Quando é que o Fascismo moderno vai começar a queimar livros e obras de arte?

No ponto em que já se vai na América: um quadro deve ser removido de exibição de um museu porque uma petição o considera “inapropriado” nesta época de prevalência do “assalto sexual”. Ora, o “assalto sexual” pode ser um fenómeno horrível, mas daí até dizer que 1) há uma epidemia do mesmo ou 2) que a remoção (ou destruição, já agora) de obras como esta iria ter algum efeito no número de assaltos sexuais – para ser simpático com os “Nova Iorquinos” preocupados que lançaram a petição – é ilógico.

Lembrou-me de um artigo de 2015 no Observer: The Real Reason We Need to Stop Trying to Protect Everyone’s Feelings, que pedia trigger warnings no The Great Gatsby e que tem um comentário curioso sobre o Fahrenheit 451.

Só uma nota final: eu cresci numa época em que era a direita evangélica ultra-religiosa que queria banir a sexualização da mulher, com as feministas e movimentos LGBT a promoverem “slut walks”, “love parades” e obras objectificadoras das mulheres.
Eu ainda não tenho 40. Será que ainda vou assistir a nova inversão, com os movimentos religiosos muçulmanos no ocidente a liderarem os esforços de censura, e os movimentos LGBT, gays e feministas a promoverem “slut walks”, “love parades” e a “livre expressão” do corpo? Se sim, façam-me só um favor: sem a música e a indumentária dos anos 80 😉

New Yorkers call for removal of Met painting that ‘sexualizes’ girl.

New Yorkers launched a petition demanding that the Metropolitan Museum of Art remove a 1938 painting of a young woman with her underwear exposed due to the “current climate around sexual assault” — but the Met refused Sunday.

The piece, “Thérèse Dreaming” by the French artist Balthus, “sexualizes” the girl by depicting her lounging in a skirt with her knee up on a chair, according to the petition, which was posted on the website Care 2.

(tenho que colocar o link abaixo pois o WordPress coloca as imagens atrás da citação)

36 pensamentos sobre “Quando é que o Fascismo moderno vai começar a queimar livros e obras de arte?

  1. Ontem deu um interessante documentário no canal Arte sobre os filmes feitos durante o III Reich, e cujo visionamento é banido, e estes incluem um (“Ich klage an”) que promovia a eutanásia (no caso, da mulher de um médico, que sofria de esclerose múltipla) e eu só pensei a profunda ironia da situação, pois se o filme fosse hoje feito por um Almodovar, um Ken Loach ou um Miguel Gomes seria amplamente elogiado (pensando bem, já foi feito por um Amenabar e ganhou um Óscar, um Globo de Ouro e um Goya).

  2. O que mais me irrita é a hipocrisia.
    – a internet está cheia de pornografia… as paradas gay estão cheias de pessoas nuas in-loco… mas um quadro, num museu (com ou sem nudismo) é que é o problema
    – não se pode desenhar Mohammed, mas uma fotografia de um crucifixo imerso em urina ganha prémios “Awards In The Visual Arts”

    Enfim…

  3. A América tem liberdade de expressão e as pessoas podem associar-se em prol de uma causa. Se o quadro for retirado — uma hipótese muito remota, pois a arte existe para incomodar e quem trabalha na área sabe disso –, é quase certo que isto acaba em tribunal e o quadro é reposto. O que é que tu achas que é mau neste processo?

  4. O que eu acho que é mau neste processo é o princípio. Neste e em outros casos que têm vindo a público nos últimos meses, está-se a criar uma cultura de trigger warnings e de acomodação de emoções que em nada respeita a liberdade de expressão – um dos pilares basilares da América, até recentemente.

  5. Caro Ricardo,

    1. parece claro hoje que Balthus era um pedófilo:

    ” Today, there is no question that Balthus was a pedophile. A precursor both of Nabokov’s Humbert Humbert (with whom he was constantly compared after the publication of Lolita in 1955) and the real-life Polanski, Balthus physically transgressed a battery of ethical and legal codes.”

    https://www.villagevoice.com/2013/10/16/ol-dirty-master-the-discomforts-of-balthus/

    2. As suas pinturas de raparigas novas em poses sensuais acompanhadas por gatos e leite são uma mensagem completamente explícita…

