Autor: Michael Seufert
Sic transit…
Entretanto passou despercebido este momento do governo. Os ATLs e as famílias, na Sexta-Feira, estavam preparados para poder arrancar na Segunda-Feira a operação normal. Já depois do fecho de expediente, o governo anuncia que não, só dia 15. E nesse dia 15, só os ATLs fora dos estabelecimentos escolares, uma distinção nunca antes feita na comunicação do governo e sem qualquer sentido, os restantes (nos estabelecimentos escolares) esperam até ao final do ano lectivo.
“A decisão, avançou o primeiro-ministro, decorre de uma necessidade de preparar a organização dos espaços onde se desenvolvem estas actividades.” – esta declaração do primeiro-ministro é um disparate. Haveria certamente espaços que precisariam de mais tempo e espaços que já se tinham organizado. Como já se tinham organizado as famílias para ter um pouco mais de normalidade e os seus filhos nos ATL – ou não, numa escolha livre.
O que aconteceu foi muito simples, e é por isso que houve o adiamento e por isso que houve a separação entre ATLs em escolas e ATLs fora das escolas: a FENPROF não quer que as escolas abram e ameaçou o governo de uma barragem na comunicação social sobre uma suposta impreparação das escolas para abrir, culpando o governo sobre vidas supostamente colocadas em risco. E quem paga a factura desta loucura? Os pais, as famílias e o país que continua bloqueado enquanto tivermos o AVANTE para abrir mas as escolas fechadas. E foi isto, assim na Sexta-Feira e pela calada. E pouco mais de cinco linhas na imprensa.
O CDS no seu labirinto
Escrevi no Observador sobre o actual momento do CDS e o seu futuro imediato. É dar lá um saltinho e voltar de seguida.

Fake News
A AFP errou. Aparentemente publicaram uma notícia debaixo do título de “#BREAKING More than 100,000 children in migration-related US detention: UN” que era fake. Afinal, após clarificação pelo autor do estudo, concluiu-se que esse número dizia respeito ao total número de crianças detidas por questão relacionadas com migração em 2015 – não sei se não é novamente fake e o número se refere às detenções desde 2015. “We will delete the story”.
A AFP é transparente com o seu erro, e isso é de aplaudir.
Pessoalmente, no entanto, preferiria uma rectificação na história original. É que abre-se aqui o flanco para teorias das conspiração que não ajudam nada ao estado de desconfiança para com os media: então o relatório era notícia se fosse debaixo da acção de Trump, mas já não vale se afinal foi nos tempos de Obama? É certo que há um valor no “BREAKING” da notícia, ou seja se os dados se referirem a uma situação actual isso pode ter valor diferente do que um relatório sobre uma situação de há 4 anos. Mas dadas as circunstâncias de se ter publicado, não seria de manter a notícia no ar, devidamente corrigida?
A imprensa está debaixo de fogo constante nos tempos que correm. Narrativas de conspiração são muito mais fáceis de construir com deslizes deste tipo.
Do transformismo
Chega de Saudade
Com a morte de João Gilberto morre o último dos três pioneiros da Bossanova. O papel de Gilberto é talvez o mais fácil de descartar mas, a meu ver, foi o mais fundamental e felizmente vivemos num tempo em que basta um vídeo para – conhecendo o resto da sua carreira – o comprovar.
A gravação acima é a primeira gravação do tema “Chega de Saudade”, publicado em 1958 no álbum “Canção do Amor Demais” – disco famoso talvez também por ser citado em “Carta do Tom” em que Vinicius recorda a Jobim “você ensinando pra Elizete as canções da Canção do Amor Demais”. Para Vinicius, resulta claro, foi ali que tudo começou. E supostamente já está lá tudo: o poema de Vinicius, a música de Jobim e até o próprio Gilberto no violão.
Está lá tudo, mas não está. Elizete Cardoso, não obstante o citado ensinamento por Jobim, não canta Bossa Nova como a conhecemos. Aliás, e perdoem-me a heresia, a mim esta interpretação lembra-me sempre Maria da Graça, no Pátio das Cantigas, a cantar a Camisa Amarela. Elizete ainda arrasta as palavras, não acompanha a batida que o violão quer impornotqando-se que ainda está presa ao som brasileiro dos anos 40.
Quem verdadeiramente arrancou com a Bossa Nova foi Gilberto quando decidiu, apenas meses mais tarde, emprestar a sua voz ao poema de Viniciu e à música de Jobim. Nascia então sim a Bossanova como a conhecemos.
João Gilberto morreu no passado Sábado, dia 6 de Julho de 2019. Deixa Saudade.
Da solidão na política

Completamente sozinhas
O que mais me impressionou estes dias com a divulgação do desenrolar dos vários incêndios do fim-de-semana (e ao recordar os de Junho) não foi nem a área ardida nem aliás o número de mortos.
Ambos por si só impressionam, é certo (maior área ardida de sempre e «desde que há registos, nada se compara ao que se passou em Pedrógão Grande»), mas duvido muito que seja sério tirar grandes ilações da área ardida, p.ex. Há variações muito grandes de ano para ano e é até provável que muitas vezes deixar arder uma área – sem bens nem pessoas a proteger (“fires that are sparked in remote wilderness, where they aren’t hurting anyone, should be allowed to burn“) – dum determinado incêndio seja o melhor combate possível, pelo que parece que a área ardida pode depender muito mais de factores incontroláveis do que de factores controláveis.
O que me choca e salta à vista é que entre o enorme número de mortos haja tão poucos bombeiros (um apenas, salvo erro, este ano) e tantos mortos na estrada. Não estou, evidentemente, a colocar em causa o trabalho dos bombeiros ou a insinuar qualquer tipo de problemas com a sua competência ou dedicação. Nem duvido que sempre que presentes os bombeiros estão na primeira linha de fogo apenas com uma mangueira entre si e o fogo.
Mas é uma evidência: consultadas as notícias (não sei se há estatísticas consolidadas) salta à vista que – e isto é expectável – tipicamente as mortes ocorrem muito mais do lado de quem combate e está envolvido directamente com os incêndios do que do lado dos civis. Ora este ano a situação inverte-se de forma brutal: Em mais de 100 mortos só um é bombeiro.
Este facto é central na análise que se tem de fazer da tragédia dos incêndios deste ano. E ensaiando alguns cenários possíveis para qu neste ano tenha havido tantos mortos na esmagadora maioria civis – e tantos na estrada – há um que me parece mais evidente ainda que possa estar errado. E deixa-me transtornado e assustado.
É que não me parece que tão grande discrepância face a incêndios em anos passados possa ser culpa da meteorologia, dos eucaliptos ou de factores aleatórios. A impressão que tiro desta enorme diferença face a anos passados é que este ano (aquel)as populações foram abandonadas à sua sorte – apanhadas pelo fogo, a tentar combater o fogo ou a fugir do fogo. Aquelas mais de cem pessoas morreram porque não tiveram nenhum apoio e estavam completamente sozinhas.
Salazar e Le Pen: a luta continua
Daqui se conclui com relativa evidência: tivesse Salazar tido a “lucidez” de chamar União Nacional Trabalhista ao seu partido único e de chamar às colónias “territórios de resistência ao imperalismo” teria podido contar com Cunhal como seu fiel ministro – tudo o resto seria o Estado Novo como o conhecemos: prisão de opositores (banal desde Lenine), censura prévia na imprensa (nada mais comum no Pacto de Varsóvia) e colonialismo (URSS, alguém?).
Isto e mais no Expresso online.