Pato Donald Costa

http://www.nytimes.com/politics/first-draft/2016/02/03/donald-trump-tells-crowd-in-arkansas-i-think-i-came-in-first-in-iowa/

Usando uma tradição muito querida entre alguns políticos portugueses e descoberta nas eleições de 2015, o candidato Republicano à nomeação para as eleições presidenciais nos EUA, decidiu declarar que era vencedor de umas eleições primárias no Iowa em que tinha ficado em segundo e atrás do candidato Ted Cruz por mais de 3 p.p.

Tenho dúvidas que Donald Trump se alie com alguém para conquistar a Presidência, para além da sua própria imagem no espelho, seja ou não engraçadinho. Por outro lado as semelhanças com o tom de pele e de cabelo do actual PM português são escassas. No entanto a capacidade de re-interpretar os resultados de um dia eleitoral a seu favor permitem acalentar que um dia os EUA terão um Presidente a mandar embora todos os mexicanos e muçulmanos para os seus países de origem.

Já o nosso PM terá que esperar que não haja mexicanos, nem muçulmanos a querer vir para Portugal para evitar a aritmética e a contabilidade difícil dos seus aliados com as integrações e os direitos sociais das minorias.

Mas ainda que sem mexicanos o nosso Costa não se vai livrar de uma segunda vaga de brasileiros empurrados pelos êxitos económicos da petista Dilma, em especial se eles tiverem conversado antes com os amigos que por cá andaram numa primeira vaga e saibam quão magnânimo é o contribuinte português .

Há patos para todos os gostos , seja entre o eleitorado brasileiro, português ou americano. No final exclamarão todos eles “quack, quack” tal como o Pato Donald, o que traduzido quer dizer : fui depenado !!!

Que um erro não se transforme em três

Costa-Cavaco-Passos Na noite eleitoral, quando se tornou notório que a coligação PSD/CDS tinha conquistado mais votos que qualquer um dos outros partidos, e até antes, quando as sondagens começaram a apontar para esse resultado, muita gente argumentou que ele se devia ao facto de muitos portugueses, por muito descontentes que estivessem com os sacrifícios dos anos da governação Passos/Portas, encaravam a coligação como a escolha mais segura: por muito que discordassem de algumas políticas concretas ou detestassem ter passado pela “austeridade” por que passaram, o facto de já terem passado por essa experiência governativa dava-lhes uma noção mais clara do que seria um segundo governo PSD/CDS; já o PS, que ainda por cima fora responsável pela quase bancarrota que trouxe a austeridade, aparecia como uma incógnita, causadora de uma inquietante incerteza, sem garantia que não se “desperdiçasse o que se tinha conquistado”. Na hora de colocar o boletim de voto na urna, disseram as classes conversadoras, “os portugueses” preferiram votar no diabo que conheciam em vez de no novo que lhes prometia o Paraíso mas não podia dar garantias de que lá se chegaria.

A crer nas suas acções desde essa noite de 4 de Outubro, António Costa concorda com esta análise eleitoral: por achar que o PS “perdeu as eleições” pelo simples facto de não estar ainda no Governo, Costa procurou aproveitar a oportunidade que a configuração parlamentar lhe dava de formar um governo com o necessário apoio na Assembleia para substituir Passos, na esperança de que uns tempos em São Bento (e uma ou outra medida popular) fizessem dissipar do julgamento dos portugueses os receios em relação ao PS, e que nas próximas eleições (sejam elas quando forem) o mesmo “encontro imediato” com a incerteza na hora do voto derrotasse PSD e CDS como agora derrotara o PS.