    3. As pinturas são tb muito perturbadoras:


    4. No passado já teve exposições canceladas pelas mesmas razões (incluindo na despreconceituosa Alemanha).

    5. Justificar a remoção com o clima atual pode não ser a melhor justificação dado que as obras deste pintor já foram removidas quando o clima era outro. Há algo nestas pinturas que repugna às pessoas que as tentam remover…

    Mas talvez a melhor justificação para remover pinturas destas seja dar um sinal aos pintores de que é uma estupidez desperdiçar a sua habilidade (e Balthus era habilidoso) a pintar porcarias…

    6. O mesmo se diga da Paula Rego a pintar abortos. No caso, os abortos que praticou mergulharam-na em depressões escuras que acabam expressas na sua pintura negra, agreste e fria, fazendo com que desperiçasse o seu talento em telas repugnantes, atingindo o abismo do horrível na pintura dos próprios abortos que fez. Paula Rego com os abortos. Balthus com a pedofilia. É tudo a mesma vida e habilidade perdida (e destruindo a vida de outros…)

  6. Carlos Guerreiro

    O problema mais grave é do gato/gata/gat@ que está nu/nua/n@, e tendo em conta a idade do quadro o leite deveria ser de vaca e não pasteurizado.

  7. Já agora retirem a Mona Lisa. O sorriso dela é muito ambíguo. Ou pintem-lhe um véu por cima.
    Mas donde é que surgiu esta onda de púdicos hipócritas? Voltámos à Idade Média? Há apenas uns anos o que se está a passar seria considerado um atentado à sexualidade, à arte, à liberdade, à afirmação – pelos mesmos que hoje se insurgem?

  8. Oscar Maximo

    Ando todo baralhado. Mas afinal os bota-de-elástico que dizem que a mulher em trajes menores e poses pouco apropriadas encoraja a violação, têm razão ou não ?

  9. Parafraseando , “Era uma vez a América”…
    Já vinha do início dos 70, oficializou-se em Novembro de 2008, e está em decomposição acelerada nos nossos dias – e perante o olhar do respeitável público (i.e. o mundo inteiro).
    O Czar, e sobretudo, o Imperador , agradecem – e agem em conformidade…

  10. Carlos Santos,
    Acho esse Balthus muito fraco como artista e, se é verdade o que diz, como pessoa – eu não o conheço.

    Só não quero é cá censuras: é que um dia o censurado por estes malucos extremistas ainda posso ser eu!

  11. Os “fascistas” modernos são exactamente os mesmos “fascistas” de antigamente mas com um argumentario mais modernaço como o da objectificação da mulher ou neste caso a pedofilia.

  12. Carlos Santos, “Mas talvez a melhor justificação para remover pinturas destas seja dar um sinal aos pintores de que é uma estupidez desperdiçar a sua habilidade (e Balthus era habilidoso) a pintar porcarias”

    Eu gosto da Paula Rego exactamente porque me perturba. Se ela se limitasse a pintar donzelas da corte a brincarem em jardins á moda do Fragonard teríamos perdido algo.
    Agora vamos pedir aos autores que se auto-limitem. Mas porque carga de agua? Desde que não cometam nenhum crime no processo de criação não vejo razão nenhuma para isso.
    E afinal quem decide o que são porcarias? Hoje em dia a “porcaria” da moda é a pedofilia. Há cem anos uma menina pueril em poses sugestivas não levantaria grande questão. Já um quadro de uma patareca peluda seria o carmo e a trindade. Há um par de décadas os temas das comédias para adolescentes eram sobre senhoras adultas que iniciavam os adolescentezinhos. No nosso tempo essas simpáticas senhoras são presas e aparecem no “Correio da Manhã”.
    E amanhã qual será a “porcaria” de serviço? Provavelmente algo que neste momento nem suspeitamos.

  13. sim são os fascistas e tal, só o fascismo é que faz tal coisa, o marxismo não, o marxismo é um santo, coisas más só vêm do fascismo direitolas

    comece a chamar os bois pelos nomes se não não se vai a lado nenhum, está tão embrenhado na narrativa de esquerda que tal coisa negativa tem que ser fascismo.

    é marxismo meu caro, marxismo.

