História económica de um ponto de vista íntimo

Quando eu nasci, em 1959, Portugal (e Portugal era naquela altura muito mais do que o retângulo) tinha entrado há pouco, e assim prosseguiria até 1973, num período de crescimento sem paralelo em toda a sua história registada. A minha infância e princípio de adolescência foram vividos num país tomado de aceleração vertiginosa, pelo menos por comparação com qualquer outro período conhecido. Décadas como as de 50 (que eu não vivi) e 60 (até 73) nunca mais houve, e não é razoável esperar que volte a haver no horizonte antecipável.

Para se ter uma ideia gráfica: entre 1960 e 1972 – foi o princípio da minha vida – o PIB português duplicou.

dana_michahelles

Lá em África, que é donde eu venho, retornado, a coisa era ainda mais acelerada. Mas fiquemo-nos com isto aqui: o PIB do retângulo duplicou em 12 anos. A média de crescimento anual nesse período foi de 5,9%. A média. Não houve um só ano de recessão.

1969 foi um ano cinzentíssimo nesta série: a economia cresceu apenas 2,4%. Uma marca extraordinariamente medíocre. Se expulsarmos esse ano, a nódoa, para esquecer, da série, a média é mais representativa da velocidade a que se andava: 6,4% ao ano.

Para o PIB voltar a duplicar, depois desses 12 anos sem paralelo – os do princípio da minha vida – seriam depois necessários 20 anos, até 1992. Houve ainda um sobressalto nos últimos anos destes 20, de 1986 até ao princípio dos anos 90. Tínhamos entrado na CEE, intensificado a abertura ao exterior e, sobretudo, enveredado por um intenso período de liberalização da economia, depois do ensaio de sovietização pós-revolucionário. Voltámos por uns poucos anos a crescer como nos anos 60. Mas depois acabou.

Não voltou a haver duplicação. De 1992 a 2015, e passaram-se já 23 anos, o PIB aumentou apenas 30%. Uma pessoa que em 2015 tivesse nascido em 2002, com 13 aninhos, os mesmos que eu tinha em 1972 depois daquela década de crescimento e mudança trepidantes – o PIB duplicara, crescera 100%! – viveu num país onde o PIB aumentou ao longo de toda a sua vida… 0,1%. Isso. 0,1%. Não é gralha.

É verdade: essa pessoa nasceu num meio incomparavelmente mais rico do que o meio em que eu nasci. Não tem comparação possível. Mas eu nasci num meio em que a melhoria constante, a abertura permanente de novas possibilidades, o enriquecimento ano após ano eram a regra. O jovem que nasceu em 2002 nasceu num meio em que a crise, a ameaça e o impasse são a normalidade. Acreditem: o socialismo não foi uma boa ideia. Valia a pena tentarmos outra coisa. Os nossos filhos não merecem este fiasco.

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21 pensamentos sobre “História económica de um ponto de vista íntimo

  1. Onde é que viu o socialismo exatamente?
    Quanto cresceu o PIB desde que entrámos no Euro?
    E desde que a troika cá veio?
    São esses os momentos de socialismo a que se refere?

  2. mariofig

    Bom post, Jorge Costa. Nasci 5 anos depois de si. Pena que a população Portuguesa ainda viva sob a sombra socialista do 25 de Abril e fará uma análise política do seu post (acusando-o quiçá de Salazarista). Ignorarão por completo que você faz um relato económico de dois grandes momentos de viragem na história de Portugal, em contraste com os resultados obtidos pelos regimes socialistas que nos têm trazido apenas miséria via estagnação.

    Ainda assim considero que a (problemática mas eficaz) liderança de Cavaco Silva foi uma “aberração” na história do PSD e que muito dificilmente se repetirá. O partido encontra-se hoje demasiado alinhado à esquerda, funcionando apenas como satélite do PS (esse grande governador dos destinos de Portugal nos 2/3 de vida do país desde o 25 de Abril). O PSD vive hoje dependente dos resultados eleitorais do PS e completamente incapaz de se posicionar a si mesmo como alternativa ideológica. Nem se anteveem futuros lideres com capacidade ou vontade de reformar o partido.