Para azar de Costa, esta interpretação do resultado eleitoral das legislativas está (ou pelo menos assim me parece) profundamente errada, e basear a sua acção política com base nela só poderá dar em asneira. Se a distribuição de votos pelos partidos em 4 de Oubtubro autoriza uma interpretação, é apenas esta: ao mesmo tempo que o vasto número de pessoas que votaram nos partidos da oposição demonstra um enorme descontentamento com o Governo da coligação PSD/CDS, o relativamente diminuto número de pessoas que votaram no PS e o enorme conjunto de pessoas que nem sequer foram votar reflectem uma ainda maior desconfiança em relação ao PS como potencial alternativa. Nessas condições, ir para o Governo implementar medidas populares não oferecerá a Costa a conversão de uma multidão anteriormente relutante; pelo contrário, ir para o Governo com tamanha desconfiança dos governados em relação a ele fará com que Costa – a cada passo, a cada medida, a cada polémica – seja confrontado com essa mesma desconfiança, que fará com que até as tais medidas “populares” sejam encaradas como “boas demais para ser verdade”, destinadas a comprar votos com vantagens imediatas mas com um preço altíssimo a ser pago mais tarde. É aqui, e não na falta de “estabilidade” e “solidez” dos acordos com os partidos que o viabilizarão, que reside o problema do “Governo de iniciativa do PS“: estará no poder sem ter condições – em termos de apoio popular – para o exercer. Fontes Pereira de Melo, talvez o político mais bem sucedido da história portuguesa, seria certamente capaz de explicar a Costa o que o aguarda: “nenhum governo pode manter-se muito tempo no poder, desde que o apoio da opinião pública lhe falte, ainda que tenha grandes maiorias no parlamento”. E se o líder do PS considera que as palavras de um senhor do século XIX pouco lhe têm a ensinar sobre os tempos de hoje, então que fale com o dr. Santana Lopes, que facilmente lhe explicará o que é governar perante a desconfiança generalizada da tal “opinião pública”.

O pior deste erro de Costa em ir para o Governo em vez de ficar na oposição ao governo minoritário (e que padeceria de problemas semelhantes) da coligação PSD/CDS é que acabará por prejudicar acima de tudo o país, entregue a não se sabe bem quanto tempo de um Governo sem capacidade para o ser, e que só conseguirá confirmar no português comum a ideia de que “os políticos” só se preocupam com “o poleiro e o tacho”, diminuindo ainda mais a já muito diminuída (até por Passos e Portas) capacidade de se fazerem em Portugal as reformas que o país precisa que sejam feitas.

Mas se António Costa cometeu este erro em vez de dar ouvidos a Francisco Assis, que o percebeu bem, seria bom que esse erro singular não se transformasse, pela boca de Passos Coelho e Cavaco Silva, em três. Infelizmente, talvez já seja tarde demais. Em vez de se limitar a dizer que iria para a oposição ao “Governo de iniciativa do PS”, explicando o porquê deste ser nocivo aos interesses do país mas sem pôr em causa a sua legitimidade, Passos Coelho cometeu o erro de insistir que a vontade legítima dos deputados eleitos pelos portugueses do PCP, do BE e do PS se traduzem num “golpe” e numa “fraude”, cuja “ilegitimidade” justificaria uma revisão imediata da Constituição de forma a impedir que ele se concretize. Ao ter esta atitude, Passos acaba apenas por fortalecer o apoio a uma solução negativa para o país: todos aqueles eleitores socialistas que partilhassem com Assis receios quanto ao “Governo de iniciativa do PS”, confrontados com o ataque de Passos, não hesitarão em pôr de lado essas suas hesitações e em cerrarem fileiras em torno do dito; o próprio BE e o PCP tratarão de ter o maior dos cuidados em não criar problemas a Costa, garantindo assim que uma série de medidas que fortalecem as suas clientelas mas são prejudiciais ao país são efectivamente tomadas. A posição “forte” de Passos talvez console os fiéis e os dependentes do PSD e do CDS, que olham para estas coisas como se de um confronto entre claques de futebol se tratasse, e deliram sempre que os seus líderes agem como Bruno de Carvalho, Luís Filipe Vieira ou Pinto da Costa (ou José Sócrates). Só que, ao contrário do que diz a canção, “o que faz falta” ao país é tudo menos “animar a malta”: Portugal precisa, isso sim, de alguém que se oponha à asneira que António Costa imprudentemente produziu, sem a fortalecer, e sem lançar um país num conflito político sem saída.

