2016 e o cumprimento da meta orçamental (défice de 2.6%) partem do seguinte pressuposto: o aumento de rendimentos irá gerar mais consumo privado. Esse consumo privado gera um aumento da procura, o que por sua vez leva a um aumento dos preços (IPC de 1.4%) bastante superior ao registado em 2015 (0.6%), o que ajuda na receita fiscal. Numa economia fechada é isto que acontece. Numa economia aberta o aumento da procura gera também um aumento das importações. No entanto, quando olhamos para o OE2016 reparamos que, lo and behold, a taxa de variação das importações cai de 7.6% para 5.9%. Como é isto possível?

Segundo os redactores do OE2016, para que isto seja possível ocorrerá um efeito de substituição de importação de bens duráveis por não-duráveis porque o aumento dos rendimentos está focado nas classes sociais mais desfavorecidas, que tipicamente consomem todo o seu rendimento (grande propensão marginal para o consumo), e consomem-no em produtos nacionais. Ou julgam eles.

Largando o jargão técnico, isto significa que o Zé, agora que viu o seu rendimento aumentado, vai ao supermercado fazer compras. Comprar cereais. Cereais talvez não. Não somos autosuficientes, pelo que temos de os importar. Uma mini bem gelada? Também não convém. Requer cereais para o processo de fermentação, que também são importados. Um bife com ovo a cavalo acompanhado de batata frita? Não convém. Também não somos autosuficientes. Nem na carne, nem na batata, nem nos ovos e muito menos nas oleaginosas. Isto é, no óleo para as fritar. Para não aumentar as importações terá mesmo de ser apenas vinho.

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Claro que no nosso exemplo admitimos que o Zé não vai comprar um computador, um carro, um iPhone ou uma peça de roupa de uma marca estrangeira. Uma casa sabemos que não vai, pois o Zé não tem rendimentos para isso. Sobra-lhe ir ao café tomar uma bica. Infelizmente, todo o nosso café também é importado.

Não quero desanimar a malta do Ministério das Finanças, mas fazer um OE assumindo que Portugal é uma economia fechada, que consegue substituir as importações por produção interna e que isso se reflectirá nos preços (o que pressupõe que não existem existências acumuladas em stock para serem vendidas, o que também não é verdade) é a receita para o rotundo falhanço. Teremos um aumento dos preços (salários) acima da produtividade, o que diminuirá a nossa competitividade externa. A receita fiscal será menor do o que esperado e a taxa de crescimento do PIB, por efeito de um aumento das importações será menor. A sorte deles é que provavelmente não estarão cá para assistir ao resultado.