  3. A minha (isto é, da minha família) história economica de um ponto de vista intimo: os meus pais (nascidos em 1943 e 1947, vivendo em Moçambique entre 1968 e 1975, e no Algarve antes e depois disso) costumam dizer que isto era um “atraso de vida” e que o grande desenvolvimento que viram foi a partir dos anos 70.

    [Ocorre-me agora que talvez fosse interessante alguém fazer um estudo do crescimento económico *por região* ao longo dessas décadas; talvez isso explicasse muito coisa, talvez até da geografia política do país]

  4. lucklucky

    Retornado? porque segue a narrativa do jornalismo Marxista?

    A palavra é Refugiado.

    ——–

    “Onde é que viu o socialismo exatamente?”

    Pode começar por o Estado controlar mais de 50% da economia.
    Pode começar pela cada vez mais leis e controlo.

  5. Pedro Grangeio

    O seu comentário só peca por um aspecto: As pessoas, em Portugal, não estão interessadas em que o país cresça. Se estivessem, nunca votariam socialista, porque nunca ninguém viu, em parte alguma, um país crescer e desenvolver-se, depois dos socialistas terem ido para o governo. As pessoas votam socialista, porque querem sacar do Estado o máximo possível, de preferência sem terem que trabalhar.

  6. André Miguel

    Os filhos não merecem, mas pagam o fiasco, por isso fazem o mais inteligente: emigram. Mas um dia a coisa estoira e não terão quem vos pague as reformas principescas. Vão ter aquilo que merecem.

  7. Qual foi o contributo das remessas de imigrantes para essa “pujança” económica? E porquê que foram tantos, foi só por causa guerra?

  8. tina

    Nascer em Portugal hoje em dia significa ter o futuro comprometido e menos qualidade de vida pois os pais e avós roubaram-lhes os recursos que eles serão obrigados a pagar uma boa parte da sua vida ativa.

  9. André Miguel

    Guna, e porque é que hoje as remessas não contribuem para a “pujança económica”?! E como é que há 50 anos com uma emigração em massa crescíamos a olhos vistos e hoje com a emigração tambem em alta estagnamos?!

  10. André, porque o regime é corrupto e incompetente… Mas a incompetência actual não torna o passado “cor-de-rosa”, os anos 60-70 devem ser únicos, pois o país crescia 6% ao ano e mesmo assim a emigração foi o que foi. Como já foi referido, o país era um atraso de vida (como hoje, a capital do império lá se safava melhor), onde fome e miséria não faltavam.

  11. André Miguel

    Guna, hoje continuamos a ser um atraso de vida, com a agravante que já nem a capital destoa muito do resto do país. Temos tudo para crescer, mas o socialismo inscrito na CRP nunca o irá permitir. Tudo se resume a isto.

  12. A gravura em cima, editada em 1970, da autoria de Dana Michahelles, é da Avenida D.Luis (actual Samora Machel) em Lourenço Marques (actual Maputo) no final dos anos 60.
    Eu também venho dali !!… 🙂

  13. As décadas douradas de crescimento do Estado Novo(60 a 73) tiverem como causa cinco factores determinantes: 1ª. Economia de Guerra(com entrada de capitais das províncias ultramarinas) ; 2ª. Adesão à na EFTA; 3º Investimento estrangeiro (Belga, Francês, Alemão,etc);4. Remessas de emigrantes; 5ª. poupança na ordem dos 20%(hoje anda pelos 4%).

  14. Francisco Lx

    Nasceu em 59, hum!… não fez a guerra colonial lá nesse local de onde veio, pois não? Mas os “enviados” da metrópole mais velhos foram lá fazê-la e mesmo assim os “retornados” acharam pouco.