Infelizmente, parece que Cavaco Silva talvez não seja essa pessoa. Nos últimos dias, enquanto encena uma sucessão de sessões de “beija-mão” com os mais variados representantes de organizações corporativas de dependentes do Estado (mais digna do “Estado Novo” do que de um regime representativo com um Parlamento democraticamente eleito), o Presidente da República tem insinuado que não irá aceitar indigitar António Costa como Primeiro-Ministro, deixando o país com um governo de gestão até ao Verão do ano que vem. Ao contrário do que “à esquerda” se diz, o Presidente tem tanta legitimidade para indigitar Costa como para optar pelo Governo de gestão; mas ao contrário do que “à direita” se tem argumentado (por vezes com suprema hipocrisia), o facto do Presidente poder optar por não dar posse a Costa não significa que o deva fazer. E fazê-lo seria, aliás, um erro tão grande como o cometido por Costa: ao rejeitar uma solução (por muito frágil que ela seja) oferecida pela maioria dos deputados eleitos, numa altura em que não se pode recorrer a eleições, nem há condições para mudar a lei de forma a alterar essa situação em tempo útil, Cavaco apenas conseguiria criar um conflito institucional entre a Presidência e a Assembleia, que inquinaria a próxima eleições presidencial, ao mesmo tempo que para todos os efeitos práticos daria início a uma longa campanha eleitoral de cerca de oito meses que cedo descambaria para a violência verbal e talvez até física entre as partes em confronto. E quem espere que dessa confusão nascerá algo de clarificador quando os portugueses voltassem a ir a votos que tire o cavalinho da chuva: a única coisa que o triste espectáculo de acusações mútuas de “golpismo” e “atentados contra a democracia” produziriam seria o agravar do já acentuado desprezo que cada vez mais eleitores sentem por “eles”, “os políticos” que “só sabem dizer mal uns dos outros”; meses e meses de discussão exclusivamente dedicada a quem é que tem o direito a alimentar-se do festim do Orçamento de Estado apenas confirmarão na cabeça de muita gente a ideia de que “os políticos” se preocupam mais com os seus joguinhos do que com o governo dos assuntos públicos.

Ao querer ir para o Governo nas presentes condições, António Costa criou para si e para o país um enorme problema, que muito caro lhe custará e mais ainda nos custará a nós. Mas a partir do momento em que escolheu, com toda a legitimidade, cometer esse erro de querer governar sem as condições para o poder fazer eficazmente, Costa deve ser autorizado a cometer esse erro até que a legislatura termine ou que a sua “solução” se desfaça a si própria. Caso contrário, não será apenas ele a errar mas também Passos Coelho e Cavaco, e o preço que todos nós teremos de pagar será ainda mais elevado.

Aldrabice eleitoral

2014-02-28-maria-luis-albuquerque-1É difícil explicar como é que o cálculo da devolução da sobretaxa de IRS cai de 35% para 0% em dois meses. Ninguém com dois dedos de testa acredita que seja possível que depois de oito meses de execução orçamental, um cálculo honesto aponte para 35% de devolução e meros 2 meses depois esse valor caia para zero. Das duas uma: ou houve uma incompetência centena no desenvolvimento das fórmulas do modelo de cálculo ou, mais provável, houve uma pura intenção de aldrabar a opinião pública por motivos eleitorais usando ferramentas do estado. Se se confirmar esta última opção, isto pode ser um indicador de decadência socretina da ainda coligação de governo que se lamenta.

Rating da DBRS

"Lixo" | Felizberto - Emmanuel Avetta @flickr.com (creative commons)
“Lixo” | Felizberto – Emmanuel Avetta @flickr.com (creative commons)

Hoje espera-se que a agência de rating canadiana DBRS mantenha o rating da dívida pública portuguesa. É a única que ainda o faz, o que permite ao Banco Central Europeu continuar compra de títulos no mercado a fim de baixar (artificialmente!) as taxas de juro daqueles.

No entanto, também se espera que a perspectiva do rating seja reclassificada de “negativa”. Significa que aquela agência vai possivelmente aguardar pela formação de um governo e apresentação do Orçamento de Estado. Tanto o presidente Cavaco Silva como António Costa (caso seja indigitado) terão de ter cuidado com as decisões a tomar nas próximas semanas.

Exclusivo: as linhas do acordo entre comunistas e socialistas

PCP

Econoima e Aparelho Produtivo.

Soberania, Política Externa e Defesa.

Pertence ao actual secretário-geral comunista a frase:  “valeu e vale a pena empunhar estas bandeiras, hoje e sempre por Portugal, pelos portugueses, com Portugal e com os portugueses. Também assim e agora a rasgar as alamedas do futuro no chão alicerçado por Abril.”  A frase é retirada da parte final do discurso de Jerónimo de Sousa, em 2006,  no Pavilhão Atlântico, na campanha das Presidenciais.

