A fusão da direita e o drama do PS

O meu artigo no Diário Económico.

A fusão da direita e o drama do PS

O PS perdeu porque a direita se uniu e a extrema-esquerda ganhou votos. Com a junção da direita, o PS repete o dilema que viveu nas legislativas de 1979 e 1980, quando a APU teve resultados semelhantes à soma da CDU e do Bloco. O que não deixa de ser irónico porque o PS está a pagar o preço de se ter posto, desde os anos 80, à margem do debate político.

É certo que o PS foi castigado pelo que aconteceu em 2011 e por não ter percebido as razões e as consequências da crise actual. Mas isso não basta para compreender o que se passou. Isso explicaria que os socialistas perdessem votos para a direita, mas não para o CDU e o Bloco quando precisava deles para vencer e derrotar um governo que, nas palavras da esquerda, castigou os trabalhadores e os mais pobres.

Como é que depois do fim do comunismo, boa parte do eleitorado de esquerda não se revê no PS? A descredibilização da esquerda moderada não acontece apenas em Portugal, mas em Espanha, França e também no Reino Unido. Nick Cohen, um conhecido jornalista e comentador político britânico de esquerda, tem vindo a alertar há muito para esta ameaça que se tornou realidade. Ainda no mês passado, e depois da eleição de Jeremy Corbyn para líder dos trabalhistas, Cohen explicou na revista britânica Standpoint como é que um radical tomou conta daquele partido. O que Cohen nos diz é que o partido trabalhista desistiu do combate ideológico e se preocupa meramente com a distribuição de fundos estatais.

O socialismo aburguesou-se de tal maneira que quem queira ser de esquerda é forçado a ser extremista. Acrescente-se que o PS nunca quis defrontar o BE nem o PCP porque tem sido mais fácil esperar que o poder lhe caia no colo vindo do centro. Ora, a união da direita muda este cenário. É que, apesar da vitória, o resultado da direita é baixo em virtude da difícil legislatura que teve de enfrentar. Assim, uma direita unida, com votações à volta dos 40%, obriga a que o PS vá buscar os votos à esquerda; que faça o trabalho que tem pendurado desde 1980. No fundo, e depois da direita ter posto de lado o autoritarismo do Estado Novo, cabe ao PS fazer com que boa parte da esquerda se volte para a democracia e aceite as liberdades individuais e a economia de mercado que são a marca do normal funcionamento de uma democracia ocidental.

Se não o fizer continuará desesperado à caça do voto como fez na última semana de campanha. O PS deve perceber que, com a crise financeira e o endividamento dos Estados e das economias que os sustentavam, governar implica ser-se político como se era há 40 anos. E que o debate de que fugiu quando o projecto de Sá Caneiro e Amaro da Costa caiu em Camarate está em cima da mesa à espera de ser tratado no Largo do Rato. A democracia agradece que ponham mãos à obra pois a clarificação ideológica só torna a política portuguesa mais transparente e as escolhas de todos mais lúcidas.

3 pensamentos sobre “A fusão da direita e o drama do PS

  1. JP-A

    Falta fazer outra parte da discussão, que é esta: O que é o PS? Quem são as pessoas que estão no PS? Estão porquê? Quem são as pessoas que estiveram mas deixaram de estar? Porquê? Por quem? Quem são as pessoas que estão, mas nas bordas (ex: Vitorino) e no bitaite? Porquê? O PS é um partido amplamente plural, ou purificou castas, expeliu o resto e agora só tem carneirinhos arrebanhados à volta de cabecilhas, lixo e uma espécie rara de D.Quixote formada por meia dúzia de loucos que dizem o evidente à porta da sede do partido e deixam os outros quase todos a assobiar para o ar? Por que motivo o Henrique Neto é ignorado e odiado, inclusivamente por todos ou quase todos os agentes que fizeram a campanha, a pré-campanha e a festa da vitória do PS? Onde está o António Barreto e desde quando? O Daniel Bessa? Os bons ministros “independentes”? Esse PS onde está? Existe? Ou foi assassinado? E voltamos à primeira pergunta: o que é o PS?

  2. tina

    Muito bem. No entanto, acho que no caso de Portugal, o fator Costa teve uma influência muito grande na fuga de votos tanto para a direita como para a esquerda. E se virmos bem, Miliband também afugentava as pessoas. A mediocridade dos líderes de esquerda é gritante, já ninguém de valor pensa em unir-se com conotações de socialismo.

  3. JP-A

    Agora no Observador:

    «Assunção Ribeiro começa por criticar António Costa por não se ter demitido. E ao não fazê-lo, diz, “está muito próximo de se tornar um líder de culto, desafiando esses dois postulados e suportado por um fanatismo indigente da sua corte, em muitos casos subsidiada durante muitos anos pelo orçamento da Câmara de Lisboa”.»

    Alguns dos restantes críticos submeteram-se repentinamente ao silêncio, diz o jornal.
    Até faz lembrar as perguntas colocadas acima.

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