  14. Caro Óscar Máximo, é uma questão deveras interessante a que coloca. Nos idos anos 70 recordo um debate académico sobre os consumidores de pornografia (acho que o subtexto era se devia ser legalizada ou proibida, sem aprofundar, no debate, a indústria pornográfica em si mesma).
    De um lado apresentaram-se estudos que pareciam apontar que os ditos consumidores eram mais propensos a cometer crimes sexuais, graves e menos graves. Por outro lado, outros estudos pareciam apontar o contrário, os consumidores de pornografia satisfariam a líbido dessa forma e seriam menos propensos a cometer crimes sexuais de qualquer gravidade.
    Se recordo bem, não houve por assim dizer um vencedor claro, mas a balança inclinou mais para a segunda hipótese.

  15. a resposta é que não lutaria meu caro, porque não queria ser “estatista”, e depois passava a ter 2 estados que seguiam “estatismos de esquerda”.

  16. Marialva, os EUA pré-II Guerra Mundial venceram a Alemanha pré-II Guerra Mundial.
    Ou seja, um estado com 20% de peso na Economia venceu os Nazis.
    E os EUA, sobretudo antes da II Guerra Mundial, não eram bem um exemplo de um estado gigantesco…

  17. O seu argumento tem muitas pontas por onde se pegue, mas vou pegar por apenas uma:
    1. Os EUA de Roosevelt eram um estado liberal mínimo? (devo-lhe lembrar que foi o mesmo que criou toda a sopa de letras de agências, new deal, e além disso todas as grandes fortunas eram taxadas a 90% (https://www.financialsense.com/sites/default/files/users/u717/images/2013/Tax-Rates-1913-Present-010213.jpg), além disso tenho aqui algo muito especial só para si: https://en.wikipedia.org/wiki/Executive_Order_6102.

  18. se me tivesse dado o exemplo da sereníssima republica de veneza ou dos países baixos em determinado século talvez tivesse mais sorte, mas mesmo esses…

  19. Ricardo,

    1. censura é do Estado, o que não está em causa aqui.

    2. Diferenças de opinião, discordar de si em caixas de comentários, lançamento de boicotes a empresas (ou ao Insurgente) ou pedidos de cancelamento de uma exposição, não são censura. São o funcionamento normal de uma sociedade livre.

    3. Se este evento se tivesse passado cá em Portugal (uma galeria de arte privada faz uma exposição e um grupo de pessoas faz um abaixo assinado pedindo o encerramento da exposição) numa altura em que o Ricardo fosse Primeiro Ministro com maioria absoluta no Parlamento, o que faria? Proibia as pessoas de fazer abaixos-assinado? Proibia as galerias de arte de aceitar pedidos de cancelamento? Alegava que se a exposição fosse fechada abria-se o precedente que impediria o Ricardo de falar? Ou seria a proibição do cancelamento que impediria as pessoas de se manifestarem e as galerias privadas de decidir?

    4. Desculpe o exemplo extremo, mas imagine que um artista pintava a sua mãe de forma nojenta. Por coerência, e exportando para esta matéria uma teoria económica que não foi pensada para resolver problemas destes, o Ricardo diria “acho o quadro horrível, mas concordo com a sua exibição porque se a proibirem um dia vão-me proibir a mim de falar”. Parece muito forçado, não acha?

    5. A minha visão é diferente: as pessoas têm direitos/deveres. Como não se concebe nenhum dever de divulgar imagens nojentas da sua mãe, não pode haver um tal direito. Como existe um dever de participar na organização política de um país, há um direito a pronunciar-se sobre a organização política de um país. Portanto é possível impedir a exposição do quadro nojento sem que isso implique censura para o que o Ricardo diz. E a sociedade tem formas de impedir a exibição de um quadro sem precisar da intromissão do Estado: faz boicotes, faz abaixos-assinado, etc.

    6. Há músicas que não passam na rádio por causa das letras. Isso dá um sinal aos músicos que se não querem desperdiçar uma boa música, é melhor não lhe meter uma letra ofensiva. Isso passa-se há décadas sem que o Ricardo esteja proibido de falar…

    7. Os libertários têm uma ferramenta útil para conversas de café, onde se trocam argumentos superficiais e rápidos, mas completamente inútil para discussões profundas sobre problemas sérios.

  20. Marialva,

    na minha opinião o Estado pode ter o tamanho que bem entender desde que não cobre mais de 10% do PIB em impostos. Passar dos 10% é violar o dízimo, ie, a herança judaico-cristã que transformou a Europa na mais bem sucedida de todas as culturas.