O Partido Comunista Português (PCP) – o mais moscovita-estalinista dos partidos comunistas da Europa, há muito que não ganha qualquer eleição a concorrer enquanto PCP. As que tem  “ganho”, aconteceram no âmbito autárquico como FEPU, APU e com a actual CDU. Enquanto partido conservador- comunista, o título do seu programa político não podia ser e estar mais adequado. Intitula-se “Uma   Democracia Avançada – Os Valores de Abril no Futuro de Portugal”. Presume-se que o Abril, se reporte ao moderno ano de 1974.

Após a falência e derrocada do comunismo na Europa de Leste,  houve necessidade de purgar os elementos menos ortodoxos, cabendo a alguns deles a abertura de novos movimentos de participação cívica-comunista-na-realidade-mas-com-outro-nome ou mesmo  a integração de outros dissidentes em partidos neo-comunistas como o PS..

Tendo em conta as primeiras linhas do acordo político que O Insurgente revela entre os derrotados das últimas eleições legislativas, enganaram-se todos aqueles que afirmavam que seria impossível firmar um acordo da Frente Unida de Esquerda. Ou que seria mais plausível um acordo de legislatura baseado no entendimento democrático e popular com o governo da Coreia do Norte do que com qualquer outro movimento de esquerda mais reaccionário. O Presidente da Câmara de Loures poderia até ter dado uma mãozinha solidária naquela “germinação”. No futuro próximo, oportunidades não faltarão.

Avante, camaradas de todas as estirpes o palco é vosso. A falência será nossa.

O acordo

[Acta da reunião entre o Presidente da República (Aníbal Cavaco Silva) e o secretário-geral do Partido Socialista (António Costa)]

Cavaco: Bem-vindo.
Costa: Obrigado senhor presidente.
Cavaco: Vamos lá então ao que interessa. Quais as conclusões que retirou dos resultados das eleições legislativas?
Costa: Senhor presidente, é simples. A coligação Portugal à Frente não conseguiu a maioria na Assembleia da República. E face ao novo cenário político achamos que o senhor deve indigitar-me imediatamente como primeiro-ministro.
Cavaco: Como assim?
Costa: Para Portugal não perder tempo senhor presidente. Já todos sabemos que um governo da coligação de direita será chumbado no Parlamento.
Cavaco: E todos os deputados do seu partido aprovam a moção de rejeição? É que tenho ouvido vozes dissidentes…
Costa: Tratam-se de um ou dois militantes sem representação. Todo nós no partido estamos ansiosos para ocupar… desculpe… governar.
Cavaco: Mas para governar o senhor precisa de um acordo com Bloco de Esquerda e Partido Comunista.
Costa: Acordo?
Cavaco: Sim. Senão terá apenas a tal maioria negativa que no dia das eleições o senhor disse não ser suficiente.
Costa: Temos uma alternativa real e credível.
Cavaco: Explique-me então os parâmetros desse acordo.
Costa: Tenho garantias que o governo de Passos Coelho não será aprovado.
Cavaco: Pois. Isso já percebi. Mas que acordo de governo tem com Bloco e PCP?
Costa: Que acordo?
Cavaco: Se você está disposto a chumbar solução governamental à direita então está a dizer que já tem acordo com restantes partidos para formar governo?
Costa: Senhor presidente, para eu formar governo primeiro tem de me indigitar como primeiro-ministro.
Cavaco: Vamos ser claros. É que PSD e CDS têm um acordo assinado…
Costa: Desculpe interromper senhor presidente, mas eles não têm a maioria necessária para governar.
Cavaco: O seu partido também não tinha essa maioria nas legislativas de 1995, 1999 e 2009.
Costa: Ahhh, mas é evidente que os partidos de direita nunca se teriam coligado com a extrema-esquerda.
Cavaco: E agora o PS está disposto a fazer esse acordo com a extrema-esquerda?
Costa: A questão essencial é que a direita não tem maioria.
Cavaco: Se o senhor não me pode apresentar um acordo terei de indigitar o senhor Passos Coelho.
Costa: É uma perda de tempo…
Cavaco: Tem de entender que não posso trocar um governo minoritário por outro ainda mais minoritário. Preciso de garantias.
Costa: Senhor presidente, a esquerda tem maioria absoluta no Parlamento!
Cavaco: Essa maioria não me parece existir. É que o seu programa eleitoral até está bem mais próximo do PaF do que do Bloco ou PCP.
Costa: Não é assim que analisamos os resultados das eleições. A maioria dos portugueses rejeitou a continuação da austeridade.
Cavaco: Está a dizer que o PS agora rejeita o Tratado Orçamental?
Costa: Não!!! O nosso programa é claro. Vamos cumprir todos os compromissos com União Europeia.
Cavaco: Ok, já percebi. Vai dar outro nome à austeridade. E partidos à esquerda estão de acordo com o vosso programa?
Costa: PS não vai governar com programa dos outros.
Cavaco: O mesmo disse Passos Coelho e o senhor não foi capaz de fazer cedências. Catarina Martins e Jerónimo de Sousa cederam nos seus programas?
Costa: As negociações estão a correr bem.
Cavaco: Pois, mas noto que ainda não têm acordo.
Costa: Que acordo?
Cavaco: Oh diabo! Assim não vamos lá. Olhe, vou indigitar o líder do PSD e depois logo vemos como corre. Dou por finalizada a reunião.
Costa: Eu respeito a sua decisão mas o senhor está apenas a adiar o óbvio. Boa tarde senhor presidente.
Cavaco: Boa tarde.

