Acerca do suposto fracasso da austeridade

Pretendedo provar o fracasso do programa de austeridade do governo os “abrantes” apresentam a imagem supra. Porém os gráficos e números neles apresentados contam uma história algo diferente. O está a falhar na execução do OE2012 é a receita. Algo que vários insurgentes avisaram atempadamente. A receita fiscal depende de demasiados factores exógenos e numa conjuntura recessiva é muito pouco fiável. É até altamente desejável que se verifique uma redução da carga fiscal que incide sobre individuos e empresas Para além do mais a redução do défice deve, por motivos estruturais, ser feita essêncialmente (para não dizer, exclusivamente) pelo lado da despesa e recorrendo a cortes permanentes. Ora, precisamente no lado da despesa pode-se verificar que o governo está a conseguir atingir e mesmo a ultrapassar alguns objectivos.

Já nos governos do PS tinhamos avisado que a redução do défice era feita exclusivamente pelo lado da receita aproveitando a conjuntura favorável mantendo-se a despesa pública em crescimento constante, inclusivamente acima inflação anual. Recordo-me de ter escrito na defunta revista Atlântico acerca dos perigos deste caminho e que uma reversão da conjuntura económica faria disparar o défice e traria à luz do dia todos os erros cometidos. A realidade provou exctamente isso.

11 pensamentos sobre “Acerca do suposto fracasso da austeridade

  1. Paulo Pereira

    O Passos / Gaspar / Troika estão a aprender à força que Keynes tinha razão : o consumo e o investimento privados são pro-ciclicos.

    E que as fadas da confiança afinal não existem .

  2. Fernando S

    Por sinal a carga fiscal (% do PIB) até esta a descer … Pouco, insuficiente para ser um incentivo para a actividade economica, mas a descer.
    A razão principal da queda nas receitas fiscais não é o aumento em algumas taxas de imposição, mesmo as do IVA, é a propria recessão.
    Se alguns impostos (taxas) não tivessem aumentado a queda nas receitas teria sido ainda maior.
    O aumento de impostos faz naturalmente baixar o rendimento disponivel das familias e as margens de muitas empresas. Teria sido naturalmente preferivel que não acontecesse. Pelo menos numa situação normal, numa economia equilibrada em termos macro e micro.
    Mas a nossa economia não está equilibrada. Durante anos os rendimentos médios das familias aumentaram para além das possibilidades reais de uma economia eficiente e sustentavel. O Estado e muitos dos beneficiarios directos e indirectos da sua intervenção e das suas despesas captaram recursos e tiveram vantagens que pesaram sobre uma parte menos protegida da economia privada, empresas e familias, e sobre o grau de endividamento do pais, do conjunto do pais, ao exterior. Trata-se do famoso desequilibrio entre o sector de bens não transaccionaveis, onde se inclui o proprio Estado, e o sector de bens transaccionaveis, do sector exportador à produção para o mercado interno de bens sujeitos à concorrencia externa. O excessivo endividamento externo financiou sobretudo o lado da economia artificialmente previligiado e desenvolvido. Muito embora a divida pública seja do pais no seu conjunto, o mais justo e razoavel, até no sentido de corrigir progressivamente os desequilibrios existentes, é que o esforço principal para sanear as contas publicas seja feito pelos sectores da sociedade que mais beneficiaram do modelo que nos trouxe até aqui. Como não é possivel, nem desejavel, identificar e penalizar com rigor apenas as pessoas que mais foram beneficiadas, independentemente de serem mais pobres ou mais ricas, as medidas de austeridade fiscal acabam por afectar indistintamente muito mais gente, não são idealmente as mais finas e as mais justas. E ainda mais dificil se torna uma distribuição justa e eficaz dos sacrificios perante a resistência de todo o tipo de lóbies e corporações de interêsses que sentem ter algo a perder. O recente acordão do Tribunal Constitucional, fechando para o futuro a possibilidade de cortes nas remunerações dos funçionários públicos e empurrando o governo para um possível agravamento da componente fiscal da austeridade em desfavor da das despesas públicas, é um exemplo flagrante destas dificuldades, mesmo ao nível das instituições.

  3. lucklucky

    Não há austeridade alguma. A Dívida ainda não começou a ser reduzida nem sequer estabilizada. Continua a aumentar.

  4. jose

    Não é suposto. É fracasso. O fracasso mede-se nas condições de vida e nas condições económicas, em termos de favorecimento do crescimento futuro. As condições de vida estão muito piores, as condições económicas também, a carga fiscal aumentou, a recessão piorou. Paga-se mais em apoios ao desemprego, recebe-se menos em impostos directos e indirectos. O PIB desce. A cegueira ideológica tem custos.

