Problemas de primeiro mundo

A estratégia da Irlanda (e repare-se que uma estratégia de um país não é a mesma coisa que uma aposta táctica de um partido que quer ser governo nesse país) de baixos impostos para as empresas só não é um sucesso para quem não quer ver (que são muitos por essa Europa fora) e foi conseguida através de vários mecanismos entre os quais uma taxa de IRS elevada aceite com alguma naturalidade pela população (que como qualquer europeu adora o seu estado social) como o custo de atrair as ditas empresas. A lógica era e é que seria preferível ter os empregos com IRS alto do que ver as empresas deslocadas para outros lados e ninguém se espantou quando veio a crise que o IRC permanecesse intocado enquanto a mão de obra viu as suas contribuições aumentarem (claro que só foi possível e fácil fazer esta decisão mesmo quando os “parceiros” europeus tudo tentaram para subir o IRC porque se trata de uma estratégia e não de uma táctica partidária).

A crise lá foi passando, o desemprego lá foi descendo e as multinacionais continuaram a assentar por aqui arraiais o que faz com que a Irlanda venha hoje a deparar-se com um problema da sua estratégia: não há mão de obra qualificada (em certos sectores como informática e saúde) para fornecer todas as empresas que querem fazer da Irlanda a sua porta para a Europa. A crise ajudou (e muito) a que os emigrantes dos PIGS viessem colmatar esse problema mas entretanto, se excluirmos os apoiantes do Syriza, essa torneira fechou e não há volta a dar: a elevada taxa de IRS (para padrões civilizados) é hoje um grande entrave à atracção de mão de obra especializada (que por o ser está normalmente bem instalada sem necessidade de emigrar).

Caso não rebente a bolha brevemente (isso é outro assunto) convém que se pense bem o que por aqui se vai fazer com a recuperação economica. A tentação é obviamente enorme para voltar ao despesismo (a função pública contará já este ano com uns aumentos valentes) agravado por as eleições estarem próximas mas se o modelo é para ser continuado a opção terá que ser para baixar os custos de mão de obra via redução das contribuições de quem trabalha. De outra forma os custos para as empresas não se podem justificar a longo prazo e a única coisa que terão na Irlanda é uma pequena força de trabalho que lhes permita fazer vendas a baixo IRC enquanto o trabalho especializado e centros de decisão vão para outras paragens Continue a ler “Problemas de primeiro mundo”

Descubra as diferenças

Ciara Whooley é uma adolescente de 17 anos que constituiu a sua própria empresa – Irish Baubles – com apenas 16 anos. Com a produção centrada na Ásia por razões óbvias, Ciara tem hoje mercado para além fronteiras e exporta activamente para o Reino Unido, EUA e África do Sul sempre com os olhos postos em expandir a sua rede de distribuidores. Por terras celtas aparentemente não houve ataques de “varicela”, não só ninguém pareceu preocupado em difamá-la pela miséria a que sujeita os seus parceiros asiáticos como ainda por cima parece que lhe tecem rasgados elogios à forma como conseguiu trazer o seu produto ao mercado a um preço acessível e montar um plano de negócio arrojado independentemente da sua idade.

Por aqui esta iniciativa rendeu-lhe já variados prémios (honoríficos e monetários) e agora, graças ao Martim, podemos saber o que aconteceria a esta jovem empreendedora se tivesse o azar de nascer em Portugal. Prémios de empreendedorismo não seriam certamente, com um bocado de azar a única coisa a que podia aspirar era sair-lhe uma pseudo-intelectual na rifa a explicar-lhe como é mau dar emprego a pessoas que não ganham o que outro tipo qualquer que não tem nada a ver para o caso acha que deviam ganhar.

E a verdade é que sendo fácil personalizar em Raquel Varela o problema, olhando para o eco que é dado às suas palavras e ao esforço dedicado a destruir a imagem do Martim por essas redes fora,  ela é apenas mais um sintoma de uma sociedade portuguesa em avançado estado de decomposição. Uma sociedade aparentemente composta de gente que não entende o que é criação de valor numa cadeia produtiva mesmo que o dito valor lhes entre pelos olhos dentro. Não admira que não percebam o porquê dos (relativamente) baixos salários em Portugal e se tornem devotos seguidores de quem disser o que eles quiserem ouvir.

