Galambanomics (ou a ciência dos unicórnios)

JoaoGalamba_unicornioNa semana passada o deputado João Galamba (Partido Socialista) publicou o seguinte no seu blog do Expresso (meu destaque):

Para o novo Governo, e ao contrário do anterior, o aumento do rendimento das famílias é uma condição necessária para haver crescimento económico.

Como a procura interna desacelerou, como a taxa de poupança das famílias está em mínimos históricos, como não é expectável que haja novo aumento de rendimento (real) por via de quedas adicionais do preço do petróleo ou dos juros, a aposta num “frontloading” de rendimentos para as famílias é mesmo urgente, e é a única forma de assegurar um crescimento sustentável do consumo. Seja por via fiscal (sobretaxa), seja por via salarial (salário mínimo e fim dos cortes dos salários na função pública), seja por via de prestações sociais (descongelamento das pensões e reforço do RSI, CSI e Abono), a procura interna só crescerá de forma sustentável aumentando o rendimento das famílias.

Essa é uma velha política que tanto sucesso(!) fez durante o Governo de José Sócrates (que João Galamba, a partir de 2009, também apoiou como deputado). Para os seus proponentes, o endividamento do Estado é «necessário» para, em tempos de estagnação ou recessão económica, haver uma recuperação sustentável. Será que assim é? Melhor consultar os dados da Pordata para os primeiros onze anos do século XXI (2000 a 2010) que precederam a bancarrota do Estado português (em Abril de 2011):

  • Produto Interno Bruto (PIB), em termos nominais, cresceu 50,39% (per capita 45,34%).
  • A dívida pública cresceu 183,36% (per capita 174,69%).
  • No início deste século cada português (homem, mulher e criança) produzia, em média, €11.709 e, além das suas dívidas privadas, tinha dívida pública de €5.959 (cerca de 50% do que produzia).
  • No fim de 2010, poucos meses antes de José Sócrates obrigar o país a pedir apoio financeiro, cada português produzia €17.018 e tinha dívida pública de €16.369 (96% do seu “produto”).
  • Nota: no final de 2014 cada português produziu menos €16.676 mas aumentou a “sua” dívida pública para €21.761 (130% do produzido).

Resumindo, o brutal aumento da dívida pública na primeira década deste século aumentou, sim, o rendimento das famílias. Mas este cresceu a uma taxa exponencialmente inferior àquela. E a consequente bancarrota do Estado mostrou que esse crescimento não era sustentável. A produção caiu (recessão) mas o Estado permaneceu deficitário, continuando a endividar o futuro de cada português.

Agora o deputado João Galamba (e o partido que representa) quer aumentar o rendimento das famílias à custa de ainda mais dívida pública? Não, obrigado.

16 pensamentos sobre “Galambanomics (ou a ciência dos unicórnios)

  1. Preocupado

    Esperem lá, as taxas de poupança das famílias estão em mínimos históricos e há que fazer um front-loading de medidas de incentivo ao consumo? Mas este gajo não lê o que escreve? Só à chapada. Até me envergonho de ser alumni da mesma faculdade deste palhaço.

  2. Preocupado, felizmente nem todos os alumni são iguais 😉
    E levantas uma questão interessante: a medida pretende aumentar o consumo das famílias mas, dadas as baixas taxas de poupança, pode nem sequer atingir esse objectivo se a decisão da maioria dos portugueses sobre esse acréscimo de rendimento for para o aforro.

  3. Preocupado

    Qualquer medida de aumento de rendimento das famílias neste momento leva a um misto do seguinte: aumento marginal do consumo de bens normais, aumento não desprezível do consumo de bens superiores (o que significa, quase de certeza, um aumento das importações e diminuição do excedente externo), aumento da poupança por via indirecta através da redução de dívida privada (substituída por défice orçamental e consequente dívida pública) MAS não levará ao aumento do investimento reprodutivo (quanto muito a um aumento, ainda que marginal, da liquidez no mercado de capitais) porque não é com mais 30 ou 100 euros por mês que as pessoas vão montar o seu próprio negócio.

  4. maria

    Pois, pois … Estes esquerdistas num mês puseram o país de tanga.
    “Nível da dívida pública, nos 130,6% do PIB, deixa país numa situação de “grande vulnerabilidade”, avisa o Banco de Portugal.”

  5. maria, o país já está de tanga há muito. Foram é adiando com défices sucessivos até credores não confiarem mais na capacidade do Estado honrar, por si só, pagamento das facturas.

  6. José Soares

    Enquanto não se entender que a riqueza e o “segredo” está nas empresas, e não nas familias e pessoas colectivas, o país nunca irá evoluir.
    As empresas necessitam de ter condições para crescer, para ser sustentáveis e competitivas, pois são elas que criam empregos, melhores salários e aí sim mais dinheiro paras pessoas gastarem. Não serve de nada aumentar o salário mínimo de as empresas não têm condições para pagar. Mais vale 505 do que ser despedido.

  7. lucklucky

    Para se poder ter défice é preciso encontrar comprador para a dívida.

    “@maria em Dezembro 9, 2015 às 18:30 disse: blah blah

    Sem os juros da dívida do Sócrates já estariamos hoje a reduzir a dívida.

  8. Nuno

    Agora pelo menos já sabemos quais são os resultados desta política. Mais tarde não vão poder dizer que não sabiam.

  9. Carlos Conde

    Que atracção sádica leva pessoas normais a perder tempo com o que diz Galamba, comendador da ignorância.

  10. JP-A

    Estão sentados? 🙂

    «Os funcionários das empresas de transporte ferroviário, bem como os seus familiares e reformados do sector, devem voltar a viajar gratuitamente de comboio, propõe o PS. Também o Bloco e o PCP apresentaram propostas no mesmo sentido.»

  11. Fernand Personne

    O Galamba é economista?

    As pessoas ganham pouco; os bens, produtos e serviços são caros; as pessoas gastam o pouco dinheiro comprando as coisas que precisam e que são caras; logo, ficam com pouco ou nenhum dinheiro para poupar.
    Então, o Governo PS endivida-se para dar mais dinheiro às pessoas porque acha que, com mais dinheiro, as pessoas vão gastar mais. As pessoas pensam que, com mais dinheiro, mais vale poupar. As pessoas que preferirem gastar mais, gastam em coisas “made in not-PT” porque Portugal não produz quase nada, aumentado as importações. Mas aumentando as importações, a dívida do país também aumenta, certo?

    Nesta conversa fiada, não há uma única palavra para o empreendedorismo, a criação de empresas e empregos, aumento da produtividade, aumentar as exportações, etc, que acho que é o que gera riqueza para o país e pessoas, certo?

  12. João Galamba

    É fascinante ler um post sobre rendimentos e procura interna que ignora (desconhece?) o facto de a procura interna e rendimentos terem estado praticamente estagnados no período que “analisa”. Vou repetir um dado que todos os que escrevem no Insurgente parecem não conhecer: Portugal foi, juntamente com a Alemanha, o país onde a procura interna menos cresceu entre 2002 e o início da crise financeira. Mais: os únicos anos nos quais tivemos crescimento económico “saudável” (procura externa líquida positiva) foram os anos de Sócrates (que não criou o défice externo: herdou-o) pre-crise financeira.

  13. Caro João Galamba, portanto sucessivos défices nos anos pré-crise não conseguiram estimular a procura interna mas o maior aumento da dívida do reinado Sócrates, que levou Estado à bancarrota, conseguiu. E quer agora repetir a receita? Como diria a minha avó: por amor da Santa!!!

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