Quem ganha com a abstenção?

Para muito a abstenção tem sido vista como uma forma de combater o sistema. Esta é uma visão partilhada por muitos liberais que, não desejando que o estado se continue a intrometer na sua vida, julgam que se não participarem no processo democrático, isso contribuirá de alguma forma para que o Estado não olhe para eles. Não muito distante do bebé que julga que quando tem os olhos tapados ninguém o consegue ver.

Mas quem ganha a sério com a abstenção. A resposta aqui é simples e intuitiva: ganham os partidos com um eleitorado fiel. No caso português, um partido: o PCP.

Senão, vejamos. Em baixo estão as votações da CDU nas últimas 5 eleições nacionais, em números absolutos.

numerovotos

Como se pode ver, nada de extraordinário. A CDU mantém-se sempre numa faixa estreita entre os 400 e os 450 mil eleitores. Como ponto de comparação, tanto PS, como PSD e CDS têm variações que chegam a ser de 100% do fundo para o pico. Alguns recordar-se-ão, no entanto, da “enorme vitória da CDU, do partido comunista e dos trabalhadores em ambas as eleições europeias”. Na realidade, como se vê no gráfico abaixo, a CDU teve resultados substanciais em eleições europeias:

percvotos

A diferença: a abstenção. Quanto maior a abstenção, maior a vitória da CDU, o verdadeiro partido da abstenção.

27 pensamentos sobre “Quem ganha com a abstenção?

  1. mggomes

    O interessante teste (euandi.eu) aqui mencionado pelo Miguel Noronha, apenas confirmou aquilo que eu já dava por adquirido: após ponderação de cada uma das respostas, o partido português que me é ideologicamente mais próximo (AP) obteve um resultado de 49%.
    Curiosamente, os poucos pontos de contacto entre o meu euro-cepticismo e a sua marcada euro-fobia, colocava logo a seguir o PCTP/MRPP (47%), que é partido em que jamais votaria…
    Como curiosidade, o 2ª partido ideologicamente mais distante em toda a Europa é o Livre. Também aqui não tive surpresas.

    Em contrapartida, o VVD holandês e o UKIP obtiveram mais de 80%.

    Votar em Portugal em quem? Para quê?

    Como diria o Mises, “they’re all a bunch of socialists”!

  2. Pingback: A ter em conta | BLASFÉMIAS

  3. Andre

    Excelente análise.

    E concordo em absoluto com o texto inicial.

    Votar em branco ou não votar, what’s the point? Não muda nada!

    Para mim é claro:
    A esquerda sabe que dentro do quadro orçamental do mundo ocidentar está numa encruzilhada. Tem de malhar no capitalismo e na direita para ter maioria tanto na Europa como nos diversos países. Usa e abusa da demagogia. Se obtiver maiorias, o rumo das coisas muda, restruturações de dividas, mais controle, mais leis (como se não criassem muitas!)

    Isso espalha-se na perfeição no nosso país.

    Daí que isto para mim torna-se uma guerra direita/esquerda em que claramente a segunda leva vantagem nos ultimos 20 anos, com resultados à vista. Assim, voto e votarei sempre PSD/CDS (se forem separados, depende do artista que os encabeça ou no programa) até que a balança se equilibre, o que eu acredito que irá acontecer a médio prazo. O PS até poderá lá chegar, mas tem de mudar por completo o seu discurso, pelo menos enquanto a composição da europa estiver como está.

    Se 2/3 da população trabalhasse no privado, o PS comportar-se-ia assim? E o PSD? Não!

    Com o tempo as mentalidades vão mudar, a direita terá mais credito. CDU terá sempre força mas o PS a continuar assim perderá alguma. Que triste espectaculo têm feito.

    A medio prazo quando isto tudo estiver “melhor” (menos mau) e a balança mais equilibrada, a demagogia baixa, pois a população já aprendeu muito com isto tudo.
    E aí sim, teremos mais pluralidade (que não existe de momento) de opiniões e mais opções de voto credíveis.

    Até lá nunca abstenção, mas impedir que este país se torne ainda mais socialista e asfixiante.

    E não morro de amores do PSD, gosto do PPC e detesto o recém borrado PS que não consegue romper com os dinossauros. Já ninguém os pode ver!