Não vou ser optimista ao ponto de dizer que na ilha não há “varicelas”. Infelizmente parasitas a viver do sistema encontram-se por todo o lado, mas ao menos nos países civilizados têm a decência de não morder a mão que os alimenta (em vez de serem convidados, com o dinheiro dos contribuintes, para perpetuarem as ideias que colocaram Portugal de rastos) e isto faz toda a diferença para se poder dar um “pontapé na crise”. Já que não fazem pelo menos saiam de cima.

Ao Martim os meus parabéns pela vontade de fazer. Ser novo ajuda a não estar contaminado pelas ideias dominantes do país que habita e a levar os projectos para a frente. De qualquer forma  recomendaria que acabasse a escola e se fizesse à estrada, se não emigrar depressa Portugal dá cabo dele e da sua vontade de fazer o que quer que seja.

Portugal não tem emenda

Acompanhei a manifestação de ontem ao longe, pelos jornais, blogs e redes sociais (sendo que não surpreendentemente os jornais foram os menos informativos do que se ia passando) e embora perceba a tentação de se denunciar a aldrabice que foram os números apontados pelo Bloco de Esquerda não sei até que ponto terá relevância (a maior parte já sabe que eles são aldrabões, quem não sabe vai continuar a não querer saber).

O mais relevante, na minha óptica, é que mais uma vez tivemos uma demonstração de que o país não tem emenda. Podemos falar de maiorias silenciosas? Claro que podemos (e devemos) mas também não podemos esquecer que as minorias ruidosas têm grande influência junto da classe governante (só a título de exemplo houve uma maioria silenciosa que não queria saber da liberalização do aborto para nada, nem sequer teve paciência para ir votar no referendo mas feitas as contas essa maioria silenciosa está agora a pagar os abortos que se fazem no SNS). O problema do país não é sequer aqueles cem mil (vá, arrendondado para cima) que se manifestaram ontem a favor de terem tudo o que sempre tiveram e não quererem pagar a conta. O problema do país é precisamente a maioria silenciosa que não abre a boca. A que come e cala estes anos perdidos de PSD/CDS onde pouco mais se fez que gerir a bancarrota perdendo-se oportunidades atrás de oportunidades para resolver os problemas essenciais do país.

Portugal não tem emenda porque não se vê meia duzia de gatos pingados à porta do parlamento a pedir diminuição da despesa pública. A classe política, gostem ou não, vai atrás das minorias ruidosas e pouco barulho se faz sobre o que interessa. Um pequeno exemplo: Era difícil mobilizar umas quantas pessoas para gritarem que queriam a RTP privatizada e deixar de pagar taxa audiovisual? Pelos vistos era e na falta de contraponto ruidoso o governo de tendência natural socialista lá continua a sustentar o elefante branco à conta do contribuinte.

Nunca houve uma minoria ruidosa contra o TGV, contra o aeroporto, contra os benefícios sociais… e aqui estamos. Não são cem mil pessoas naturalmente frustradas e facilmente instrumentalizáveis pela extrema-esquerda que são o problema da nação, afinal “tudo o que é necessário para que o mal ganhe é que gente boa nada faça”.

Mas sejamos sinceros, se a maioria silenciosa ainda não se levantou do sofá também não é agora que o vai fazer. E enquanto o tempo passa a frustração dos portugueses só vai aumentar, se o governo abdicou de fazer o necessário enquanto estava em período de graça não há razões parar crer que as coisas vão melhorar e reduzir as incertezas de quem vive em Portugal. A situação só pode piorar. À maioria silenciosa só lhe cabe ser cada vez menos maioritária à medida que o bom senso a leva a fazer as malas e saírem para sítios mais livres das influências do ruído das minorias.

E Portugal, assim, transforma-se numa balança que só tem peso de um lado a caminho do futuro que no fundo merece ter. Um dia a Troika há-de mesmo ir lixar-se e os portugueses que ficarem poderão finalmente banhar-se na total falência do país, ou nas palavras de Francisco:

– Señor D’Anconia, what do you think it will happen to this world?
– Nothing more and nothing less than what it deserves.

