Recentemente, Pires de Lima afirmou que a falta de produtividade dos trabalhadores portugueses não é culpa deles, deixando uma advertência aos gestores. Com efeito, os trabalhadores portugueses trabalham (em número de horas) tanto ou mais do que os alemães, embora só produzam cerca de um terço. A verdade é que não existe nada intrinsecamente ineficiente no português ou em qualquer outro povo que justifique tal variação, mas tais diferenças existem. O que justifica esta assimetria?
A produtividade do trabalho depende de vários factores, entre os quais o capital físico K (acumulável através de investimento), o capital humano H (acumulável através de educação e maturidade do regime social), o capital público G (as instituições e a infra-estrutura disponível) e, finalmente, a produtividade total dos factores de produção (TFP), um residual estatístico que geralmente reflecte o nível de tecnologia (A).
Quanto maior a disponibilidade de capital (físico, humano e público), maior será a produtividade do trabalho. Contudo, existem trade offs: dado que os recursos são limitados, investimento público pode implicar, via tributação, menos investimento privado e, consequentemente, menos capital físico. Olhando para o nível de investimento é fácil constatar que tem vindo a decrescer nos últimos dez anos.
E, de facto, o país está descapitalizado quando comparado com os restantes países europeus. Olhando para o stock de capital per capita:
Por outro lado, o capital humano tem vindo a aumentar, evidência indirectamente reflectida nos níveis de escolaridade e nos anos de escolaridade:
Resta analisar o capital público G e o TFP. A taxa de crescimento do investimento público tem vindo a decrescer nos últimos anos, mas esta não é a única componente que importa analisar. Capital público pouco produtivo, como auto-estradas inutilizadas, são um custo fixo (manutenção, direitos, etc.) que não pode ser liquidado para afectação a actividades mais rentáveis.
Finalmente, a questão do residual TFP que, para o caso português, é muito significativo no seu contributo para a produtividade (Hall & Jones 1998). Este residual reflecte não apenas o nível de tecnologia mas também todo o enquadramento legal, institucional, estrutural e burocrático que permite que as empresas, os trabalhadores, famílias e demais agentes económicos operem. Este valor é difícil de medir, mas na linha do artigo referido, é a peça crítica para justificar as diferenças de produtividade. O enquadramento social, que deriva das instituições e das políticas governamentais, é crítico para garantir a produtividade dos trabalhadores.
De cada vez que uma empresa tem de interromper actividade produtiva para passar uma guia de transporte para transportar 5€ de mercadoria, de cada vez que o trabalhador é forçado a dirigir-se a uma repartição, de cada vez que a empresa tem de esperar por alvarás, permissões, autorizações e demais penalizações, a economia sofre. O que, por transitividade, faz com que todos soframos.
Portanto, caro ministro, devolvo-lhe a advertência: antes de apontar o dedo aos gestores, que são forçados a produzir bens indiferenciados e de pouco valor acrescentado dada a falta de capital, rédea curta ao Estado, o maior criador de entropia. Estado que torna a actividade económica difícil e taxa até à exaustão os poucos que ainda têm vontade (e paciência) para investir. Por outras palavras, para aumentar a produtividade dos trabalhadores é necessário diminuir — significativamente — a produção do Estado.
Se continuarmos a diminuir o custo de trabalho a troco de nada da parte do capital, qual é o incentivo para melhorar processos?
O estado tem de diminuir, os trabalhadores têm de produzir mais e por mais tempo, e quais são as condicionantes para o capital?
Parece que a lei da oferta e da procura é válida para todos menos para quem investe.
Este post do Insurgente
https://oinsurgente.org/2014/04/27/sobre-os-custos-do-trabalho-e-o-destino-do-seu-rendimento/
mostrou que, para um trabalhador português receber 740 €, tem de produzir o equivalente a 1525 €…
…e, mesmo assim, parece que a “sua” produtividade é apenas 1/3 da alemã!
Esses teutónicos devem ter dopping, só pode!…
Caro Mário,
Excelente análise. Tenho duas perguntas:
1) Quais são as unidades do primeiro gráfico (Formação Bruta de Capital Fixo)?