[À saída António Costa telefonou a Porfírio Silva, membro do Secretariado Nacional do PS]

Costa: Porfírio, o presidente vai indigitar o Passos Coelho. Mas estamos no bom caminho para ser governo.
Porfírio: Boa chefe. Então já temos acordo com Bloco e PCP?
Costa: Que acordo?

PS_BE_PCP

 

Podem contar com PCP?

Via Luís Aguiar-Conraria, editorial do jornal Avante (meus destaques):

Há uma base institucional para outras soluções governativas que impeçam PSD/CDS de formar governo e prosseguir a sua política de desastre, exploração e empobrecimento. Nesse sentido, o PCP apresentará uma moção de rejeição ao programa de um governo PSD/CDS, caso venha a ser presente na Assembleia da República.

Ao mesmo tempo, considera inaceitável a operação em curso que visa marginalizar o PCP enquanto força de alternativa e rejeita qualquer questionamento sobre a sua legitimidade para se afirmar e assumir como força necessária à solução dos problemas nacionais.

Nunca escondemos que há significativas diferenças entre o PCP e o PS que, aliás, têm estado presentes nas reuniões que se têm realizado, num esforço de exame das possibilidades de soluções políticas, que prossegue. O que dizemos é que, não sendo possível a convergência para uma política que responda às aspirações dos trabalhadores e do povo, nada obsta a que o PS tome a iniciativa de formar governo e entrar em funções.

O PCP reafirma que há uma maioria de deputados que constituem condição bastante para a formação de um governo de iniciativa do PS, que permite a apresentação do programa, a sua entrada em funções e a adopção de uma política que assegure uma solução duradoura.

(…)

«O PCP não abdicou nem abdica – como referiu o camarada Jerónimo de Sousa no comício do Porto do sábado passado – de lutar por uma política que responda de facto aos direitos dos trabalhadores e do povo, à elevação das suas condições de vida, ao combate às injustiças e desigualdades sociais, ao necessário crescimento económico e a uma efectiva política de emprego».

Passa programa de Governo mas não Orçamento? Ou só garante mesmo moção rejeição do programa PSD/CDS? É que ao PS, para ser Governo (e governar), não bastará votos do BE e PAN.

Um país ingovernável

Costa-Cavaco-Passos Quando, dois dias depois das eleições legislativas, o Presidente da República Cavaco Silva se dirigiu ao país para lhe anunciar o que saíra da sua reflexão sobre os resultados eleitorais e o futuro do seu governo, declarou ser necessário encontrar “uma solução governativa que assegure a estabilidade política e a governabilidade do país”. Provavelmente, não poderia dizer outra coisa, mas a ausência de uma frase alternativa não torna o conteúdo da que acabou por usar mais realizável. E a verdade é que, da actual situação política em que Portugal se encontra, não há nenhuma “solução” possível que “assegure a estabilidade política e a governabilidade do país”.