Ein Volk, ein Reich, eine Steuer

O Miguel já abordou o tema mas vale a pena voltar a pegar nele porque com esta amostra de ditadorzecos nacionais que os (not so) mass media insistem em dar voz convém ser o mais frontal e esclarecedor possível não vá alguém (além dos jornais) levar a peça a sério. E portanto vamos ser sérios, quem acha que o problema de Depardieu não são os altos impostos franceses mas o facto de na Bélgica serem mais baixos não vai parar obrigando a Bélgica a aumentar os seus impostos. Não vai parar porque não pode. E não pode porque a urticária e comichão que sofre quando vê um rico a fugir com o seu dinheiro para a Bélgica vai ser tão grande ou maior quando vir um rico a fugir com o seu dinheiro para a Suíça (os malandros também falam francês ainda por cima)  ou para o Liechtenstein. Isto não tem nada que ver com o espaço comunitário, quem gosta de roubar não respeita fronteiras.

Aliás o que estes ditadorzecos de trazer por casa não gostam mesmo nada é do dinheiro dos outros. E depois escudam-se em palavras muito bonitas, como “democracia” para legitimar o roubo. Porque para esta gente a democracia está lá é para isso mesmo, para que uma multidão enraivecida possa violar as liberdades de qualquer minoria, particularmente quando falamos de uma minority of one – essas bestas conhecidas como indivíduos. Deve ser por isso que a esquerda passa a vida a defender políticas que trazem apenas pobreza, parece que se vivermos todos bem é mais difícil manipular as massas para, de forma democrática claro, espoliar quem o ditadorzeco quiser. Que mais, pergunto eu, pode um indivíduo fazer nestas condições senão fugir para além fronteiras?

Ein Volk, ein Reich, eine Steuer. É esta a visão de certa gente para a Europa. E quando o dinheiro dos outros decidir sair da Europa a receita destes iluminados vai ser a mesma de outros como eles ao longo do tempo: ou fazem um muro para que não possam sair, ou espancam-nos e expropriam antes que eles se lembrem de ir embora. E a nossa imprensa acha por bem valorizar este tipo de opinião, depois queixam-se que ninguém está interessado em pagar para ler lixo.

PS: No outro lado do espectro podemos ver o que acontece quando em vez de hegemonia fiscal temos concorrência fiscal. O Reino Unido pode ter acordado tarde mas parece querer compensar o tempo perdido na competição com a Irlanda. Pode ser que estas ideias de hegemonia fiscal na UE sejam o passo definitivo para o RU sair, pelo menos alguma coisa de bom vinha ao mundo.

Circo todos os dias

Todo este artigo é uma comédia

Temos deputados da maioria que votam uma coisa e o seu contrário. A extrema esquerda a defender que num negócio entre estudante e empregador quem tem de bancar o pagode é obviamente o contribuinte e um conjunto de ex-governantes que concordando com o PCP acabaram de facto por largar grande parte da conta no contribuinte… alemão. Em suma, um país de chupistas… falido como merece.

Os jovens que vão fazer mas é fazer um estágio para o estrangeiro que não merecem esta sorte. Aliás mesmo que quisessem parece que é ilegal fazer o estágio sem custos. Agradeçam ao Pai Estado.

É para fazer agora o ar de surpreendido?

Hoje é o dia de fazer de conta que estamos surpreendidos pelo CDS ser socialista? A sério, ainda não tinha dado para ver pelos ministros do CDS? Ainda havia quem não tivesse percebido depois das ridículas “tentativas” dos ministérios do CDS baixarem a despesa? Já nos esquecemos que não é a primeira vez que o CDS é responsável por um aumento de impostos nesta legislatura? Ou estamos só a fazer de conta que no sistema eleitoral português nos surpreende o facto de os deputados respeitarem mais a liderança partidária do que os eleitores?

E amanhã vamos fazer de conta que estamos surpreendidos com os números da abstenção ou simplesmente com o facto de ninguém mexer uma palha quando os cortes chegarem a meia duzia de malucos que decidem fazer um golpe de estado?

Sobre os milagrosos 10% de IRC que vão transformar a economia portuguesa

Quando primeiro apareceu esta ideia de baixar o IRC para 10% foi anunciado como uma “taxa irlandesa” – provavelmente por  tipos que da Irlanda nem a página da Wikipedia conhecem visto que a única semelhança com a ilha verde é mesmo o número 10.

Em Portugal obviamente nunca poderia ser feita uma coisa tão simples como baixar impostos, não… isso qualquer um podia fazer. Um bom socialista tem que encher a proposta de lei com “ifs and what ifs” até conseguir transformar uma boa ideia numa aberração legislativa abaixo de inútil para que esta possa vir a causar mais problemas que soluções. A ideia deve ser depois fazer nova legislação para resolver os novos problemas dando a ideia que o Estado é uma coisa de gente muito ocupada e inteligente.