2) Sabe-me indicar onde estão disponíveis os dados usados nestes gráficos?
Obrigado.
Mais uma vez separamos em classes trabalhadores e “gestores”. Como se existisse uma barreira intransponível.
São todos pessoas, a função de um trabalhador é sempre que achar que o patrão é um idiota formar uma empresa para competir com ele.
Este também é um texto típico de estatistas do FMI. Parte dos habituais lugares comuns. Educação Estatista etc…
Desde quando é sempre melhor ter mais educação? Qual o retorno?
Se formos medir o crescimento da educação vs crescimento da economia vemos um desastre. Logo investimento foi para educação – a geração mais educada de sempre – mas o retorno é o quê?
Pouco se sabe sobre a educação em Portugal:
Por exemplo quantos alunos foram para as profissões do curso que escolheram?
Quantos licenciados trabalham para o estado?
Quantos licenciados que abriram empresas que vivem do mercado e não de contratos com o estado?
Quantos licenciados que abriram empresas, abriram na área da sua licenciatura?
Caro Guilherme, deixe-me apresentar o meu pedido de desculpas. Esqueci-me de incluir as fontes dos gráficos.
Gráfico 1 e 3 elaborados por mim com dados da PORDATA. Gráfico 2 foi retirado de um artigo da VOX [1].
FBFC está em % do PIB.
[1] – http://www.voxeu.org/article/are-germans-really-poorer-spaniards-italians-and-greeks
lucklucky, podemos discutir a questão se a educação gera externalidades positivas ou não, mas parece-me que sai fora do âmbito do artigo. Pessoalmente, eu acredito que sim. E a evidência empírica aponta nesse sentido. Não é coincidência que os países mais ricos do mundo sejam também os países com maiores níveis de educação e não é coincidência que a ascensão explosiva da Coreia do Sul tenha sido propulsionada por um aumento exponencial na educação.
Muito bem. Diz Luciano Amaral – no seu excelente livro publicado pela Fundação FMS -, que a baixa produtividade da economia portuguesa se deve à baixa intensidade de capital, já César das Neves atribui tal, à imoderação salarial – nos setores dos não transacionáveis. De acordo em ambos os casos. Ora, as empresas portuguesas não conseguem acumular capital devido à insaciedade fiscal do Estado; um sorvedouro de recursos especializado no seu esbanjamento. Veja-se o caso dos pagamentos por conta, nada mais nada menos que a antecipação de receitas sobre presunção de lucros das empresas. A ponto de os anos bons provocarem o pânico nos empresários pela incerteza relativamente ao ano seguinte. Chegamos ao absurdo de se oferecerem condições especiais a investidores estrangeiros, demolindo o princípio constitucional da igualdade de oportunidades! Quanto à imoderação salarial, é um facto indesmentível, na esfera pública, devido ao tremendo poder das respetivas corporações; os substitutos modernos do tradicional operariado socialista. Ironicamente, são essas mesmas corporações que menos sofrem com a austeridade. Os salários deverão corresponder ao que a economia respetiva pode pagar; o ajustamento ocorre sempre…e está a acontecer em Portugal. Mas…os custos de contexto!…essa maldita e compulsiva burocracia que vai arrasando as empresas e destruindo a motivação dos empresários, sucessivamente forçados a alocar recursos de produção ao atendimento das exigências da Administração Pública. Refere o caso das guias; é um bom exemplo, mas há muito mais, a imaginação dos dirigentes públicos parece não ter fim, tal como a insensatez e insensibilidade.
Reduzida dimensão do nosso parque empresarial, baixo nível tecnológico da oferta geral, baixa qualificação técnica dos trabalhadores e também dos empresários, são outras das causas estruturais. Elegeu, José Sócrates, no seu primeiro governo, o choque tecnológico, como desígnio da legislatura. Tinha razão, mas não o soube fazer; em vez de convocar os especialistas e investidores para identificar os caminhos do futuro e estratégias articuladas para os alcançar, o que fez?, pois foi!, caiu em cima das empresas e dos trabalhadores impondo formação profissional e certificações a torto e a direito, raramente indutoras de valor, desviando, também aqui, recursos de capital e de produção, para, mais uma vez, sustentar a crescente economia parasita da formação – salvo excepções.
