O regresso ao tempo de Sá Carneiro
Lemos as biografias de Sá Carneiro, de Maria João Avillez e de Miguel Pinheiro, e ficamos com uma ideia de como foi, mas não sabemos nada. É preciso viver para perceber. É preciso viver para saber o que é a solidão política de quem trilha um caminho que considera o correto.
Há quem compare o fim da assistência financeira de 2014 com a de 1985. E, com base nessa comparação, conclua que Costa governará dez anos como Cavaco, pois os dois beneficiaram do esforço feitos por outros. Sucede que a realidade não é comparável porque, além de a dívida pública em 1985 estar nos 52% do PIB, e em 2017 nos 130%, a UE também não é igual à dos anos 80. A vida política de Costa não vai ser fácil.
Assim, e à medida que se forem apercebendo disso, muitos irão pressionar o PSD e o CDS para ajudarem o PS e contraporem a influência do PCP e do BE no governo – a ideia da direita como muleta do PS, tal como já foi desejado nos anos 70, quando Sá Carneiro, sozinho, quis um PSD autónomo que não abdicasse da sua visão para o país.
O cenário para o PSD neste outono de 2017 é semelhante. Ou o PSD ignora os problemas que se avolumam em troca de lugares, ou convence o eleitorado com um projeto alternativo. Um PSD só para ficar em segundo e, condescendentemente ser aceite em Belém e nas redações dos jornais, porque pactua com os erros que mais tarde teremos de pagar, não serve para absolutamente nada. Um partido tem de ganhar eleições, não para ocupar cargos, mas para servir o país. Esta forma de fazer política pode estar de regresso. Ainda bem, porque é a que vale a pena.
O PSD de Sá Carneiro seria hoje PPD e assumidamente de Direita. Haja algum candidato a líder que faça jus á ousadia e coragem para mudar este país, tal como Sá Carneiro tentou.
Espero e formulo sinceros votos, em nome dos mais elementares direitos do meu querido luso Zépovinho, que nesse anunciado (agora que o vidente de Massamá parece ir dar corda aos sapatos, esse seu estatuto e correlacionado lugar ficará vago e o autor deste artigo parece já estar a candidatar-se) e pelo AAA tão desejado regresso, não venha acompanhado de figurões da estirpe de um cavaco, de um isaltino, de um duarte lima, de um relvas, de um coelho(zeco), de um gaspar(zeco), de uma “de albuquerque”, de um miguel macedo e tantos outros, porque para pior já basta assim!…
Mas, atenção aos pafiosos saudosistas do antigamente: é a prática (realidade) que determina a consciência e, consequentemente um homem é fruto da sociedade, ou, dito de outro modo, é a sociedade que faz o homem e não o contrário, e 40 anos com os “do arco”, somados aos 48 do fascismo, mais os 4 dos pafistas pafiosos somam quase um século, e 100 anos foi muito tempo em que as corjas que se foram governando com as suas governanças, à pala do Zépovinho que foi ficando cada vez mais na miséria, umas vezes sós outras vezes coligados os dois partidos dominantes, são por demais suficientes que nenhuma falta fazem tais hipotéticos e desejados pelo autor regressos.
Mais ainda, recordando-me eu agora do que deixou escrito o meu querido e saudoso Mestre Guerra Junqueiro, a escravidão do luso Zépovinho em benefício desses arautos burgueses e elites protegidas de que é exemplo o Ricardo Salgado, já vem de há muitos mais anos atrás. Se não, vejamos:
{ Um Povo resignado e dois partidos sem Ideias:
Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta. [.]
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro. Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar.
Guerra Junqueiro, in ‘Pátria (1896) }
Quem havia de dizer que a situação deste já iniciado séc. XXI em tudo se assemelha à que o Mestre GJ viveu!?!?!??!?!…. “dois partidos sem ideias, a justiça ao serviço da política; uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, …”
Afinal tudo isto é a peçonha do capitalismo, e, como diz o Povo, só quando morrer o bicho é que acabará a peçonha!…