  15. Francisco Lx,

    O que é que pretende insinuar ?!.. Naturalmente que o Jorge Costa não fez serviço militar porque ainda não tinha idade. Mas os portugueses nascidos e crescidos nas colónias e com idade fizeram todos a guerra. Muitos deixaram lá as vidas ou sofreram ferimentos mais ou menos graves. Não têm lições a receber de ninguém.

    As tropas “metropolitanas” foram “enviadas” para defender territórios e populações, principalmente “indigenas” mas incluindo muitos “metropolitanos” ou descendentes de “metropolitanos”, na altura sob administração do Estado português, contra uma guerra de guerrilha de tipo terrorista organizada e patrocinada por paises que eram sobretudo do campo comunista.
    Claro que ninguém parte para a guerra de ânimo leve. Os sacrificios foram muitos e um certo numero sentiu que aquela aventura não era sua. Uma minoria não esteve à altura, sob diversos pontos de vista. Mas a esmagadora maioria dos militares portugueses, alguns mesmo discordando aqui e acolá, esteve em Africa com espirito patriótico, de missão, e com orgulho. Muitos deles acabaram, uma vez desmobilizados, por ficar ou por regressar áqueles territórios. A esmagadora maioria dos ex-combatentes em Africa não lamenta nem se envergonha, antes pelo contrario.

    A generalidade das populações locais, “indigenas” e “europeias”, sentiu-se protegida e e com gratidão por aqueles militares. Apenas uma parte muito minoritária e localizada, perante a ameaça directa e cada vez maior dos “terroristas”, em desespero de causa, se indignou e protestou contra a tropa acusando-a de não fazer o que devia. A verdade é que ainda hoje, a maioria dos portugueses de Africa respeita e venera as forças armadas do seu pais.

    É verdade que um certo número de portugueses de Africa, sobretudo aqueles que tiveram de deixar os territórios em condições urgentes e dramáticas, não perdoa aos militares portugueses o que consideram ter sido uma “retirada vergonhosa” e um “abandono sem garantias nem transição” dos territórios e das suas populações. Mas não ignoram que, no fim de contas, a responsabilidade principal foi do novo poder politico (ou pelo menos de uma parte dele) saido do golpe de 25 de Abril de 1974.

  16. lucklucky

    “As décadas douradas de crescimento do Estado Novo(60 a 73) tiverem como causa cinco factores determinantes: 1ª. Economia de Guerra(com entrada de capitais das províncias ultramarinas) ; 2ª. Adesão à na EFTA; 3º Investimento estrangeiro (Belga, Francês, Alemão,etc);4. Remessas de emigrantes; 5ª. poupança na ordem dos 20%(hoje anda pelos 4%).”

    1: Não concordo. Economia de Guerra não dá recursos nem as província além mar contribuíram com recursos, pelo contrário.

    As razões para o crescimento económico foram o capital acumulado – incluí tudo começando por conhecimento – vs o que faltava fazer e o nível tecnológico do que faltava fazer adequado a esse capital de conhecimento.

    Se as pessoas precisam de casas basta poupar para construir casas, o conhecimento para as construir é relativamente fácil de adquirir mesmo por pessoas com pouca instrução formal. Se as pessoas precisam de estradas, se precisam de trabalhar numa industria, as distâncias ficam mais curtas devido à maior motorização.

    Além disso a Ditadura ao contrário deste Regime Socialista não puniu – seja por impostos seja por taxas e taxinhas, seja por regulação tanto as pessoas por criarem, por fazerem.
    E como existia uma Ditadura as pessoas não gastavam tanta energia a investirem na Política.

    Países que punem as pessoas por fazerem, criarem. A prazo quando as pessoas se adaptarem à nova cultura da punição do fazer o país entra em depressão.

  17. Pingback: O Regime de Abril – Kafka In Amadora

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