E estamos nisto!, vai ganhando consistência a ideia, sustentada por continuadas experiências pessoais que os governantes nacionais e europeus desistiram das nossas empresas e tratam de as exterminar, impondo sucessivas e crescentes dificuldades, com os mais variados propósitos, hipocritamente anunciados e fundamentados – um deles a concentração administrativa. Um atropelo aos princípios constitucionais. Uma sociedade que mata a capacidade de sonhar e lutar dos seus membros está condenada ao fracasso. Chame-se Portugal ou União Europeia.
Seria também interessante ver a evolução do stock per capita de 2000 em diante, a ter uma curva descendente idêntica à curva de formação de capital, ficaria provado que o aumento da escolaridade tem retornos decrescentes à medida que diminui a poupança, em termos da produtividade do trabalho.
“Contudo, existem trade offs: dado que os recursos são limitados, investimento público pode implicar, via tributação, menos investimento privado e, consequentemente, menos capital físico.” aqui teremos que dividir a tributação em dois, a taxação do capital e a taxação do trabalho.
Só a tributação excessiva da primeira é que é perniciosa, uma vez condiciona o aumento do emprego e o investimento das empresas, a outra até é desejável, uma vez que o rendimento do trabalho é gasto sobretudo em consumo e consequentemente não é capital ligado ao investimento de estruturas produtivas. Aumentando a taxação dos privados aumenta a poupança, poupança esta que fica disponível para emprestar às empresas.
Tiro certeiro!! Exatamente. É sobre todas as limitações e “entropias” referidas que deveria incidir uma verdadeira “reforma” do estado (digna desse nome)… Essa limpeza, esse refrescamento, esse terramoto radical, esfumou-se…
O que se faz ao dinheiro? Ou investe-se ou gasta-se (não considero o cofre-colchão). Se não se investe, o próprio capital diminui inevitavelmente e o consumo aumenta. Seria a altura do Estado criar capital (tipo Caines), mas as tentações dos políticos para dirigirem esse capital para novos consumos são muito grandes. O aumento da procura deveria estimular o investimento, mas parece que um país como Portugal tem de importar muita coisa. Será tão simples como isto? mal me pergunto.
Mário,
Se for ver na Pordata a produtividade aparente do trabalho, ma coisa vem à tona: nas empresas mais reguladas e intervencionadas pelo estado (e que puxam grandes custos para o consumidor), a produtividade aparente do trabalho é maior: petróleos, energias, comunicações, banca e seguros.
http://www.pordata.pt/Portugal/Produtividade+aparente+do+trabalho+total+e+por+ramo+de+actividade-2303
Basta isso para perceber quão perniciosa é a intervenção estatal na indústria.
Carlos C.,
«Seria a altura do Estado criar capital (tipo Caines)»
Ou o Estado pode dar essa oportunidade às pessoas através da não taxação do capital investido e da completa abolição do IRC.
Resulta melhor e faz bem à sociedade.
o capital humano tem vindo a aumentar
Mas permanece muitíssimo mais baixo do que o de outros países europeus. Todos os estudos indicam o estado lamentável das qualificações académicas dos portugueses.
António Barreto,
O seu comentário é muito bom. Concordo plenamente com ele.
Deixo a discussão académica aos académicos. Mas como PME que fui durante mais de trinta anos, não tenho duvidas nenhumas que a principal causa da pouca produtividade dos portugueses se deve ao peso do estado na vida das empresas. Passei horas, dias, semanas, meses, e às vezes anos, para resolver problemas que se resolviam com duas horas de conversa… se houvesse interlocutor. Quando por vezes me dirigia a uma determinada repartição publica para resolver um qualquer problema, depois de dizer ao que ia inveriàvelmente a resposta era: isso não é possivel! ou então: só em Lisboa é que lhe podem dar resposta ao seu problema. E aqui começava o calvário.