  5. Fernando S

    jose : “O fracasso mede-se nas condições de vida e nas condições económicas, em termos de favorecimento do crescimento futuro.”

    Por definição, a austeridade é precisamente isso, uma degradação “nas condições de vida e nas condições economicas”. Não ha austeridade com crescimento e melhoria do bem estar. A austeridade é um tratamento e o tratamento é necessariamente doloroso. Trata-se do preço a pagar pelas asneiras do passado. O aumento do desemprego, a baixa do rendimento disponivel, a queda no investimento e no consumo, etc, são consequencias inevitaveis, mas até mais das asneiras do que da austeridade propriamente dita.
    O objectivo da austeridade é precisamente a criação das condições economicas para um “crescimento futuro” sustentavel que, por sua vez, permita uma nova melhoria das condições de vida.
    A verdade é que a actual politica de austeridade até esta a ter algum sucesso na criação de algumas dessas condições : melhoria das contas externas, consolidação orçamental, maior credibilidade externa e nos mercados, baixa nas taxas de juro da divida publica, baixa do custo do trabalho, etc…

  6. Paulo Pereira

    O Fernando S é um adepto do muito longo prazo !

    Algum país do mundo resolveu os seus problemas com a redução do PIB , tornando a divida mais pesada ainda ?

  7. Fernando S

    Paulo Pereira : “Algum país do mundo resolveu os seus problemas com a redução do PIB …”

    A teoria e a historia economica ensinam-nos que as crises (“redução do PIB”) são um mecanismo espontaneo de restabelecimento de equilibrios fundamentais e das condições para uma nova fase de crescimento (do PIB).
    A austeridade é apenas o acompanhamento da crise pelo governo !

  8. jose

    Quando a “melhoria das contas externas” se deve a uma descida brutal das importações, mais do que a um aumento das exportações, quando a baixa nas taxas de juro da divida é tal q elas continuam em níveis insustentáveis, quando a credibilidade é tanta que a troika se marimba para o que o governo acha que merece em termos de suavização das condições da ‘ajuda’ externa, sim estamos muito melhor… Cada vez mais estrangulados, cada vez com menos condições de pagar o que devemos. Estamos mais preparados para crescer? Tretas. Trata-se o o trabalho como lixo, e depois fica-se chateado quando os que trabalham ou não compram nada, ou se põem a andar daqui para fora. Sem classe média não há crescimento. Com a austeridade, não há classe média. Sem crescimento não há maneira de pagar dívidas. É bastante simples até.

  9. Fernando S

    A ideia do jose é mais ou menos assim : as empresas e o Estado pagam bons salarios ; cria-se assim uma classe média com dinheiro para consumir ; o consumo leva as empresas a investir e a aumentar a produção ; há crescimento.
    Foi este tipo de ideia “bastante simples até” que foi aplicada nas ultimas décadas e trouxe o pais para a situação critica em que está.
    A austeridade não é um objectivo para ninguém (talvez para frades franciscanos !…).
    A austeridade é uma necessidade para corrigir as asneiras “bastante simples até”, para por as coisas na sua devida ordem : criar condições reais para as empresas poderem investir, empregar, produzir, serem competitivas no mercado ; pagar salarios compativeis com a viabilidade e rentabilidade das empresas ; deste modo há mais crescimento, mais emprego, melhores salarios.
    Primeiro produz-se (oferta) e depois distribui-se (procura).
    Melhor : apenas se pode consumir aquilo que se produz.
    De outro modo sai-se da economia – a utilização de recursos escassos para a criação de mais riqueza no futuro – para o desperdicio – o consumo de recursos desviados da produção.
    O problema é que ao fim de algum tempo se constata que a produção possível é insuficiente para o consumo programado e passa-se a consumir a crédito. Até os credores dizerem chega.
    E lá vem a austeridade !…
    “É bastante simples até.”

  10. jose

    “Foi este tipo de ideia “bastante simples até” que foi aplicada nas ultimas décadas e trouxe o pais para a situação critica em que está.” não não foi.. O que trouxe o país para o estado em que está não foram os salários altos da classe média.

    Foi a destruição da economia real. Deixámos de investir em produzir “coisas” que passámos a importar. Investimos em betão e estradas, em concessões ruinosas para essas mesmas estradas, e andámos a oferecer rendas bilionárias a interesses privados. O dinheiro que entrou no tempo do PM Cavaco em vez de ir para a educação, foi para jipes, sacos azuis e campos de girassóis deixados a secar. Lisnave: lixo. Sorefame: lixo. Pq? Pq não trabalhavam bem? Não, pq nos pagaram para os deixar morrer.

