Oh não! Infelizmente a ideia, a 20ª no obituário de João Miranda, não jaz em paz. De facto, passámos, esqueçamos como, mas passámos para um patamar de défice bastante diferente daquele em que estávamos em 2009 e 2010, anos de loucura socialista terminal, mas não muito diferente do normal em Portugal, nas últimas décadas. De facto, isso não teve qualquer efeito na trajectória da dívida pública, que continua a crescer como não se via desde há décadas de que já nem temos memória a jeito. Pelo que não seria de espantar que outras de que ele se despede regressassem como zombies incómodos a atazanar-nos o juízo. É que a 20ª, muito viva, é tramada. A abordagem aos problemas do sector bancário – o que é bom para a troika banca é bom para Portugal -, premiando, cultivando, impondo se necessário for a irresponsabilidade completa – explica em parte, embora só em parte, porque tem sido assim.
Fonte: Ameco. Dados em percentagem do Porduto Interno Bruto. A escala da esquerda é para a dívida, a direita para o défice.
Eu diria que o obituário do JM está cheio de ideias bem vivas.
Em particular a 20ª. Parece que o JM vive noutro mundo. Toda a gente sabe que a dívida está a explodir.
Desde o início de 2011 e até hoje, a comunicação social é incapaz de explicar aos portugueses a verdadeira situação do País, fruto da (má) governação, especialmente a da última década. Sem existir um consenso na sociedade portuguesa relativamente ao diagnóstico da doença e dos problemas do País, como poderá chegar-se a um acordo quanto às medidas para o curar?
http://jornalismoassim.blogspot.pt/2013/01/o-fardo-do-juros-o-chico-espertismo-e-o.html
Não é só a ideia nº20. São todas as outras. Ele bem as tenta enterrar mas, até ao momento, quem se tem enterrado é ele próprio.
Todas?! Então, explique lá porque é que a 4 a 16 e a 17 estão erradas?
Suponho que o que o João Miranda quiz dizer é que o ritmo de crescimento da divida publica baixou muito significativamente (grosso modo, em função do défict orçamental relativamente ao Pib, para cerca de metade ao ano a partir de 2011) !
E isto apesar da economia estar em recessão e dos nossos principais mercados externos estarem a crescer menos, estagnados ou mesmo em retracção.
Mesmo assim continua a haver déficit orçamental e a dívida continua a aumentar ?… Claro, enquanto houver déficit é matemático que a dívida aumenta !…
Mas qual é o espanto ?… Não se pára em poucos quilometros um comboio, o do endividamento, bem pesado e que vem a descer desde há muito (dívida a subir pelo menos desde há 20 anos), cada vez mais embalado numa descida mais pronunciada (pelo menos desde 2008) !… Já não é nada mau estar-se a conseguir reduzir progressivamente a velocidade !…
Compreende-se que muitos daqueles, à esquerda como à direita (com motivações e argumentos diferentes, naturalmente), que desde há dois anos anunciam o muito próximo e estrondoso falhanço do programa de ajustamento da Troika, achem agora pouca coisa e desprezível … que as despesas públicas primárias estruturais (não dependentes da conjuntura) tenham sido considerávelmente diminuidas (pela primeira vez desde há décadas), que os déficits orçamentais tenham sido reduzidos para metade, que os mercados comecem a dar sinais de acreditar que a consolidação orçamental em Portugal está no bom caminho e que o país poderá, num futuro não muito distante, e sem assistencia financeira, gerir uma dívida sustentável, isto é, reembolsável nas condições e nos prazos contratados (o que não quer dizer forçosamente que tenha necessáriamente de conseguir reduzir rápidamente o volume acumulado desta dívida ; muito embora, até por outras razões, de competitividade, seja desejavel que o faça) !
“Não se pára em poucos quilometros um comboio, o do endividamento, bem pesado e que vem a descer desde há muito”
O precipício “não se importa” se o comboio vem a descer há muito ou há pouco.
lucklucky (Fevereiro 1, 2013 @ 03:04) : “O precipício “não se importa” se o comboio vem a descer há muito ou há pouco.”
Trata-se de reduzir a velocidade para não descarrilar e conseguir parar antes de chegar ao “precipicio” !
Neste caso “o precipicio” seria não conseguir regressar aos mercados quando as possibilidades de assistencia financeira se esgotarem. Normalmente, sem desvalorização monetaria e empobrecimento acentuado.
Ao Fernando S: a dívida pública, um rácio entre o valor nominal dos compromissos e o rendimento de um país, medido pelo seu PIB, tem uma dinâmica um bocado mais complicada do que julga. Basicamente ela é função, por uma parte, do stock de dívida passado, e da diferença entre a taxa de juro nominal implícita naquele stock e a taxa de crescimento do PIB nominal no momento presente, e, por outra parte, do saldo/défice primário. Quanto maior for o stock, menor o crescimento nominal e maior a taxa de juro, maior é o saldo primário necessário para compensar o primeiro efeito, a primeira parte, chamada efeito de bola de neve, o efeito de avalanche. Acresce a isto as operações de ajustamento défice-divida, que são as operações pelos quais crescem os compromissos nominais do Estado, sem inscrição orçamental, que têm sido muito elevadas. Registe que em 2011 a dívida aumentou 14,8 pontos percentuais do PIB, por efeito combinado do que referi, e em 2012, não estando ainda apurado o valor definitivo da dívida, será por certo da mesma ordem de grandeza, como se vê pelo gráfico. Nunca a dívida, desde que sou capaz de recuar no tempo com rigor, cresceu a este ritmo. Olhe outra vez para o gráfico e observe: o défice a baixar, a dívida a aumentar em aceleração. Não há como olhar com atenção para os gráficos. Com atenção.