Na administração pública existem verdadeiras dinastias de funcionários colocados em postos-chave, que são quem faz andar ou parar a resolução dos problemas; são eles que controlam a pilha dos processos em cima das secretárias, e decidem quais é que ficam por cima, ou quais é que vão para dentro da gaveta. Nenhum politico em Portugal, nem mesmo Salazar, conseguiu acabar com este estado de coisas.
A reforma do estado é muito simples de fazer: este sistema alimenta-se da burocracia; acabem com ela, e reduzem logo automáticamente o número de funcionários em muitos milhares. A máquina do estado é o maior entrave ao desenvolvimento deste país.
Luís Lavoura,
Mais do que o número de diplomas interessa o que eles valem. E nem isso interessa muito. Quando me formei, nenhum americano ou francês com o mesmo nível de formação competia comigo. A universidade portuguesa não é tão má como dizem nas engenharias. É aliás muito boa. Pois em conhecimento eu era esmagado pelos russos (e foi isso que me fez querer aprender russo).
Bom, os novos diplomas dos Novos Oportunistas não valem o papel em que estão inscritos. Mais, lá fora não só valem o poiuco que valem cá dentro, como fazem com que os nossos diplomas obtidos pela maneira certa (vulgo via escola e ensino regulares) sejam também desprezados. Isso é compreensível, pois um empresário esanhol ou inglês pouco ou nada sabem do nossos cursos RVCC e EFA. Nem têm de saber.
Resultado, temos uma horda de portugueses que nem sabem fazer uma raiz quadrada, nem sabem o que é uma raiz quadrada, e mal sabem assinar o nome (e muitos deles contrataram e pagaram pela elaboração do dossiê a outrem) como embaixadores de TODO o ensino português e do nível escolar do seu secundário, regular ou equivalente.
Obrigado, Sócrates!
Bem, esta matéria não tem muito que saber:
Imaginem-se duas fabricas que produzem t’shirts. As duas fabricas tem o mesmo numero de trabalhadores e ganham o mesmo salário e trabalham o mesmo numero de horas. Ambas vendem a mesma quantidade de t’shirts.
A 1ª fábrica vende t’shirts a 5 euros. A 2ª vende-as a 1 euros.
A produtividade do trabalho é imensamente superior na 2ª fabrica.
A culpa é dos trabalhadores?
Claro que não.
A culpa é dos empresários?
Pode ser. A maior parte das vezes é por inaptidão em inovar, tratamento de marca e design e marketing. A outra parte é devido à falta de capital para investir e poder subir na escala de Valor dos produtos fabricados.
No caso de Portugal, a produtividade do trabalho está bem abaixo da alemã. Isso quer dizer que a culpa é dos trabalhadores?
Claro que não. Os trabalhadores portugueses trabalham mais horas, ganham 1/3 do salário e, segundo consta, são pelo menos tão empenhados quanto os alemães. A prova disso é que a Autoeuropa que tem trabalhadores portugueses encontra-se entre as fabricas mais produtiva da marca alemã.
A diferença é que não produzem os mesmos produtos que os alemães. Produzem produtos com menor Valor onde os clientes estão dispostos a pagar um preço inferior. A diferença tambem reside no facto de terem formação continua para os seus trabalhadores. A diferença tambem está na forma como os trabalhadores são acomodados às funções.
Numa empresa alemã um trabalhador que entre ao serviço é-lhe dado, logo no 1º dia, uma lista de incumbências e responsabilidades que dele se espera. O trabalhador lê e assina o papel. Tem depois um chefe que o acompanha semanas a fio. Em Portugal, mesmo nas maiores organizações, um novo trabalhador é atirado para lá. Fica provavelmente três meses sem saber bem o que fazer. Coça o esquerda nuns dias e o direito nos outros. Às vezes coça os dois em simultaneo.