    O problema dos defensores da austeridade é que pensam que o pessoal que mais sofre com ela a merece. A culpa é vossa, ó pessoal dos 700 euros. Não é das lusopontes nem das teixeiras duartes, e dos seus ex-governantes-agora administradores que vos concederam as magnificas rendas/negociatas que o contribuinte financia.

    Portanto, agora caros assalariados, paguem os vossos votos no centrão, paguem as contas cheias nas offshores, e paguem também os rendimentos do capital acumulado à vossa conta, no qual não vamos tocar, obviamente. Vá saiam da vossa zona de conforto, só mais um bocadinho.

    Caro Fernando, histórias da carochinha só para putos tá bem? Eu pessoalmente já não tenho pachorra.

  11. Fernando S

    Caro José,

    Se não tem “pachorra” … não comente ! Essa é boa !!

    Fala na destruição da economia real, no excesso de importações, em investimentos publicos em infraestruturas desajustadas, em trafico de influencia e corrupção que beneficiaram interesses “privados”… Tudo isto é o resultado de um modelo economico que assentou num Estado omnipresente e intervencionista, que gastou o dinheiro dos contribuintes e até o dinheiro que o pais não tinha. O crescimento da fiscalidade e da despesa publica alimentou um sector de bens e serviços não transaccionaveis (onde se inclui o proprio Estado e todos aquelas pessoas e empresas “privadas” que vivem a ele encostadas) em prejuizo de um sector de bens transaccionaveis (a tal “economia real”, a industria exportadora, a industria e a agricultura que poderia produzir bens em vez de serem importados, etc). Este desequilibrio fez com que uma parte muito significativa dos recursos do pais fossem canalizados para gastos e consumos que, para além de terem sido o terreno fértil para as tais rendas/negociatas, melhoraram também bastante o nivel e qualidade de vida da generalidade dos portugueses. Ignorar ou negar este aspecto é passar ao lado de algo de evidente e essencial. Claro que nem todos os portugueses benificiaram com isso e claro que uns beneficiaram mais do que outros. Por exemplo, os empregados no Estado e nas actividades não transaccionaveis “protegidas”, viram os seus rendimentos e o seu nivel de consumo crescer mais do que todos os outros, mais ligados aos transaccionaveis não “protegidos” (industria “tradicional”, agricultura, etc). O que é certo é que uma parte da relativa prosperidade das ultimas décadas foi artificial e obtida à custa do desperdicio de recursos internos desviados da “economia real” e de recursos externos obtidos da Europa e a crédito. Foi precisamente a falta de investimento nas nossas capacidades produtivas internas que levou à perda de competitividade e à degradação das contas externas. Foi precisamente o consumo (e o investimento publico e em sectores não transaccionaveis) a crédito que levou à degradação das nossas contas publicas e ao elevado endividamento externo. Por tudo isto estamos agora numa situação critica e somos obrigados a seguir uma politica de austeridade que restabeleça equilibrios e crie condições para uma (lenta e dificil e incerta) alteração do nosso modelo economico.