  4. Luís Lavoura

    Boa análise do Carlos, em contradição com a estupidez da atitude de alguns dos seus colegas de blogue.
    Bom seria, porém, que o Carlos tivesse publicado este post antes, e não depois, das eleições.
    É claro que a abstenção, tal como os votos brancos e nulos, a nada levam se não a dar mais força a cada voto num partido. A verdadeira solução é votar num dos partidos pequenos (no menos mau de entre eles).

  5. Miguel Noronha

    O pessoal ainda está à espera do PLD. Demora muito?
    Não me parece que o Lavoura tenha compreendido a conclusão principal do post mas isso já não é novidade.

  6. No colectivismo coercivo, no qual a democracia se inclui, as pessoas estao sempre preocupadas com “quem ganha” e “quem perde”. Todos os que decidem votar (tem a ilusao que) ganham umas vezes e perdem outras vezes. Quem nao vota, nao tem essa ilusao, sabe que perde sempre e por isso nao vale a pena votar.
    Que descansem os anti-abstencionistas: nao ha-de faltar muito para que o voto seja declarado obrigatorio (como alias ja o e’ em alguns paises). Se votar e’ inerentemente bom, porque sera que o tem de tornar obrigatorio? Nao consigo pensar em nada que seja bom na vida e que tenha de ser obrigatorio. Hummm!

  7. k.

    Boa análise.

    Por curiosidade, há a mesma análise para os votos em branco?

    Isto é, é sempre o mesmo número de pessoas que vota em branco, ou é algo do género “nesta eleição não gosto de ninguem, na outra talvez goste?”

  8. Quando é que os verdadeiros liberais têm tomates para pensar em formar um partido liberal e dar uma alternativa a quem neste e em todo o momento não se revê em nenhum dos partidos existentes?
    Terão perdido já uma grande oportunidade, como se viu no resultado do M(arinho)P(into)T, pois é bem mais fácil obter votação útil (uma vez que não há circulos regionais) nas europeias e, a partir daí, ganhar momentum para as eleições legislativas!
    O problema da (verdadeira) direita em Portugal é mesmo isso… falta de tomates…

  9. tina

    Muito bem visto! Seria interessante pôr as duas linhas no mesmo gráfico, % abstenção e % na CDU.

  10. “Se 2/3 da população trabalhasse no privado, o PS comportar-se-ia assim?”

    Suspeito que mais de 2/3 da popuação ativa trabalhará no privado… Pelo menos as estatísticas oficiais dão cerca de 15% da população a trabalhar no “emprego público”; provavelmente há muito emprego público escondido fora disso (como empresas juridicamente privadas mas que têm municipios, institutos, etc., como únicos “acionistas”), mas duvido que chegue a 1/3.

    Ok, de vez em quando aparece uma conversa de “o partido do Estado é mais de metade da população”, mas essa conta é feita somando um monte dispar de coisas no “partido do Estado” (p.ex., costumam contar “os funcionários públicos e os seus familiares”; mas se formos contar no “partido do privado” os “trabalhadores do setor privado e os seus familiares”, também será mais de metade da população)

    [reconheço que isto é totalmente off-topic face ao tema do post, mas já que a questão foi levantada…]

  11. Andre

    Concordo em absoluto com o Sandro Nóbrega.

    Não consigo descrutinar ou mandar um número de aprovação de um partido liberal se existisse, em Portugal.

    A minha inclinação era de que não teria muitos votos. Apenas e só porque a imprensa deste rectangulo castigava de tal maneira que caiam quase no ridiculo.

    Há que pensar isso muito bem.

    Como o observador foi feito por exemplo, no timing e forma certas

  12. JP Ribeiro

    Péssima analise.
    1. A abstenção favorece o PCP. E daí? Que lhes faça bom proveito, porque eu não vejo em quê.
    2. O voto branco ou nulo favorece apenas o sistema vigente, porque cada partido recebe os 14 euros e pico de cada voto branco ou nulo ao longo da legislatura. Muitos não desejam financiar essa gente com os seus impostos.
    3. Recordo que cada voto por si não vale nada nem muda nada: nenhuma eleição foi alguma vez ganha pela diferença de um voto, (exceto no clube do bairro).
    3. O voto representa sempre a expressão de uma atitude emocional e não racional. Vota-se no partido porque ele é cá dos meus e vota-se nos marginais como sinal de protesto (já que o meu voto não muda nada, voto nestes – na utopia – e que se lixe).
    4. 99% dos eleitores não decidem pela leitura de um Programa Eleitoral que desconhecem, e que de qualquer modo não é cumprido.
    5. É uma reacção fascista a de dizer que quem se abstem não tem o direito de se pronunciar sobre a política: quem paga impostos tem todo o direito de votar ou não votar, e o dever de exercer esse direito.
    6. Acredito, (mas não posso provar) que a grande maioria dos que se abstêm o fazem por desprezo pelo sistema, por não acreditarem nele, por não se verem representados por nenhum partido, e mil e uma outras razões, vide a comparação entre a taxa de abstenção a seguir ao 25/4 e as de agora.
    7. Citando Mencken: “o voto não muda nada, e se pudesse mudar seria tornado ilegal”