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Portanto, não adianta atribuir culpas. É preciso é que se promova a excelencia organizativa. Se vêm por aí novos fundos e até um banco de fomento, talvez fosse boa ideia previligiar projectos que tenham em devida conta investimentos em inovação de produto, estabelecimento de marca etc.
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Se for para financiar projectos comuns que previligiam a quantidade em vez da qualidade e Valor então, sim, então, é melhor começar a pensar subir a produtividade reduzindo salários. Mas reduzir a sério de forma a iguala-los com os asiaticos. Para metade, pelo menos.
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Rb
O que eu sempre critiquei nas funções produção é a tentativa de atribuir rigor matemático às conclusões de funções baseadas, em grande parte, em variáveis estimadas, altamente duvidosas ou até simplesmente especulativas. Com cuidado e alguma manipulação, estas funções podem dar o resultado que se quiser. Eu prefiro abordagens estatísticas, com o cálculo de correlações entre certas variáveis. Por exemplo, o cálculo do índice de correlação entre o stock de capital por trabalhador e a produtividade parece-me muito mais interessante do que qualquer fantasia baseada na função de Cobb-Douglas. A correlação entre anos de escolaridade e produtividade é também interessante, sobretudo se analisarmos essas variáveis apenas a partir de, por exemplo, 9 anos de escolaridade. Verifica-se então que entre 9 e 12 anos de escolaridade, as diferenças de produtividade não são estatisticamente significativas, dependendo certamente de outros factores.
Há cincoenta e poucos anos, fui com o meu Pai visitar uma fábrica de um amigo dele no norte do país, porque estavam lá a montar umas máquinas novas, umas importadas de França, outras importadas da Alemanha. Andavam uma série de pessoas de fato-macaco à volta das máquinas, todos com ferramentas na mão, a trabalhar na respectiva montagem. Uns eram operários especializados e outros eram…engenheiros, que embora dirigindo os trabalhos, também trabalhavam ao lado dos operários. A fábrica também tinha um senhor engenheiro português, mas a esse nunca o vi de fato-macaco, e muito menos pegar numa chave-inglesa. Ia fumando uns cigarritos enquanto via os colegas alemães e franceses a “meterem a mão na massa”.
Este tipo de atitude que ainda perdura, também tem a ver com a produtividade das empresas. Eu até pagava para ver um sr engº de fato macaco a trabalhar ao lado dos operários numa empresa portuguesa. Em Portugal, engenheiro é para estar sentadinho à secretária.
Também os gestores absorvem muito capital…
Rb,
Disse tudo muito bem. Espero que na empresa que o Ricciardi gere se trabalhe à alemã, se faça produtos de altíssimo valor acrescentado e que os métodos de gestão sejam corretos.
Depois de ter dito tudo isto, e de ter dito tudo o que deveria ser dito, eu ficaria muito surpreendido se estas asserções não tivessem partido da experiência prática de lidar com o mundo empresarial no cargo de gestor, isto é, sem resultados substanciados.
Francisco, eu já não trabalho por conta de outrém há bastante tempo, no entanto lembro-me de um episósio interessante no tempo em que trabalhava numa multinacional alemã. Num certo dia recebia a visita do chefe supremo da empresa. Do meu gabinete via-se para além dos vidros. Via quem saia e quem estava no escritório. Eram cerca das 19 horas quando acabei a reunião com o chefe. Ele levantou-se olhou pelas janelas do gabinete e disse-me mais ou menos assim:
– Oh Rb aquele rapaz lá ao fundo o que está a fazer?
– A trabalhar, disse-lhe. É o director financeiro.
– Mas ele não tem familia?
– Tem.
– E fica sempre até mais tarde?
– Nem sempre, mas ele normalmente sai mais tarde.
– Rb, porque motivo não consegue ele acabar o trabalho no horario de trabalho?
– Ah, bem, enfim, pronto, não sei bem. Talvez haja um atraso qualquer nos mapas.
– Atraso, incompetência, problemas familiares ou precisa de ajuda? Seja pelo que o for, saiba sff os motivos e aja em conformidade. Não queremos trabalhadores a operar para além da hora.