Mas voltando ao dito anuncio, começaram por dizer que os 10% eram só para investidores estrangeiros. Alguém lhes deve ter explicado que os investidores portugueses também são filhos de gente e avançaram então agora para a nova ideia que os 10% vão ser apenas para “novos” investidores. Os que cá estão podem fechar as portas que o Estado acha que não valem um corno. E o problema é só este, se  isto por acaso funcionasse (que não vai ser o caso mas já lá vamos) uma nova empresa que consegue roubar clientes à concorrência apenas porque dispões de um beneficio fiscal não é nenhum exercício de destruição criativa. Isto é a manápula gigante do Estado a interferir no livre mercado arriscando-se a levar à falência empresas que até poderiam estar melhor posicionadas para satisfazer as necessidades dos consumidores do que estas novas que entram com novo IRC. Ficamos pior.

O segundo ponto, e talvez o mais importante, é a forma socialista como este governo vê a economia. Como se o Estado tivesse ao seu dispôr uma máquina complexa e bastasse baixar uma alavanca chamada “IRC” para de repente o investimento começar a surgir do nada. Obviamente uma carga fiscal mais baixa é importante para atrair investimento, mas a principal diferença entre a Irlanda e Portugal é que na ilha é normal o IRC ser baixo. Em Portugal vai ser uma excepção. Quando a troika chegou à Irlanda vinham com ideias de subir o IRC para pagar a conta, o governo local bateu o pé, houve reuniões e reuniões mas o IRC ficou inalterado. E a diferença, mais do que o número que vem na taxa, que é  importante para quem está a investir é esta: de um lado está um país que lutou com a troika para manter o IRC baixo, do outro está um país que vai abrir um regime de excepção que provavelmente acabará assim que mudar o governo ou até antes disso se a troika mandar um espirro ou o próprio governo falhar as suas metas do défice. Quando alguém pensa em investir uns milhões em novos escritórios ou fábricas, qual é o país que escolhem? É que os impostos não são uma alavanca que se sobe e desce conforme queremos que as marionetes contribuintes façam aquilo que o Estado pretende. Os impostos não são apenas uma taxa, a estabilidade da política fiscal é tão importante quanto o número. E mais uma vez, de um lado temos um país que cortou na despesa para evitar subir os impostos e no outro temos um país que a cada oportunidade sobe mais impostos porque é incapaz de cortar na despesa.

Por fim, imaginando só por um instante que a alavanca mágica do ministério das finanças funcionava, quem é que estes novos investidores iam cá colocar a tomar conta das suas sucursais? É que com escalões de IRS do calibre que há em Portugal as competências há muito que começaram a passar a fronteira (e continuam a passar). Mais uma vez, na ilha as taxas de IRS foram apenas mexidas uma única vez desde 2008 e continua a atrair talento europeu para trabalhar e liderar as empresas aqui instaladas.

Talvez para a próxima que se queira anunciar os 10% como uma “taxa irlandesa” convenha saber que a Irlanda não é apenas IRC. Entrem num avião da Ryanair que está barato, venham falar com os empresários locais e descobrir porque é que a Irlanda é o 6º melhor país do mundo para fazer negócios. Não é apenas uma taxa, é todo um ambiente.

Quando quiserem começar a trabalhar nisso aí em Portugal avisem. Até lá deixem de fingir que estão a baixar os impostos cada vez que os sobem.

Opções (II)

Era uma vez dois países intervencionados pelo FMI.

Um andou a brincar ao 13º e 14º quarto mês com os funcionários públicos. O outro despediu-os.

Um andou a perseguir “o grande capital”. O outro manteve a taxa de IRC nos 10% e criou agora isenção de IRC para start-ups.

Um passa a vida a recorrer a receitas extraordinárias para esconder o défice. O outro decidiu aumentar as propinas escolares.

Um anunciou o maior aumento de impostos de que há memória para 2013. O outro em 2013 decidiu cortar os abonos de família e baixar subsídios a doentes, deficientes e idosos.

Um está num buraco sem fundo, o outro lá vai conseguindo ver a luz ao fundo do túnel. Segundo o FMI a Irlanda é o único país intervencionado que não está em recessão. São coisas que não acontecem por acaso, são fruto das opções politicas que se tomam e os portugueses deviam pensar profundamente que opções querem tomar para o futuro porque Pai Natal não há em lado nenhum.