E se Trump for o presidente de todos os trabalhadores? Como é que fica a esquerda? O meu artigo no Jornal Económico.
Trump: um presidente dos trabalhadores
Quem diria? Donald Trump, o homem de negócios, o especulador que faliu empresas tirando daí proveitos próprios; o arrogante e execrável Trump vai ser um presidente das massas trabalhadoras. Quem o refere é Rich Lowry, editor da National Review, num artigo publicado este mês na Politico Magazine, com o sugestivo título de “The Party of Workers”.
Atenção que falar de trabalhadores não é falar de pobres. As políticas de Trump não visam reduzir a pobreza, mas subir os salários. Aproveitando um mal-estar cujas razões poucos conseguem expor, Trump simplificou o problema explicando que os salários não têm aumentado devido à imigração. O seu raciocínio é ajudado porque a população de imigrantes nos EUA aumentou, desde o início deste século até 2014, de 31 para 42 milhões.
A solução de Trump para este problema é reduzir a entrada de estrangeiros. Com menos pessoas a trabalhar os salários sobem. E se, com a subida dos ordenados, as empresas pensarem em se instalar nos países onde a mão-de-obra seja mais barata, Trump pune-as com impostos e tarifas aduaneiras sobre os seus produtos. É assim que Trump se transforma, de um homem do capital num defensor dos trabalhadores. Juntemos a esta política as obras públicas de renovação das infra-estruturas dos EUA, que a sua administração conta para criar empregos, e está visto como vão ser, caso Trump cumpra o que diz, os próximos anos na América.
Muitos comentadores norte-americanos estão excitadíssimos com a perspectiva de um novo Roosevelt. Mas há problemas. Um país não se desenvolve, não enriquece, só com menos impostos e mais despesa pública. É preciso progresso tecnológico e inovação. A redução dos impostos e o aumento dos gastos públicos origina dívida que obriga a racionar o futuro. Aquele momento em que Trump já não será presidente e, por isso, por ora não interessa nada.
O proteccionismo de Trump até pode criar um aumento temporário dos salários e do emprego. Mas um país fechado não inova e, mais cedo ou mais tarde, é ultrapassado por outros que produzem melhor e mais barato. A que se junta a inflação, um risco natural para qualquer país que feche as portas à globalização. A inflação: essa forma de austeridade que tantos desejam e que afecta especialmente os que ganham menos e que têm mais dificuldade para fazer frente ao aumento dos preços. Para a evitar, a Reserva Federal já anunciou o aumento das taxas de juros e promete mais em 2017.
Taxas de juros mais altas podem ser um problema para países como Portugal. Mas como é habitual, será algo que o Governo vai empurrar com a barriga. Entretanto, vai ser muito difícil à esquerda dizer mal de Trump depois de tantas críticas lançadas à austeridade de Angela Merkel. Até porque, apesar de ainda nem sequer ter tomado posse, os anúncios de Trump já estão a estimular a economia e as bolsas fervilham na Europa. Como o socialismo, tão avesso à especulação, tanto queria.
Duvido muito que Trump vá por esse caminho. Ele próprio tem empresas deslocalizadas.
A concorrência através dos baixos salários que a nossa direita defende também não cria exatamente países prósperos e inovadores. Um mundo de Vietenames e Bangladeshes é o sonho molhado da nossa direita, mas é um pesadelo para alguém com juízo.
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“Trump for o presidente de todos os trabalhadores? Como é que fica a esquerda?”
A palavra-chave aí (e que pode salvar a esquerda, para ter um motivo para se opor a Trump) é o “todos” – o que o AAAmaral está a descrever é algo mais restrito: um presidente dos trabalhadores nascidos (ou já com autorização de trabalho e residência) nos EUA.
Miguel Madeira: os outros (sem autorização de trabalho e residência) votam?
“um presidente dos trabalhadores nascidos (ou já com autorização de trabalho e residência [= legais]) nos EUA.”
Exacto.
Aqueles que podem votar. Os cidadãos de um país ou os seus imigrantes legalizados.
Aqueles que é obrigação constitucional de um presidente eleito representar e defender.
Trump será visto sempre como a esquerda quiser, se lhe agradar ele é de esquerda, se não lhe agradar ele é nazi.
O senhor pode parecer muito mau (no artigo) mas eu preferia um Trump que 100 xcostas….
> (no artigo)
Já poucos ingénuos se dão ao trabalho de salivar quando a campainha da imprensa toca.
Este ano cometeram um dos ‘sepukus’ mais espectaculares jamais vistos. As tripas da imprensa oficial fedem e brilham ao luar*.
[* Roubado aqui: https://almostchosenpeople.wordpress.com/2010/03/11/unforgettable-john-randolph-of-roanoke/ ]
Já agora, o camarada Randolph era nitidamente um desbocado, a abrir o jogo desta maneira: “I am an aristocrat. I love liberty; I hate equality.”
Pah, chiu. Não espantes o gado, caraças. Deixa-os poisar. Pagos em liberdade, sai muito mais barato, e ainda se lhes ensina que têm de morrer por ela.
“Win-win”, como dizem nos MBAs.