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Eu fiquei com esta estória gravada para memoria futura. Nunca mais me esqueci dela. E já me servi dela bastantes vezes.
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Rb
“Não é coincidência que os países mais ricos do mundo sejam também os países com maiores níveis de educação e não é coincidência que a ascensão explosiva da Coreia do Sul tenha sido propulsionada por um aumento exponencial na educação.”
Os países mais ricos do mundo têm crescido muito pouco, ou nada ou mesmo regredido há mais de década.
E o mesmo para Portugal que até nem é muito rico.
O que é que isso nos diz quando o investimento em educação não pára de aumentar por aluno?
O Problema da Produtividade é apenas e só fruto das tentativas de a aumentar por parte do Estado e das sucessivas intervenções nas relações contratuais estabelecidas pelos agentes económicos.
Repare-se que as comparações imbecis com os países do Norte da Europa têm sempre apontado para causas erradas. Ora é culpa dos empresários que não têm formação, ou dos trabalhadores que não receberam formação, ora da falta de Capital, ora dos feriados, ora das pontes, ora da cerveja, ora do Benfica…
A produtividade nasce da concorrência. O enviesamento constante da concorrência em Portugal tem tido custos absurdos. Repare-se no seguinte:
– A empresa A, consegue um nível de produtividade de X e a empresa B de 1.1X. Em ambiente concorrencial a empresa B conseguiria apresentar um preço inferior ao da empresa A. Todavia, imagine-se que a empresa A, goza de apoios estatais (subsídios à exploração, à contratação, etc) num montante tal que isso lhe permite apresentar um preço 20% abaixo do da empresa B. O que acontecerá à empresa B?
– Os trabalhadores são compelidos legalmente a fazer trabalho escravo (não remunerado) em suas casas. Parece uma afirmação esquerdista, mas a verdade é outra. Forçados a deixar o seu trabalho após 8 horas de trabalho, a tirar 25 dias de férias e a folgar 108 dias por ano, os trabalhadores, têm que recorrer ao seu tempo “livre” (seria livre se tivessem negociado livremente), para, por exemplo, arranjar o telhado lá de casa. Porquê? Porque têm esse tempo “livre” de forma compulsiva. Portanto, entre pagar 30 euros ao pedreiro, ou fazer eles próprios de borla… Não interessa nada que o pedreiro fizesse o trabalho em metade do tempo e com mais perfeição. Ele tem que fazer uso desse tempo livre (a sua própria falta de produtividade não lhe permite contratar o pedreiro, por não ter rendimento disponível, ou seja, ele próprio não valoriza assim tanto o tempo “livre”);
– Junte-se ao acima apontado a carga fiscal. O trabalho escravo, gratuito, que faço em casa, é não tributado. Eu poderia querer jantar fora todos os dias, mas a carga fiscal sobre o restaurante faz com que fique mais “económico” eu fazer o jantar.
Veja-se portanto isto. Por eu estar impedido de trabalhar mais que X horas por semana no meu emprego, sou forçado a trabalhar de forma gratuita em casa. Troco trabalho remunerado a 10 euros à hora por trabalho escravo. Qual lei das vantagens comparativas qual quê. Bem vindos ao socialismo!!!
Veja-se agora do lado da produtividade. O trabalho especializado é altamente tributado. O trabalho gratuito (não especializado em norma) é não tributado. Qual é o incentivo em ser especializado?
Portanto, antes do capital, ou da falta dele, teremos que constatar que é este o problema. O estado tem que encarar que o problema da falta de produtividade, não está nos empresários, nem nos trabalhadores, nem tão pouco na falta de incentivos. Está precisamente no Estado. Alguém disse que elegemos imbecis para resolver os problemas que os outros imbecis que lá estiveram antes criaram, quando estavam a tentar resolver os problemas criados pelos imbecis anteriores a esses. (Creio que foi o Mencken).
É isto que se passa. Tão simples e tão complicado de entender.
