Diz Que É Uma Espécie De Governo Neoliberal

Diploma sobre cópia privada reconfirmado no parlamento.

O decreto-lei sobre a cópia privada, que tinha sido vetado pelo Presidente da República para reapreciação, foi aprovado hoje pela maioria parlamentar em nova votação na Assembleia da República.

Muito lamentável e incompreensível a actuação do governo nesta matéria que nem sequer aproveitou o veto do Presidente da República para rever e repensar o diploma.

Leitura complementar: A nova Lei da Cópia Privada: uma mancha notável; A abominável Lei da Cópia Privada ataca de novo; Uma vitória para a AGECOP, uma derrota para o paísA nova lei da cópia privada: uma vitória do rentismo

Taxas e Taxinhas

O governo mais liberal de sempre vai avançar com a nova lei da cópia privada que inclui a introdução das taxas sobre dispositivos com armazenamento de dados como discos rígidos internos e externos, boxes de televisão, memory stickstablets e telemóveis.

A lista completa pode ser encontrada aqui, mas neste post ficam alguns excertos:.

  • Memórias USB e Cartões de Memória – 0,016€ por cada GB de capacidade de armazenamento ou fração, com o limite de 7,5€
  • Memórias e discos rígidos integrados em aparelhos com função de televisor e em aparelhos que assegurem o interface entre o sinal de televisão e o televisor –  0,016€ por cada GB de capacidade ou fração, com o limite de 15€
  • Memórias ou discos rígidos integrados em computadores que não se incluam na alínea anterior – 0,004€ por cada GB de capacidade ou fração, com o limite de 7,5€
  • Discos rígidos internos ou externos que dependam de um computador ou de outros equipamentos ou aparelhos para desempenhar a função de reprodução e que permitam o armazenamento de imagens animadas e sons – 0,004€ por cada GB de capacidade ou fração, com o limite de 7,5€
  • Memórias e discos rígidos integrados em aparelhos dedicados à reprodução, leitura e armazenamento de fonogramas, quaisquer obras musicais e outros conteúdos sonoros em formato comprimido – 0,20€ por cada GB de capacidade de armazenamento ou fração, com o limite de 15€
  • Memórias e discos rígidos integrados em telefones móveis que permitam armazenar, ouvir obras musicais e ver obras audiovisuais –  0,12€ por cada GB de capacidade de armazenamento ou fração, com o limite de 15€
  • Memórias ou discos rígidos integrados em aparelhos tablets multimédia que disponham de ecrãs tácteis e permitam armazenar obras musicais e audiovisuais – 0,12€ por cada GB de capacidade de armazenamento ou fração, com o limite de 15€

Boas compras no estrangeiro, pessoal.

…e a proposta ainda nem foi aprovada

SD-512

Este cartão SD, recentemente lançado no mercado, tem uns espantosos 512 Gb de memória (algo de daqui a alguns anos nos parecerá ridiculamente pouco). Segundo a proposta de lei da cópia privada (alinea 2.3-l do Anexo) a taxa aplicável seriam a 0.016 €/Gb o que daria cerca de 8.19 € sendo pois aplicável a taxa máxima de 7.5 €.

Como explicava alguém nos P&C a evolução tecnológica fará com que os limites agora previstos na lei sejam atingidos daqui a poucos anos o que fará aumentar a pressão para a revisão em altas dos limites aplicáveis em nome de supostas perdas em direitos de autor.

Lei da cópia privada: prejuízos vs receitas

O Pedro Pita Barros indica um artigo onde se tenta estimar os prejuízos da “cópia privada” para os autores. Os resultados ficam bastante aqum da receita esperada do imposto. No cenário mais favorável 1.5 milhões de euros vs 15 milhões.

Seria extramente útil que fosse divulgada os estudos que permitem ao governo e à SPA chegar aos valores acordados para (mais) este saque fiscal.

Leitura complementar: A abominável Lei da Cópia Privada ataca de novo; A lei da cópia privada e a gestão das receitas do imposto.

Lei da cópia privada – O que fazer?

Um apelo à acção da Maria João Nogueira a propósito da Lei da Cópia Privada

Assim, sugiro que EDUCADAMENTE, se contacte a presidente da Assembleia da República, manifestando o interesse em que esta petição seja debatida em plenário, de acordo com o que manda a lei, antes de ocorrer a votação.

Qualquer coisa como:

“Exma. Senhora Presidente da Assembleia da República,

Face aos mais de 6000 subscritores validados da petição contra o pl-246, entregue ontem na Assembleia da República, gostaria de solicitar à Presidente da Assembleia da República uma revisão da agenda, de forma a que a petição seja debatida em plenário, antes do projecto de lei ser votado.”

Este, ou qualquer outro texto, claro, pode ser enviado usando o formulário disponível no site da Assembleia da República. (Update – no “assunto” optei por “sugestões”).

