
Estamos perante uma incontornável vitória do partido da esquerda-radical grego, Syriza. O seu líder, Alex Tsipras — conta-se que terá dado o nome de Ernesto a seu filho em homenagem a esse pacifista sul-americano, Che Guevara — venceu no país onde os resultados eleitorais, incluindo o 3º lugar alcançado pelo partido neonazi Aurora Dourada, fazem tanto sentido como a forma como se governa. Ou seja, nenhum. No país onde ser cabeleireiro é profissão de desgaste e permite reforma aos 53, agradeça-se aos alemães, ganharam aqueles cujo corte de cabelo um dia terá sido semelhante ao de Che Guevara.
Seja como for, e estragando a festa a Rui Tavares, a João Galamba e a todos hábeis capitalizadores do ímpeto eleitoral do discurso anti-austeridade, esta foi, sem dúvida, uma enorme vitória, mas não vossa. Analisemos todos os cenários possíveis:
1. Tsipras modera o discurso, cumpre tratados e obrigações. Neste caso, Tsipras não faz mais do que os seus congéneres franceses e italianos, Hollande e Renzi, que de garanhões anti-austeridade passaram a tíbias libelinhas patrocinadas pela Pfizer. À terceira é de vez, e torna-se ainda mais óbvio que, face à realidade, não resta muito a fazer. Seria mais uma derrota da esquerda e da extrema-esquerda europeia, acantonadas pelo seu discurso idílico do fim da austeridade — vulgo, cumprir regras orçamentais — e da caça ao unicórnio.
2. Tsipras radicaliza o discurso, Grécia sai do Euro. Acontecendo a famigerada Grexit, a Grécia seria atirada para a mais abjecta pobreza. Desvalorização do dracma, default da dívida, saída dos mercados de capitais, intervenção de emergência do FMI, tudo isto faria a austeridade parecer uma história de embalar. E não podem culpar a Merkel: a Grécia, bem ou mal, tem-se mantido no Euro. Olímpia a arder enviaria uma clara mensagem para o eleitorado europeu com propensão para sonhar: os unicórnios não existem.
3. Tsipras não consegue governar, voltando a convocar eleições daqui a uns meses. Neste cenário, confirma-se a inaptidão da extrema-esquerda para tudo o que não sejam marchas LGBT ou propostas de criminalizar o piropo. Desfeita a magia por demérito do próprio, a Grécia perde entretanto preciosos meses no seu ajustamento, agudizando ainda mais o ajustamento necessário.
Destes 3 cenários que decorrem de uma vitória do Syriza, nenhum é positivo para a esquerda ou para os proponentes da posição anti-austeridade, isto é, para aqueles que vêm nas regras orçamentais uma opção ideológica. É uma enorme derrota que cheira a vitória, sabe a vitória, mas não o é.