Ricardo Batista,
O trabalho que faz em sua casa para si mesmo não é trabalho escravo. Trabalho escravo é aquele em que 1) não pode gozar dos frutos do seu trabalho e que 2) tem de fazer compulsoriamente. Ajudar por sua vontade o seu vizinho a arranjar o telhado também não é trabalho escravo.
Dito isto, por favor não ande por aí a falar de trabalho não remunerado, mesmo que feito por si para si, senão o faminto Estado ainda divisa para nosso mal uma Taxa de Ocupação Laboriosa dos Tempos Livres ou uma Taxa de Industriosidade.
O desrespeito pelos compromissos e uma justiça lenta, talvez seja a principal causa para a baixa produtividade, porque burocracia também há nos outros países europeus.
Francisco Colaço,
Correto. trabalho escravo é um exagero. Poder-lhe-ei chamar de trabalho compulsivo. Todavia não muda o sentido do raciocínio. Eu não sou livre de decidir trabalhar mais horas e fazer total uso da Lei das Vantagens Comparativas (de bom grado pagaria à empregada de limpeza para fazer mais uma hora a 6€ e ela bem agradecia, mas não me resta alternativa senão abdicar do meu trabalho onde produzo mais que 15€ à hora, para a substituir na tarefa). Calculo que profissões nunca chegaram a existir na sociedade porque limitamos (limitaram, mas aceito a responsabilidade de ainda não ter colocado um bomba na AR. E não, não sou anarquista, mas não vejo forma de a gente que nos trouxe até aqui nos tirar daqui ou sair de cima), a liberdade contratual (consagrada na meretriz da Constituição Portuguesa).
Não avancemos é para teorias idiotas sobre a produtividade. Ou é disto ou é daquilo. Essas teorias conduzem sempre a ideias fabulosas de políticos para resolver o problema. E já sabemos o que se passa de seguida. Tributa-se um desgraço qualquer, ou um conjunto deles porque isto a dividir por todos não custa nada, para favorecer um mer**s ou dois com promessas de que têm a chave para a produtividade. É da falta de liberdade contratual essencialmente. E lá vêm os argumentos do costume com a Alemanha e a Suécia e outros paraísos que tais. Confundem sempre a consequência com a causa…
Nota: queria deixar claro que com o meu comentário das 12:05 não pretendi de modo algum apoucar os engenheiros portugueses. Eu próprio interrompi a meio um curso de engenharia.
Quis apenas pôr em evidência uma diferença de mentalidades. De resto conheço muitos engenheiros portugueses que têm desenvolvido excelentes trabalhos “sentadinhos à secretária”.
ACS
Alexandre Silveira
Trabalho com alguns. E trabalho com vários que estão activamente no terreno, a desenvolver e a criar novas coisas. A maioria pensa em sair deste paraíso socialista e rumar para o inferno capitalista. Engenheiros Electrotécnicos diga-se, que desistem de trabalhar para o Estado neste país.
Francisco
Ainda sobre o trabalho escravo, lembrei-me que conheço um caso de alguém que está efectivamente numa quasi escravatura. Tem uma empresa em dificuldades e não recebe salário vai para um ano (fará um ano este Junho). Todavia, todos os meses paga a Segurança Social, porque não o fazer é crime de abuso de confiança. Está preso numa história de Kafka e não consegue sair.
Ricardo Batista,
Quando a Segurança Social, ou a segurança do emprego dos que trabalham na suposta e mal fadada Segurança Social, aqui em Portugal impõe taxas quer uma pessoa receba quer não, a iniquidade é máxima. Os profissionais independentes estão sob a espada de Dâmocles. Se um cliente (e quantos!) resolve que afinal não tem dinheiro para pagar e abre falência, não obstante ter um profissional liberal gasto do seu para fazer um trabalho (e perdido este dinheiro e não ter recebido nenhum), tem de pagar o estipêndio ao clube do dia 21 sem nele ter quota ou pertença.
O caso do seu amigo é igual a tantos outros.
Imagine o que é explicar o que é um recibo verde a um profissional liberal espanhol.