    Olho com enorme interesse para a Hungria onde o PM teve a coragem de colocar na Constituição um limite para a tributação: 16%. Não é o dízimo, mas foi um enorme passo na direção certa.

    10% de impostos (20 mil milhões) chega e sobra para o Estado assegurar as funções de representação (0.9%), a defesa (1%), a segurança (1.8%), a justiça e tudo o que não é resolúvel pela sociedade civil. No mais, “cai fora”.

    E 10% de impostos acabava com a maior ameaça à democracia que é a utilização dos meios do Estado para comprar votos.

  21. irrelevante meu caro carlos santos, numa situação em que o estado stricto sensu se sentisse ameaçado toda essa lenga lenga toda rapidamente se alteraria. fazendo um bocado de advogado do diabo – nenhum estado caiu por ser repressivo mas sim por ser fraco.

  22. E quanto aos pontos anteriores, claramente não sabe ou não percebe em como os EUA passaram rapidamente para uma economia de guerra centralizada.

  23. mas em todo o caso continuo a lançar o mesmo desafio meu caro, como é que o seu estado individualista liberal mínimo se vai proteger de um vizinho beligerante, colectivista e estadista? vai cortar o comércio é? lol.

  24. é que assim a brincar.. primeiro teria que passar para um serviço militar obrigatório… depois para um controlo da indústria de defesa e todos os seus dependentes… depois teria que impedir aquela malta capitalista de fugir do país com a massa e tal…..- etc,, termine quando quiser…

  25. resumindo caro RCM, toda essa conversa do individuo liberal e tal é muito bonita – mas no fundo toda a nossa história está marcada por meia dúzia de gajos que pegaram num pau para bater nos outros que eram menos – o ser humano é um ser social, tribal, e colectivista, quanto mais rápido perceber isto melhor.

  26. Marialva,

    “nenhum estado caiu por ser repressivo mas sim por ser fraco”

    Isto é falso. As civilizações caem quando as pessoas deixam de ter convicções pelas quais morrer. Esse é que é o verdadeiro problema da Europa e dos EUA. Quem é que vai morrer pelos grandes valores do presente: a ditadura LGBT2SACIPP+, mulheres masculinizadas em permanente guerra com os homens e a fazer experiências com filhos (PMA, barriga de aluguer, aborto, “alimentação saudável” cheia de soja a encher rapazes de estrogéneos, bonecas e vestidos rosa para rapazes, etc.), ser-se considerado violador só por ser homem, ser racista só por ser branco, a Liga dos Campeões, etc? Ninguém morre por isto. Na maçonaria havia décadas atrás um lema: “Deus já se foi, a nação está a ir e a família vai a seguir”. Porquê estes três elementos? Porque as pessoas estão disponíveis para morrer por Deus, pela pátria e pela família. E por mais nada.

    E os estados repressivos nunca fizeram frente aos Estados onde havia convicções pelas quais morrer. Foi repressiva a Alemanha nazi e foi esmagada. Foi repressiva a Itália fascista e nem os gregos conseguiu derrotar. Foi repressiva a Rússia e colapsou por dentro. Nenhum país faz frente à não-repressiva América. Os repressivos muçulmanos (Israel está rodeado de ditaduras) não têm a mínima hipótese contra 6 milhões de pessoas, num regime não repressivo, mas com uma coisa pela qual morrer.

    Termino como comecei: o verdadeiro problema da Europa e dos EUA é que cada vez as pessoas têm menos convicções pelas quais morrer.

    E o seu amigo Curtis Yarvin é um analfabeto. Anda a perder tempo.

  27. Caro Carlos Santos, concordo em grande parte com o seu primeiro ponto portanto não tenho grande coisa a escrever sobre o mesmo, além de que é irrelevante ao que escrevi.

    Quanto ao segundo, a Alemanha nazi caiu porque além de ser liderada por um incompetente e de tomar terríveis decisões foi completamente ultrapassada em termos de produção e números e derrotada em guerra – não foi porque era repressiva. A URSS lá se foi… depois de 69 anos… pode-se dizer que durou bem mais que vários regimes chamados “liberais” ao longo da história. A história não começou no séc. 20 e volto a fazer de advogado do diabo, os estados não caem necessariamente por repressão interna, o que não falta por aí são estados altamente repressivos que duram e duram… Certamente não são estados onde gostaria de viver mas em último caso quando caem não é porque são repressivos mas sim porque se tornaram fracos.

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