    Esta austeridade e as reformas estruturais destinadas a sair de um modelo que não é sustentavel, implicam naturalmente sacrificios por parte dos portugueses (já que os outros, nomeadamente na Europa, não querem pagar por nós). Em principio, por uma questão de justiça, mas também e sobretudo por uma questão de eficácia, estes sacrificios deveriam ser feitos sobretudo por aqueles que mais beneficiaram com o modelo anterior.
    Em primeiro lugar, naturalmente, os corruptos e todos aqueles que encheram os bolsos com as tais negociatas e rendas de privilégio. A dificuldade é que não é facil identificar e chegar a todas estas pessoas, avaliar os ganhos indevidos, e por em pratica os meios adequados para as fazer pagar. Para tal seriam necessarios enormes meios de investigação e de justiça que não existem. Acresce que muitas daquelas pessoas não fizeram nada de ilegal, apenas tiraram partido de um sistema que existia. Não é facil e não é desejavel abrir uma espécie de caça às bruxas que poderia ter consequencias nefastas e resultados modestos. De qualquer modo, num Estado de Direito, cabe à Justiça (e à administração fiscal) tratar este tipo de realidade. É algo frustrante mas é o mais razoável. Acrescente-se que, apesar de muitas destas pessoas terem beneficiado de modo escandaloso de favores e privilégios e de terem enchido os bolsos de dinheiro, e mesmo admitindo que seria possível recuperar uma parte significativa desse dinheiro, nunca seria suficiente para ultrapassar a situação crítica em que estamos hoje. Estas pessoas aproveitaram-se à grande de um sistema de desperdício de recursos. Mas o sistema era global, à escala do país, e “irrigou” quase toda a gente. Foi assim que os portugueses se iludiram e adormeceram na convicção que seria sempre para melhor. Por mais que fosse possível fazer pagar os corruptos e os oportunistas, isso não resolveria o problema. O que se pode esperar é que venham a ser feitas reformas estruturais que alterem o modelo e que acabem de vez com as condições que permitiram o que se passou.
    Em segundo lugar, podemos falar em categorias socio-profissionais que, globalmente, mais cresceram e beneficiaram com o modelo anterior. Refiro-me aos funcionarios publicos e aos empregados dos sectores não transaccionaveis. Claro que aqui não estamos de modo nenhum no campo da criminalidade e da imoralidade. Todas estas pessoas fizeram a sua vida honestamente e respeitando as regras. Não roubaram nada e, em muitissimos casos, mereceram e merecem humanamente e profissionalmente o que tiveram e têm. Não foi nem é culpa delas se o país seguiu uma política errada. E se culpa há é no sentido político. A responsabilidade principal é dos que defenderam, aplicaram, e apoiaram, essa política. Começando pelos dirigentes políticos. Mas não esquecendo que esses políticos foram eleitos (e reeleitos) por cidadãos livres. A responsabilidade pelo que foi feito é de muita e muita gente. No limite é do conjunto do país, que optou pela facilidade e se acomodou, deixou andar. Não é por uma qualquer “culpa” que certas categorias de portugueses podem ser chamadas a fazer mais sacrifícios para sair da crise. Quando muito seria por uma questão de justiça : quem mais beneficiou deve agora fazer mais sacrificios. É sobretudo uma questão de eficácia da política : a correcção dos desequilíbrios recomenda que os empregados nos sectores que cresceram artificialmente contribuam agora mais do que os empregados em sectores que foram penalizados e atrofiados. Um desses sectores, numéricamente o mais importante, é o Estado. Por isso é que as despesas do Estado devem ser significativamente cortadas e a mais importante destas despesas é com remunerações de funcionários. A medida mais eficaz e mais fácil para o governo é cortar nas remunerações dos funcionários públicos. Outros sectores não transaccionáveis deveriam ser também chamados a dar uma maior contribuição para a austeridade. Mas aqui é tudo muito mais dificil e arriscado. O governo não pode, e não deve, interferir directamente na gestão das empresas. É extremamente dificil, para não dizer impossivel, fazer a destrinça entre as diferentes actividades e empresas no sentido de identificar aquelas que mais beneficiaram com o modelo anterior. Esta é a razão pela qual não é razoável e recomendável que o governo tome medidas que penalizem específicamente o conjunto destas empresas e os seus empregados. Também aqui o que o governo pode fazer é implementar as reformas estruturais que retirem a estes sectores os privilégios e vantagens que não têm as empresas e empregados do resto da economia.
    Em terceiro lugar, e finalmente, como não é tecnicamente possível e razoável concentrar todos sacrifícios necessários apenas nestes sectores e nestas categorias, o governo vê-se obrigado a aplicar medidas de austeridade que penalizam a generalidade das empresas e empregados em todos os sectores da economia e da sociedade, incluindo mesmo aqueles que de alguma modo não benificiaram ou foram até prejudicados com o modelo anterior.
    Neste ponto há que fazer duas ressalvas.
    A primeira ressalva é que, por razões de eficácia tendo em conta o objectivo de reformar o modelo económico no bom sentido, os sacrifícios devem incidir o menos possível sobre as empresas do sector privado e sobre os seus accionistas. As empresas são o elemento central da criação de riqueza, de emprego, de distribuição de rendimentos. O modelo anterior descurou esta regra e o Estado sobrecarregou as empresas com uma fiscalidade pesada, com uma legislação laboral extremamente rígida, com uma burocracia pesada, com diversos custos de contexto elevados. Estas condições explicam em grande parte a perda de competitividade da economia nacional e, juntamente com os efeitos da crise e da politica de austeridade, a situação dificil em que se encontram hoje grande parte das empresas. Uma prioridade do governo deve ser a de poupar o mais possível as empresas e mesmo, na medida do possível, de começar a aliviar a carga fiscal que sobre elas incide.
    A segunda ressalva é que as medidas de austeridade a aplicar ao conjunto dos cidadãos devem ter em conta a situação dos mais desfavorecidos e das famílias de rendimentos mais baixos. Mas apenas destes, porque, em tempo de crise e emergência, não se justifica nem é viável e eficaz montar todo um sistema complicado e pesado que diferencie entre todas as situações individuais. Em tempo oportuno deverá ser feita uma reforma de fundo que responda às exigências de justiça, solidariedade, e eficiência do sistema fiscal.

    Enfim, esta é a minha modesta opinião. Mas suponho que para si são apenas “histórias da carochinha só para putos” !!

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