Jorge Costa
Jorge Costa,
Nunca julguei que a dinamica da divida não fosse técnicamente complicada….
O que discuto são sobretudo as conclusões politicas que se tiram dos numeros.
Quanto ao essencial, e esperaria que aqui estivessemos minimamente de acordo, o elevado nivel que atingiu a divida publica e a acelaração dos ultimos anos deve-se às politicas de fundo seguidas pelos governos anteriores. O governo actual herdou uma situação gravissima e já fora de controlo. Melhor ou pior, em condições muito dificeis, inclusivamente no plano politico interno, o governo actual tem vindo a implementar uma estratégia de consolidação orçamental que, nunca é demais relembrar, corresponde basicamente ao programa da Troika. Apesar de tudo, incluindo as debilidades e as inconsequencias do governo actual, desta estratégia resultou uma redução importante do déficit orçamental nos ultimos 2 anos.
Mesmo assim, é verdade que a divida publica acumulada continuou a crescer. Em termos absolutos, como é matematicamente obvio. Relativamente ao Pib, quer em resultado do aumento do valor absoluto quer em consequencia da diminuição do Pib.
Admito inclusivamente que se possa sustentar que, matematicamente, o ritmo de crescimento da divida publica relativamente ao Pib até aumentou em 2011 relativamente aos dois anos anteriores (2009 :11,5% ; 2010 : 10,3% ; 2011 : 14,5%) e não deverá diminuir significativamente em 2012 (vai certamente ficar acima dos 11% estimados em Outubro pelo governo).
Mas, em rigor, também não se pode dizer que a divida esteja a “acelarar”!…
De qualquer modo, se porventura os déficits orçamentais se tivessem mantido nos niveis dos anos anteriores, dos cerca de 10% do PIB de 2009 e 2010, mas também da média da última década, sem a redução do déficit orçamental verificada nestes dois ultimos anos, os aumentos absolutos e relativos da divida seriam certamente ainda maiores.
Neste sentido, creio que se pode dizer que o ritmo de crescimento exponencial da divida começou a ser contido.
Importa não perder de vista que a continuação do forte crescimento da divida relativamente ao Pib nestes ultimos dois anos deve muito às consequencias financeiras e economicas da crise estrutural e das politicas de austeridade, por um lado, e a medidas extraordinárias no âmbito da consolidação das contas públicas, por outro lado. Ou seja, por um lado, o aumento dos juros e a diminuição do Pib nominal (esta última com maior incidência em 2012), e, por outro lado, outros compromissos do Estado não inscritos no orçamento (estas sobretudo em 2011, ano de maior crescimento da divida).
Descontando estes factores, conjunturais e extraordinários, ve-se que a contribuição do saldo primário orçamental para o aumento da dívida, embora ainda positivo, baixou muito significativamente, passando de mais de 7 pontos percentuais em 2009 e 2010 para 0,4 e 0,8 (estimativa) pontos percentuais em 2011 e 2012 respectivamente. Este indicador mostra claramente que o aumento da dívida já depende muito pouco do desequilibrio entre as receitas e as despesas do funcionamento estrutural do Estado. Assim sendo, admitindo que nos próximos anos este indicador possa ser ainda melhorado e que é expectável uma melhoria dos restantes factores (menos recessão, redução do juro médio da divida acumulada, inexistência de outros compromissos extraordinários), pode-se dizer que estão criadas condições para uma desacelarção do crescimento da dívida pública em valor absoluto em 2013 e para o início de uma inversão de tendência relativamente ao Pib a partir de 2014 ou 2015.
Por mais paradoxal que possa parecer, tendo em conta que a divida pública portuguesa se aproxima de um máximo histórico acima dos 120% do Pib, a verdade é que a situação já foi bem pior e a tendência é para uma melhoria progressiva. A perspectiva real de um regresso aos mercados é uma confirmação adicional.
Não é o óasis …há ainda muitos riscos e muito por fazer, em particular no que se refere à redução das despesas estruturais do Estado,… mas também parece ser exagerado falar-se numa “explosão” da divida pública portuguesa !
Concordo no essencial com o que diz. De facto, o contributo do saldo primário, tornou-se insignificante. Mas que a dívida está em tendência de aceleração, é um facto. Não é preciso fazer sobre a distribuição do gráfico nenhuma linha de tendência, com uma média móvel, ou outro processo estatístico qualquer. Vê-se imediatamente, sendo a aceleração recente resultado essencialmente do efeito dos juros e crescimento, e dos ajustamentos défice-dívida (operações não inscritas no orçamento). De resto, como julgo depreender do que disse, parece-me não ignora que há riscos de insustentabilidade. E sim, o que se está a passar é basicamente o efeito de um grave, gravíssimo, passivo acumulado. Ao efeito dos juros e do crescimento chama-se tecnicamente, não por acaso, bola de neve. O saldo primário para a conter tornou-se elevadíssimo. Sem nenhum paralelo na nossa história democrática. Nenhum, sobetudo porque tem de ser continuado, permanente. São necessárias reformas de fundo para o conseguir, e não é liquido que não haja um problema de consistência intertemporal. Nada líquido mesmo. Mas que terão, em qualquer caso, de ser feitas reformas de fundo, terão. E tardam.