  13. Jose

    Exelente JP Ribeiro, e ao contrário do que pretendem alguns, a maioria não aceita pactuar com este sistema. É que ir votar, seja lá no que for, é aceitar a forma como as coisas se fazem atualmente. E quem não concorda, quê?

  14. k.

    “Jose em Maio 29, 2014 às 15:05 disse: ”

    A abstenção existe por uma multiplicidade de razões, que apenas podemos divinar.

    Uma coisa é certa: Só porque alguem se abstem de votar, isso não tira legitimidade ao meu voto.

  15. Andre

    As pessoas que não votam é porque não concordam…ok…então concordam com o quê?

    Querem o quê?

    Eu voto mas acho lastimável o que todos os partidos politicos, com 70% de culpa para o PS, fizeram ao país.

    Morreram pessoas a lutar pelo direito ao voto.

    Agora abstenho-me para querer mudar as coisas?

    Vejo muitos dizerem isso que abstenção é um voto de protesto mas nunca li ou ouvi ninguém destes dizer o que muda haver mais ou menos abstenção.

    Há excepção deste post, é um facto que em termos percentuais o PCP beneficia dele porque os que votam nele votam sempre

  16. miguel

    ‘Morreram pessoas a lutar pelo direito ao voto.’
    Direito nao me obriga a escolher entre mau e pior; e se decido que partido nenhum me pode representar quer me obrigar a votar porquê?

  17. O Miguel tem razao. O voto e’ apenas a ilusao de “escolha” entre mau e pior, the lesser of two evils. Como alguem disse no passado “se votar mudasse alguma coisa, ja ha muito teria sido proibido!”

  18. A Republica Cadáver

    Em democracia temos o direito de votar e de nos sujeitarmos ao voto. Ninguém nos pode obrigar ao voto nem à nossa resignação, ao escolhermos não votar. Porque, na prática, é disso que se trata…
    Quem aqui se sente resignado?

  19. Ricardo Monteiro

    Por aquilo que percebo estamos numa de fingir que 80% da abstenção não se deve à preguiça (de ir votar, de alterar a morada de recenseamento,etc ,etc)

  20. Bento 2014

    Eu anulei o voto desenhando no boletim um campo para abstenção escrevendo a palavra e aí colocando a respectiva cruz (X)
    Que alguém me esclareça sobre um tema que tenho entalado na caixa dos pirolitos, e que não vejo nem sequer debatido onde quer que seja. Cá para mim a ausência nas mesas de voto não tem nada a ver com abstenção mas sim com absentismo, seja qual for o motivo da não comparência, e podem ser muitos. Precisa-se uma explicação para a razão pela qual não é criado um campo para abstenção em cada boletim de modo a ser considerado voto validamente expresso. Não sei porque não, mas se calhar até sei. Se não obtiver nenhum esclarecimento continuarei a pensar que confundir propositadamente absentismo com abstenção não passa de uma grosseira fraude descaradamente repetida.
    Se o dicionário não é suficientemente esclarecedor no estabelecimento da diferença altere-se o dicionário.
    Tão simples como isto:
    Absentismo=Ausência
    Abstenção=Acto presencial
    Politicamente basta pensar nos nossos deputados que para se abster tem que estar presentes e se não poem lá os pés tem falta justificada ou não. Note-se que esta posição não pretende defender de modo nenhum o voto obrigatório
    Campanhas eleitorais, uma inutilidade para comer papalvos. Uma única frase servia para todos se apresentarem: Olhem para o que eu fiz e meçam bem como faço ou o que seria capaz de fazer se me dessem rédeas.
    Sai uma proposta:
    Que o parlamento europeu funcione com delegações dos parlamentos nacionais (de forma continuada ou não) na proporção dos votos recolhidos por cada agremiação politica nas legislativas caseiras. Eleições específicas para o parlamento europeu só se justificariam no caso de ser necessário recorrer a marcianos.