Basta olhar para as várias alternativas para o perceber: um governo minoritário da coligação PSD/CDS, viabilizado pela abstenção de um PS na oposição, viveria por alguns meses na corda bamba até que um belo dia o PS se fartasse de servir de muleta a uma política que considera errada (e a uma rede de clientelas que lhe “rouba” fontes de rendimento), ou a coligação achasse que era mais vantajoso partir para eleições antecipadas do que continuar a praticar equilibrismos; um governo do PS com o apoio do BE e do PCP (ou em conjunto com eles) teria sempre o problema de deixar um dos principais partidos do regime à mercê dos cálculos e humores de dois partidos anti-democráticos, que apostam na fragilização do PS para se afirmarem, e que conseguiriam essa fragilização aliando-se ao PS no parlamento (ao ir para o poder depois de ter tido a confiança de um número de portugueses menor ainda que os que confiaram na coligação, ainda por cima através de uma aliança com dois partidos cuja natureza ideológica os torna nóxios aos olhos de uma vasta maioria da população portuguesa, o PS teria, a cada medida polémica que pretendesse aplicar, a menor das benevolências por parte do eleitorado e o maior dos sofrimentos para sobreviver por mais que uns meses); e um “Bloco Central” ou “Grande Coligação” entre PSD, CDS e PS, embora talvez assegurasse um governo ao longo de quatro anos, provocaria a longo prazo uma grave degradação da saúde do próprio regime, com consequências imprevisíveis. Talvez uma maioria absoluta da coligação PSD/CDS, ou uma maioria absoluta do PS, pudessem ter assegurado essa tal “governabilidade” que o Presidente e os partidos dizem procurar. Mas o facto de elas não terem ocorrido não é uma causa da “ingovernabilidade” do país; é, isso sim, um sintoma da sua prévia existência. E é esse o erro que Cavaco e todos os que anseiam por uma solução pós-eleitoral que traga “governabilidade” cometem: não percebem que o resultado eleitoral e a falta de maioria absoluta de uma das formações políticas concorrentes não provocaram “ingovernabilidade”, antes foram o reflexo da “ingovernabilidade” de que Portugal já padecia.

O Governo de Passos e Portas herdou dos seus antecessores um estatismo que, embora mais parcimonioso nos gastos, deixou intacto. Apesar da retórica “liberalizante”, o Estado continua a gastar metade da riqueza produzida pelo país. Tendo em conta que esta já não é particularmente avultada, ter uma tão grande porção dela a ser desperdiçada pela conhecida falta de juízo de governantes e funcionários públicos só traz mais problemas ao país: a continuada e crescente dependência da decisão e do favor político para o sucesso de uma actividade privada; a ineficácia dos serviços que o Estado se propõe prestar aos cidadãos; a forma como o seu pretenso igualitarismo e o objectivo de uma maior “justiça social” se traduzem num sistema profundamente injusto, em que se dá a quem precisa e a quem não precisa – ou seja dando demais a quem não precisa e de menos a quem precisava de receber mais; tudo agravado pela insustentabilidade e inevitável falência a médio, longo prazo. E enquanto esse dia não chega, para se alimentar a si próprio e aos seus dependentes, o Estado precisa de extrair – através dos impostos, “taxas” e “contribuições (ou seja, impostos por outro nome) – a todos os outros cidadãos portugueses uma parte cada vez maior dos seus rendimentos. E daí nasce o principal – e praticamente irresolúvel – problema político português: uma cada vez maior carga fiscal sobre os portugueses diminui-lhes o rendimento disponível, afectando as suas condições de vida e atrofiando a economia do país, ao mesmo tempo que continua a ser insuficiente para obter as receitas necessárias para cobrir a despesa pública, despesa essa que uma larga porção do eleitorado não parece disposta a aceitar que seja diminuída.

Não custa compreender por que razão os partidos têm a maior das relutâncias em diminuir o peso e o alcance do Estado na economia e sociedade portuguesas: a própria sociedade acompanha-os nessa relutância. Quanto mais decisões dependerem do carimbo de um qualquer governante ou funcionário, mais oportunidades existem para que as clientelas e grupos de interesse que tomaram os partidos de assalto usem as suas estruturas para assumirem o papel de intermediários no “mercado” da “influência” política. Os partidos transformaram-se em agências de emprego e facilitação de negócios, que precisam de ganhar eleições a nível nacional e autárquico para poderem cumprir essas funções, e que por isso não têm qualquer incentivo para promoverem as reformas de que o país precisa. Mas mesmo que os partidos – nomeadamente os dois principais – fossem mais do que gigantescas máquinas de caçar votos obcecadas em ganhar eleições de forma a ter os meios de distribuição dos despojos da vitória democrática pelos fiéis; mesmo que só um destes partidos fosse liderado por um conjunto de pessoas bem intencionadas que pretendessem promover uma série de reformas que diminuíssem o poder dos tentáculos do polvo estatal; mesmo nesse caso, teriam uma enorme dificuldade em obter o necessário apoio eleitoral. É esse o verdadeiro significado dos famosos números de Medina Carreira, de 60% de dependentes directos ou indirectos do favor estatal que formavam um “Partido do Estado”: os partidos não têm qualquer incentivo para realizarem quaisquer reformas porque um número significativo de eleitores não tem qualquer incentivo para os deixar fazê-las.

