O meu artigo para o jornal i deste fim de semana.
O canto da sereia
Através do investimento público, o Estado privilegia uns em detrimento de outros, algo indesejável num Estado de Direito.
No meio da convulsão que vivemos há meses, em que assistimos impávidos, mas nem sempre serenos, à derrocada do projecto de construção europeia, chega-nos aos ouvidos o canto da sereia. Diz-nos este, numa primeira estrofe, que as políticas de austeridade seguidas pelos Estados são más e recessivas. Destroem postos de trabalhos, fontes de rendimento, conduzindo muitos à ruína e ao desespero. E depois de nos apontar a catástrofe, indica-nos a solução que está em fabricar dinheiro, imprimir moeda para que os Estados possam continuar a investir, substituindo o investimento privado que se está a retrair. Se a primeira parte deste canto é parcialmente verdadeira, já a segunda é falsa e perigosa. Comecemos por esta.
Os benefícios do investimento do Estado na economia é dos maiores mitos de que há memória. Se é indispensável que o Estado leve a cabo certas funções, ele já se torna corrosivo quando se alarga a outras. Não só porque condiciona o comportamento das pessoas, como sucedeu com a bolha imobiliária, fruto de uma lei do arrendamento penalizadora dos proprietários e de benefícios fiscais resultantes do crédito à habitação, mas também, ao necessitar de financiamento para esses mesmos investimentos, concorre com os privados na sua obtenção, dificultando-lhes o acesso ao crédito. Não deixa de ser irónico que uma política que visa incentivar a economia, acabe por dificultar o acesso dos privados ao dinheiro e, consequentemente, a criação de postos de trabalho. Mas o pior de tudo é a conluio entre Estado e empresários que resulta deste tipo de investimento. Para o Estado investir são precisos empresários que façam o trabalho contratado e estes serão, necessariamente, os mais bem relacionados com o governo. Uma fotografia ao lado de um político pode valer ouro porque, mais importante que ser empreendedor, é conhecer os meandros do poder. Algo perverso, não apenas para a economia, mas também para a democracia e o conceito de Estado de Direito que queremos que prevaleça apesar dos tempos difíceis.
É natural que os cortes nas despesas que os governos estão a impor aos Estados, sejam negativos para as pessoas. Vivemos numa sociedade dependente do Estado onde poucos são os que conseguem ir longe se não forem coniventes com a administração pública. Até mesmo quem sempre lutou para ser independente do Estado, não trabalhando para ele, é prejudicado com os cortes na despesa pública, pois o seu trabalho depende do bem estar da economia e esta encontra-se condicionada pelas políticas seguidas no Terreiro do Paço.
Os problemas que atravessamos não resultam apenas da dívida, mas da falta de crescimento económico. Se o país que queremos tem de ser menos dependente do Estado é preciso, não que o Estado faça, mas que deixe fazer. Que se liberalize a actividade económica, para que os privados trabalhem sem a intromissão sufocante do poder político. É necessário que o governo facilite a vida das pessoas. Não de algumas, mas de todas. Um modo de o conseguir é através da liberalização da lei do arrendamento que permite a milhares de jovens iniciar a sua vida adulta, sem que tal implique uma dívida de 40 anos. A milhares de pessoas mudar de emprego e de cidade sem ter esperar por quem compre as suas casas. Uma nova lei do arrendamento, juntamente com a liberalização do mercado do trabalho, será uma fonte de financiamento da economia sem os juros cobrados no exterior e os custos inerentes ao investimento público. É uma das muitas medidas com que o governo deve avançar o mais rapidamente possível. O importante é que nunca repitamos o erro de favorecer empresários politicamente bem relacionados, como sucede com o investimento público. Em vez de estarmos sempre a ouvir que os políticos confiam na capacidade de sacrifício dos Portugueses, é altura de o governo aceitar que as pessoas sabem melhor que ninguém o que precisam para si, permitindo-lhes exercer os seus direitos sem condicionalismos de qualquer espécie.
Excelente artigo. Boa propaganda não é fácil de se escrever.
Sabe que Portugal tem uma percentagem de empresários maior que, por exemplo, os USA, não sabe?
???
