Sobre a descida do IVA

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Assistir-me-á, por consagração nessa lista de extensos direitos e parcimoniosos deveres a que chamamos Constituição, um qualquer direito a imiscuir-me na interessante discussão que se trava entre o Vítor Cunha, o Carlos Guimarães Pinto, o André Azevedo Alves et al. no que ao aumento (ou redução) do IVA no sector na restauração diz respeito.

Faço-o displicentemente, mas não sem antes elogiar este tipo de debates que, raro na imprensa convencional, deve e deverá ser incentivado. Estou certo que mais leitores partilharão comigo o interesse numa troca racional e ponderada de argumentos, do qual certamente emergirão posições mais esclarecidas.

Posto isto, a contenda surge com a proposta do PS de baixar o IVA da restauração para a taxa intermédia de 13%, invertendo a subida que foi efetuada no ano passado. O Vítor escreveu sobre isso, ironizando aquela que é uma distorção causada por diferentes taxas aplicada a sectores semelhantes da restauração e do turismo. O André intervém, corrigindo alguns dos dados apresentados e o Carlos afirma que uma oportunidade de redução de impostos é sempre boa.

O que o Carlos diz faz sentido. Num país profundamente estatizado como é Portugal, reduções de impostos são um oásis no deserto que só surgem em anos bissextos. Isso é um facto indesmentível. É uma posição liberal e justificada que se defenda a baixa de impostos e aí não existirá nenhum ponto de discórdia.

A questão torna-se mais complexa quando se acrescentam outras variáveis ao problema. Não é realista assumir que um pouco é melhor do que nada, seja qual for o resultado desse pouco. A redução de um determinado imposto não pode ser isolado da restante economia. Os impostos servem a prosseguição de uma determinada política fiscal que sustenta um determinado nível de despesa. A redução desse nível de despesa é fulcral, mas deve ser corretamente suportada por um tax mix que privilegie a produção em detrimento do consumo.

O IVA é o menos mau dos impostos

E vários estudos são contundentes a demonstrar que os impostos sobre o rendimento e sobre o capital têm um efeito mais nefasto na taxa de crescimento do produto do que o imposto sobre o consumo, pois desincentivam a acumulação de capital e, como tal, o investimento. Com efeito, em modelos de crescimento económico o imposto sobre o capital converge para zero no longo prazo (cf. Chamley (1986), Judd (1985) e Roubini and Milesi-Ferretti (2002, FMI)).

Mercantalismo no IVA

Qualquer liberal deverá defender a prossecução do livre mercado, e o livre mercado jamais existirá se um determinado sector for privilegiado em detrimento de outro. Uma taxa reduzida do IVA no sector da restauração é, mais do que uma distorção, um subsídio dos restantes sectores. Se, por princípio, tal subsídio é questionável, ainda mais o é quando a restauração é um sector de bens não-transacionáveis e um jogo de soma zero, em que abrir um restaurante implica o encerramento de outro.

IRC, IRS vs IVA

Não apenas é injusto manter uma taxa reduzida para a restauração como é economicamente ineficiente reduzir o IVA quando os restantes impostos se mantêm inalterados. O argumento do ovo e da galinha dado pelo Carlos aplica-se bem aqui. Nada implica que uma redução do IVA conduza a uma redução efetiva da despesa. A história político-económica portuguesa leva a crer que conduzirá a um maior défice orçamental, acabando por não resolver mas agravar o problema e dificultar a atual consolidação fiscal.

Em suma

O princípio da redução de impostos é e deverá ser uma justificada causa liberal. Mas deverá sempre atender a outros princípios liberais, como são o da equidade e do livre mercado, em que nenhum agente ou sector deverá ser beneficiado pelo Estado em detrimento dos demais. Mais ainda, numa fase de profunda convulsão económica, convém aproveitar a oportunidade para orientar a política fiscal no sentido de incentivar a produção. E tal não poderá ser feito enviando sinais contraditórios. É necessário ancorar as expectativas por forma a incentivar o investimento e a produção. E tal não se faz baixando o IVA na restauração um ano depois de o ter aumentado.

P.S. – Mais interessante seria uma proposta que acabasse com a taxa intermédia, alargando o leque de bens e serviços essenciais na taxa reduzida e colocando tudo o resto na taxa normal.

Carta Aberta sobre o IVA na Educação

IVA na Educação
CARTA ABERTA AO SR. MINISTRO DAS FINANÇASExmº Senhor Prof. Doutor Vítor Gaspar,

sendo eu professor, e actualmente director de um Centro de Estudos, após ter tomado conhecimento pela comunicação social que os clientes de um Salão Erótico pagam de IVA apenas 6%, venho por este meio solicitar a V. Exª. igual tratamento fiscal para todos os nossos alunos.

O Senhor Ministro certamente dirá que não são actividades económicas comparáveis e, desta vez, concordarei com V. Exª., mas o que também não é comparável é o esforço que as famílias dos nossos alunos fazem mensalmente para melhorar a educação dos seus filhos, colmatando as lacunas de um ensino público asfixiado por políticas economicistas, para depois serem obrigadas a pagar a taxa máxima de IVA, ou seja, 23%!
Se a Educação fosse efectivamente uma prioridade nacional os alunos teriam todo o apoio de que necessitam nas escolas. Mas a realidade é bem diferente e o Apoio Extra-Escolar é, para muitos alunos, uma inevitabilidade. Será então justo ser taxado como se de um luxo se tratasse?… Ou deverão os professores, no dia em que o FMI recomendou a dispensa de 50 mil, “adaptar” o seu vestuário de modo a que as Explicações possam ser “taxadas como Arte”?…

Com os melhores cumprimentos,

Mário Costa

Fonte: Facebook da CEPÓVOA.

Contas de merceeiro

Sempre à procura de combater a evasão fiscal, o governo acaba de anunciar a possibilidade de deduzir em sede de IRS 5% do IVA pago em determinadas serviços. Contas feitas, são necessários 26 637 euros por ano em facturas para atingir o limite de 250 euros de dedução no IRS(*). Isto é, na prática só recuperamos 1% do valor facturado. Já por aqui se pode ver o enorme alcance que irá ter esta medida.

A isto, acresce que com as elevadissimas taxas de IVA fixadas pelo governo há enormes incentivos para o ciiente e o prestador se esquivarem ao incómodo da factura. Havendo a possibilidade de beneficiar de um desconto imediato até 23% no valor pago é duvidoso que alguém prefira esperar 12 meses para recuperar 1% do valor numa factura acrescida de IVA.

Em suma, mais valia terem dispendido o tempo a estudar cortes na despesa pública.

(*) As contas estão feitas para produtos com IVA a 23% que serão as que permitiriam atingir mais rapidamente o benefício máximo.