Claro que se pode argumentar que se e quando o país se encontrar de novo à beira da bancarrota, as medidas que anteriormente pareciam demasiado severas para serem contempladas seriam então encaradas como ligeiramente mais toleráveis, um mal necessário para afastar um outro ainda pior. Mas é difícil para qualquer um desses tais 60% de portugueses aceitarem que devem ser eles, pessoalmente, a suportar o fardo desse mal necessário, e não o seu vizinho em situação semelhante. É a Primeira Lei do Debate Político Português: toda e qualquer medida dura e impopular é sempre aceite como necessária em abstracto, e é sempre rejeitada na sua implicação efectiva.

O problema está em que a falta de vontade em promover essas reformas que diminuam o estatismo que estrangula o país não as tornam menos necessárias, antes pelo contrário. Quanto mais tempo permanecem adiadas, fechadas numa gaveta ou sem sequer chegar a ser postas num papel, mais a qualidade dos serviços como a Saúde, a Educação, a Justiça ou a própria Administração Pública se degradam devido à falta de meios para os financiar, mais o Estado tem de aumentar os impostos para ir alimentando – insuficientemente – os seus cofres, e mais o Estado se aproxima do ponto em que vai mesmo deixar de ter meios para cumprir todas as obrigações com que está comprometido.

A combinação da relutância do eleitorado em dar o seu apoio a reformas que diminuam o peso e alcance do Estado na sociedade com a crescente necessidade dessas mesmas reformas em virtude das cada vez mais negativas consequências desse estatismo excessivo produz apenas um resultado: ao mesmo tempo que fica descontente com todo e qualquer governo, seja de que partido for, que implemente uma medida que introduza a mais insignificante das alterações ao status quo estatista, o eleitorado nutre um igual sentimento de revolta contra as implicações quotidianas que resultam da manutenção do estatismo que não querem ver alterado. Abonimam a realidade que enfrentam no seu dia a dia e ao mesmo tempo opõem-se ao que poderia mudá-la. Assim, faça o que fizer, faça reformas ou ceda ao imobilismo, qualquer governo cedo enfrentará a ira do eleitorado. E é portanto natural que, como se verificou nestas eleições, à falta de confiança no poder do momento não corresponda uma adesão à alternativa.

A democracia portuguesa é assim lançada num ciclo vicioso de que será dificílimo sair: à medida que um número crescente de eleitores desconfia cada vez mais dos políticos de qualquer partido, mais esses políticos ficarão dependentes do apoio dos grupos que se opõem às medidas que poderiam melhorar as vidas do resto da população, provocando assim o aumento do descontentamento dessa parte da população, tornando os partidos ainda mais dependentes do apoio daqueles que votam neles independentemente do que fizerem ou fazem parte das suas clientelas, marginalizando ainda mais os todos os outros, e assim sucessivamente, sem fim à vista, enquanto as consequências da sobrevivência do estatismo que nos sufoca se tornam cada vez mais negativas – e o descontentamento com elas cresce – sem que diminua a relutância em acabar com ele.

Reza a lenda que nos longínquos tempos da Antiga Roma alguém terá dito, acerca do “povo” que à altura habitava neste cantinho da Ibéria, que “não se governa nem se deixa governar”. A frase é umas vezes atribuída a Júlio César, outras vezes a um general romano com responsabilidades governativas na península, e é bem provável que não tenha sido dita por ninguém. Mas quando os eleitores detestam em simultâneo o estado a que o país chegou e as reformas que poderiam aliviar os seus males, ela parece aplicar-se muito bem à realidade do país, e uma fiel descrição da crise de governabilidade que afecta o sistema político democrático português, e que as eleições legislativas de 2015, longe de terem criado, apenas puseram a nu.