  21. Nuno

    Votar é legitimar o processo e isso eu recuso-me a fazer!
    Eu não vou participar numa encenação decadente de consulta popular em que os candidatos a actores principais discordam apenas na forma como hão-de controlar as nossas vidas e não no grau em que eles são mais competentes para o fazer do que nós.
    E, em certa medida, considero repugnante o frenesim com que muitos se deslocam às urnas como quem na ânsia de reservar o seu prato à mesa e a sua parte do saque.

  22. Nuno
    Legitimar que processo? O processo democrático de sufrágio em geral? O processo eleitoral para o parlamento europeu?
    Não querendo legitimar, o que eu até posso entender, qual o efeito prático? O processo sofre alguma perda de legitimidade?
    A única maneira de por em causa o processo é usá-lo contra ele próprio das maneiras possíveis: a) voto de protesto em partidos menores (que pode ser eficaz nas europeias mas não nas legislativas); b) manifestações públicas de descontentamento contra o sistema (nunca as vi) ou c) criação de um movimento cívico (partidário ou não) capaz de iniciar uma reflexão/reforma do sistema actual.
    Ou então… a resignação…

  23. Nuno

    “Legitimar que processo? O processo democrático de sufrágio em geral? O processo eleitoral para o parlamento europeu?”

    Ambas. Eu sou contra a arquitectura “europeia”, contra a perda de soberania, etc., mas também rejeito o estatismo “legitimado” pela maioria. Na minha opinião há direitos que não podem ser referendados nem decisões que podem ser tomadas por outros que não os próprios.

    Resultados? Julgo que se trata de um processo de aprendizagem secular.
    As suas a), b) e c) são apenas ingenuidades que nada resolvem. Nenhum partido vai reformar o sistema nem nenhum movimento ou homem providencial vai aparecer. A única solução é progressivamente desacreditar e esvaziar o sistema, a capacidade legal/executiva que “eles” têm de intervencionar a vida dos cidadãos, uma área de cada vez, e transformar isso em princípio orientador. Isso sim, é a Revolução que falta fazer.

  24. Euro2cent

    > As pessoas que não votam é porque não concordam…ok…então concordam com o quê?
    > Querem o quê?

    Uma pergunta interessante, e até legítima, dada a permanente lavagem democrata aos cérebros do público.

    Vamos então considerar coisas que fariam explodir o cérebro aos propagandistas democratas. Não há grande perigo, porque estamos a falar de quantidades insignificantes de matéria. Mas, de qualquer maneira, não convém fazer isto em casa.

    Pode, por exemplo, haver gente que estaria satisfeita com uma monarquia absolutista, em que o rei – um tipo com herança a deixar aos filhos – nomearia pessoas honestas e competentes para o governo do país, sem elas terem de se sujeitar a chegarem a chefes dos bandos semi-criminosos hoje conhecidos como partidos políticos.

    Esta gente sentiria tanta falta de participação no processo político como um civil sente falta de participação em actividades militares – desde que a sua segurança e bem estar estejam assegurados, prefere tratar da sua vida. O rei, para que a maioria da sua gente não precisasse de se interessar pela política, trataria de que a política não se interessasse, no sentido nietzscheano, por ela.

    (É só um exemplo, inteiramente fictício, à parte já ter ocorrido no horrível passado de que ninguém hoje pode falar sem estremecer. Coitadinhos, nem tinham desodorizantes, ou vendedores de sabão que lhes dessem jornais, rádio e televisão. Um horror.)

  25. Zegna

    Aqui os derrotados são os otários que não votam 66% de abstenção onde se incluiu os votos nulos e em branco . A derrota da propria democracia . Nada querem , nada escolhem e enfim nada vão ter . Na volta agora vão agora organizar mais uma manifestação e dizer que o governo tem de caír . Sociedade desta até o diabo está cheio de os aturar.

  26. fernandojmferreira

    “Nada querem , nada escolhem e enfim nada vão ter.”
    Infelizmente nao e’ assim; Infelizmente vamos ter de levar com o que “os democratas querem”…

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