A justificação da “lei da cópia privada” em poucas palavras

Vítor Cunha (Blasfémias)

O disco português mais vendido de sempre é a compilação “O caminho da Felicidade” dos Delfins (1995), com 240.000 cópias vendidas. A Samsung vendeu, no ano passado, 706.000 smartphones em Portugal. A Apple vendeu 253.000. É perfeitamente compreensível que os Delfins tenham percebido que o iPhone 6 pode ser o definitivo best of da banda de Cascais

LEITURA COMPLEMENTAR: “A cópia privada e a Lei de Moore” de J.Manuel Cordeiro (Aventar)

Lei do Barrete

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Faltará por ventura muito. Faltará o dinheiro, faltará a vontade e faltará a ambição. Faltará a humildade, a hombridade, a força e o esforço. Faltará, como sempre faltou e faltará, competências vastas a políticos cujas intenções, nunca parcas em boa vontade, redundam no mesmo altruísmo auto-destrutivo de dedicar as suas vidas em prol das nossas, com isso destruindo as nossas mas construindo as deles. Já o que não falta, que de tanto abunda até fede, é a criatividade no exercício amplo do disparate.

A Lei da Cópia Privada é o sumo pontífice da criatividade posta ao serviço do bem comum e de um bem maior, tão grande que atola e que enfia num mesmo Barrete o justo e o pecador. Pérfido gang bang que junta o miúdo que saca uma música e a velhota reformada que tira fotos aos netos. Mais grave que assumir que justo e pecador partilham a mesma cama, é alvitrar de gargantão que o pecador pecou. Na verdade, não existe roubo de propriedade privada. A propriedade privada é duplicada, não ficando o autor original pior do que está. Assume-se, portanto, que se trata de um reembolso pelo custo de oportunidade de dinheiro que eventualmente viria caso o pecador em exercício de contrição adquirisse a obra. Caso adquirisse. E caso pirateasse. Mas esta lei não é sobre pirataria: é sobre a cópia de uma obra devidamente adquirida, direito já contemplado na lei. Uma sequência demasiado grande de ses e de premissas para consubstanciar uma lei, mas o pleno exercício do Direito nunca foi exercício rigoroso.

Cabe-me a mim somente declarar, actividade que não exige grandes competências, que a lei peca apenas por defeito. Nesta arte de positivar em livre arbítrio, manter a parcimónia é injustificável. Como tal, proponho, a bem do bem comum, que não excluamos as seguintes condições potencialmente conducentes a uma conduta pouco idónea de violador da cópia privada:

– não esqueçamos as resmas de folhas em branco, guardanapos e papel higiénico que podem ser usadas para tirar fotocópias ou anotações de livros; celulose, sob a forma de árvores, que posteriormente poderá ser usada para produzir papel que eventualmente será usado para fotocopiar os tais livros protegidos por direitos de autor; na pior das hipóteses, o papel higiénico ajudará a ter uma vida saudável para que o exercício da infracção seja possível;

– óculos, lentes de contacto e binóculos, que podem ajudar um transeunte a mirar a capa de um jornal ou a contracapa de um livro; ecrãs de computador, de tablets e de telemóveis, dispositivos usados para poder ler obras eventualmente duplicadas;

– aparelhagens, amplificadores, colunas, cabos RCA, HDMI ou 3.5mm, rádios FM e AM, ferrinhos, gaitas e harmónicas, e tudo o mais que possa ser usado para difundir obras eventualmente protegidas por direitos de autor. Uma palma sincopada com o último êxito da Bernardina e do Canuco? Agarra que é ladrão;

– carros, trotinetes, bicicletas, autocarros, aviões. Sapatilhas e sapatos que permitam ir a locais onde emitem, vendem, passam ou repassam obras protegidas por direitos de autor, que aliás já pagam direitos. As calças, as camisas, as cuecas. Enfim, a roupa também, por acréscimo, dado que circular nú na via pública é crime, e poderia impedir um qualquer cidadão de infringir duplamente a lei. Melhor ainda, taxar o auto de crime público por andar nú na rua pois evitaria que essa mesma pessoa se dirigisse a um centro comercial para comprar uma obra devidamente legal;

– por fim, o ar. O ar que respiramos e que nos mantém vivos para podermos infringir a lei e ouvir ou ler obras protegidas pelos direitos de autor, com a devida rectificação e emenda para incluir também a água e todo e qualquer alimento que preste o mesmo serviço de manter o justo vivo, não vá ele pecar e o Estado deixar escapar a ignomínia.

Nesta miríade de potenciais alvos de taxação, só há uma coisa que não pode ser taxada: o bom senso. Tal como tudo o resto, sempre esteve em falta. E não é duplicável ou reprodutível. Mas caso apareça, Lei do Barrete nela, que o país quer-se tanso.

Leitura recomendada: A cópia privada volta a atacar, do João Caetano Dias; FAQ Lei da cópia privada, da Maria João Nogueira; Qual é a estupidez do novo imposto sobre a “cópia privada”, do Ricardo Campelo.