Há 4 anos herdei uma dívida de €250.000 à CGD. Há 4 anos que a CGD não recebe um tostão dessa dívida. Há 4 anos que tento resolver este assunto com a CGD. Há 4 anos que nada acontece.
Ou seja, não precisamos de entrar na estratosfera dos empréstimos de centenas de milhões sancionados politicamente para perceber como é que a CGD chegou aqui e as vantagens (para alguns) de se ser dono de um banco público: a conta pode ser dividida por 10 milhões e ninguém precisa de resolver nada porque ninguém pode ser, nem precisa de ser, responsabilizado por nada.
Como é que esta minha dívida aparece?
Com um empréstimo a uma empresa sem actividade mas com sócios em comum com outras empresas que, essas sim, tinham actividade (mas não dinheiro). Com um empréstimo feito a contar que o património pessoal dos sócios poderia responder por um incumprimento, sem que a CGD se preocupasse em perceber se seria realmente assim (não era). Com um empréstimo contra garantias reais que, como era prática comum, foram valorizadas no que era preciso para ser possível financiar os montantes pedidos em vez de se ajustar o montante do financiamento ao valor das garantias (não funciona).
Como é que esta minha dívida ainda existe?
Boa pergunta. É certo que havendo uma fonte sempre disponível de capital, aparentemente não há grandes limites para o número de buracos deste tipo que é possível cavar dentro de um mesmo banco. Mas deveria haver limites para a falta de capacidade administrativa em lidar com milhares de processos idênticos quando há centenas de funcionários e prestadores de serviços em departamentos de recuperação de crédito e de contencioso. Deveria haver limites para a inércia dos serviços de um banco que não responde a ninguém, especialmente quando os clientes se disponibilizam repetidamente para tentar resolver a situação. Deveria até haver limites para a criatividade contabilística que permite adiar, transferir, evitar tudo e mais alguma coisa, quando ao fim de 4 anos todas as imparidades já foram (ou deviam ter sido) reconhecidas e provisionadas. Pelos vistos não há. Prova disso é que, ao fim de 4 anos, a CGD nem as garantias reais foi capaz de executar. E acreditem que há algo de muito errado quando a melhor esperança que alguém tem de resolver um problema com um banco é por via de uma execução.
Podemos argumentar que estes empréstimos que não cumprem os mínimos são o custo de se fazer negócios num país do terceiro mundo. Se os bancos não se adaptassem à trampa do micro, pequeno e médio tecido empresarial que temos não conseguiriam emprestar dinheiro a ninguém. Se os bancos públicos não se adaptassem à política que temos não seriam bancos públicos.
Também podia estar aqui contente por estarem 10 milhões de portugueses a pagar o que eu não consigo pagar. Mas não estou. Não estou porque vou acabar por pagar duplamente: como contribuinte, por mais um aumento de capital, como devedor da CGD, por anos de absoluta indolência na gestão do meu processo que me sairão do bolso com juros, custas e honorários.
Outros empréstimos, grandes e pequenos, serão feitos à toa. Outros “serviços públicos bancários” serão prestados. Outros aumentos de capital virão. Pelo menos enquanto a CGD for pública. Neste cenário, eu já só peço que alguém da CGD me ligue ou que vendam o meu crédito a quem tenha de trabalhar para pagar contas. O que eu dispenso, como contribuinte e devedor da CGD, são os trostkistas providenciais que me garantem que desta vez é que é, desta vez é que a CGD vai transformar-se, também ela, numa vaca com asas.
A Banca pode perfeitamente manter no balanço um empréstimo que não é pago, para tal, basta renegociar os termos periodicamente, renovar o contrato “ad eternum”, periodos de carência abusivos, etc. Um dia alguém (auditores? BdP?) questiona e vai directo a Written-Off. “Um dia”, escreví eu e esse dia é quando eles quiserem ou quando alguém resolve executar o visado do empréstimo e ele se tornar insolvente.
A TVI deve ter um monte de notícias sobre a banca para dar 🙂 Se não as der, está meio-explicada a notícia do fim do ano. Só falta a bomba atómica – saber quem foi a fonte.
Há uma coisa que nunca entendi: socrates não tinha dinheiro mas queria grandes obras. As PPP prestaram-se a fazer essas obras mas também não tinham dinheiro. Foram à banca e foram autorizados empréstimos para as mesmas obras a pagar em 20/30 anos. E as obras lá foram feitas e nós e os nossos filhos pagar-mos até morrermos. Então pergunto, porque razão Socrates duplicou a divida sem sequer ter pago algo….. para onde foi o dinheirinho????????????
E quantos empréstimos foram concedidos devido ao aval do gerente a troco de dinheiro por baixo da mesa, sei de tantos casos e vou ter de pagar a corrupção.
JOAQUIM BRITO : “porque razão Socrates duplicou a divida sem sequer ter pago algo….. para onde foi o dinheirinho????????????”
Uma parte do dinheirinho foi precisamente para pagar obras, foi para a construção.
Mas uma outra parte ainda mais importante do acréscimo da divida foi para pagar despesa publica e o custo financeiro da própria divida.
E quase todo esse dinheiro acabou na economia, sobretudo no consumo, no interno de bens e serviços não transaccionáveis e no externo de bens tangiveis de consumo e investimento importados.
Gerou no imediato algum crescimento mas desequilibrou e desajustou a economia e, deste modo, determinou a prazo a insolvência e, portanto, a insustentabilidade do modelo.
A história do que se seguiu é conhecida …
Correcção : obviamente que o consumo de bens importados é também interno (e não “externo”, como escrevi erradamente).