Este artigo que é um artigo de propaganda de uma opção política, esquece uma coisa muito importante, numa democracia o Estado somos todos nós.
Assim, se os empresários não fizerem caminhar a economia num sentido que nos interesse a todos, é perfeitamente aceitável que nós todos, isto é, o Estado, tome posições na economia.
É lógico!
Eu acho que as Universidades Publicas deviam ser privatizadas e os alunos receberem um cheque ensino ou empréstimo (prefiro o empréstimo).
O seu custo seria menor para o estado e uma parte dos professores iria para a rua porque não estão lá a fazer quase nada e ganham demasiado bem.
Paulo Pereira escreveu:
“as Universidades Publicas deviam ser privatizadas e os alunos receberem um cheque ensino ou empréstimo (prefiro o empréstimo).”
Curioso, protesta-se contra a “mania” de comprar casa pois vai-se endividar um jovem por n anos e agora acha-se normal endividar o mesmo jovem por n anos para tirar um curso!
By the way, tenho um familiar que vive nos States e que pediu empréstimo para tirar um curso numa Universidade boa, boa e cara.
Apesar de já ter acabado o curso há vários anos e nunca ter estado desempregado, continua a viver na casa dos pais pois o pagamento do empréstimo do curso leva-lhe boa parte do ordenado…
“O seu custo seria menor para o estado”
???? Why??? Este tipo de bocas desprovidas de qualquer prova ou mesmo sentido devia ter consequências para quem as profere.
“uma parte dos professores iria para a rua porque não estão lá a fazer quase nada e ganham demasiado bem”
??? Mais bocas do tipo da anterior…
“Assim, se os empresários não fizerem caminhar a economia num sentido que nos interesse a todos, é perfeitamente aceitável que nós todos, isto é, o Estado, tome posições na economia.”
.
Ou seja é perfeitamente aceitável os empresários e todos os que não concordem contigo declararem a independência da tua “democracia”.
luckylucky escreveu:
” é perfeitamente aceitável os empresários e todos os que não concordem contigo declararem a independência da tua “democracia”.”
???? Ninguém falou em concordar ou discordar. O que escrevi é que se não houver empresários que realizem investimentos em funções consideradas necessárias pela sociedade, logicamente a sociedade através do Estado deve realizar este investimento.
O Raio:
“Assim, se os empresários não fizerem caminhar a economia num sentido que nos interesse a todos, é perfeitamente aceitável que nós todos, isto é, o Estado, tome posições na economia.
É lógico!”
Eu diria que é mais superficial. E é superficial porque ignora completamente duas questões essenciais:
1. Quem define qual é o “sentido que nos interesse a todos” e com que critérios?
2. Os resultados da “tomada de posições na economia” não são resultado de decretos mas do choque das acções (já que de intenções está o inferno cheio) com a realidade.
Por exemplo: interessa-nos a todos que o leite seja barato para que as famílias pobres o possam comprar?
Bem, interessa às famílias pobres que o leite seja barato mas quanto mais barato fôr o leite menos dinheiro ganham os produtores. Assim, o que é que interessa a todos? Talvez que o preço seja adequado e que os lucros dos produtores sejam justos?
Mas como é definido qual é o preço adequado para o leite e qual é o lucro justo para os produtores? E, como o preço e o lucro estão directamente ligados, como se pode garantir que ambos os objectivos são cumpridos?
O Estado vai subsidiar o leite, passando o custo para todos os contribuintes? E interessa a quem não bebe leite estar a pagar uma parte do preço do leite que os outros bebem?
O Estado pode passar a ser produtor de leite mas por que razão há-de o Estado fazer um melhor trabalho do que os privados (produzir o mesmo com custos mais baixos)? E se a produção fôr insuficiente? O Estado aumenta o preço do leite (tornando-o menos acessível às famílias pobres), compra-o ao estrangeiro (passa o custo para todos os contribuintes) ou decreta o aumento da produção?
Já agora, confia no Estado para definir o que lhe interessa a si? Se sim, então de certeza que não é um dos “indignados”/”ocupas” nem vai fazer greve.
A menos que ache que é “O Raio” quem melhor sabe o que interessa a todos independentemente de quantos concordem consigo, a característica que melhor define os “indignados”.