Tempo que passa

 

Com os 70 anos passados do início da Segunda Guerra Mundial, relatos em primeira mão do que se passou, da forma como se passou, começam a ser cada vez mais valiosos. Nunca damos valor ao que temos até que o perdemos. Falar com alguém que tenha estado na guerra, naquela guerra, a tenha sentido e ouvido os seus tambores começa a ser valioso. Há tempos, conversei com alguém cujo pai, alemão, combateu e foi capturado pelos russos, em 1945. O valor histórico disto é cada vez mais intenso. O modo como me vou recordar dessa conversa no futuro, assombroso. Com o passar do tempo, as lembranças em primeira mão vão-se, tal qual a memória e a nossa sensibilidade para o perigo que é a repetição dos nossos erros perante a história.

12 pensamentos sobre “Tempo que passa

  1. CN

    O maior erro de todos chamou-se Primeira Guerra Mundial (posso recordar que Mises e Hayek serviram pelos austríacos naturalmente, Mises com medalhas na frente Russa…recordemos que tudo começou porque a Áustria quis punir a Sérvia por ter incentivado um atentado terrorista ao seu herdeiro) em geral (que levou à queda das monarquias continentais bem mais civilizadas do que aquilo que as substituíu) e Versailles em particular (imposto já à República de Weimar – ficando esta com o mau nome – com um bloqueio alimentar a toda a população durante mais de 6 meses já depois do armistício).

    Feito o erro, todas as “concessões” feitas a Hitler (em sucessivas jogadas de força mais de improviso do que planeadas [AJP Taylor]) que correspoderam à reunião da população e território de cultura alemã deviam ter sido feitas por antecipação antes à própria república de Weimar, assumindo-se o que de errado tinha sido feito em Versailles.

    Uma das causas do “appeaseament” foi precisamente não só essa má consciência (recomeçar uma guerra por causas injustas…) como de resto, a própria população alemã (Sudetas, Danzig, etc) espalhada queria (demonstrado em sucessivos referendos) a reunião com a Alemanha.

    A outra lição é que Estaline ganhou em toda a linha a WWII e o Império Britânico perdeu (os impérios estavam a acabar mas não era necessário cair de forma súbita e no meio da total credibilização moral do comunismo em todo o mundo). A Polónia nem se fala.

  2. “conversei com alguém cujo pai, alemão, combateu e foi capturado pelos russos, em 1945”

    Não é difícil encontrar alemães com pais nessas condições. Incluindo muitos alemães que vivem em Portugal. Por exemplo, o meu amigo Franz-Georg Binder, que vive em Castelo de Vide, teve precisamente um pai que combateu contra os russsos e foi feito prisioneiro. Um destino deveras trivial para muitos alemães.

  3. lucklucky

    “O maior erro de todos chamou-se Primeira Guerra Mundial … tudo começou porque a Áustria quis punir a Sérvia por ter incentivado um atentado terrorista ao seu herdeiro.”

    A Primeira Guerra Mundial aconteceria sempre, o atentado foi só um pretexto. É só perceber o que ia dentro da cabeça do que pensava o Kaiser e a Elite Alemã. Para se chegar aí a formação da Alemanha alterou o periclitante equilíbrio Europeu com o Estado construído por Bismarck a ser a origem de muitos dos males que ainda sofremos hoje. Mas não foi só isso os povos estavam cheios de confiança e consequente arrogância devido ao crescimento proporcionado pela revolução industrial e todos esperançados que seria uma guerra rápida.

    “monarquias continentais bem mais civilizadas do que aquilo que as substituíu”

    Foram as Monarquias que provocaram a 1ªGuerra. Ou melhor, foi a sua aliança com um Estado autoritário moderno que nasceu e cresceu em poder ao lado de uma Monarquia em decadência.

  4. CN

    “A Primeira Guerra Mundial aconteceria sempre, o atentado foi só um pretexto. É só perceber o que ia dentro da cabeça do que pensava o Kaiser e a Elite Alemã.”

    Lá vamos nós para as “verdades” convenientes, desde quando é que o Kaiser queria o que quer que fosse na Europa Continental?

    Que “militarismo” era esse quando os Franceses com metade da população tinha o mesmo número de soldados que os alemães?

    Conte as guerras feitas pelos alemães pós-napoleão até há WWI = 3 (de curtíssima duração e pouquíssimas vítimas e sem conquistas territoriais no seu final)

    Guerras feitas pelos Ingleses = 10

    Quem mobilizou para ajudar um “Estado Terrorista” (a Sérvia) foi a França e a Rùssia (mas os russos ainda assim eram eslavos). Os alemães limitaram-se a fazer o que tinham de fazer para combater duas frentes ao mesmo tempo.

    “Foram as Monarquias que provocaram a 1ªGuerra. Ou melhor, foi a sua aliança com um Estado autoritário moderno que nasceu e cresceu em poder ao lado de uma Monarquia em decadência.”

    Os alemães tinham voto universal (masculino) desde 1871 (Bismark) para uma das Câmaras, muto antes que os ingleses.

    E os menos culpados são os primeiros, os mais culpados os que nada tinhma que se meter.

    Foi Churchill e não a monarquia inglesa que insistiu com a entrada na WWI. Felizmente já temos o “mainstream” Niall Fergusson a confirmar (apenas disse o que outros já diziam há muito tempo) que foi o maior erro da história inglesa.

    As monarquias já tentavam a paz quando entra o maluquinho do Woodrow Wilson a impedir o que sempre as monarquias fizeram: chegar a um acordo e status quo aceitável para todos.

  5. lucklucky

    “Lá vamos nós para as “verdades” convenientes, desde quando é que o Kaiser queria o que quer que fosse na Europa Continental?”

    Desde que foi alguém que deu demasiado poder aos Militares e lhes ainda reforçou mais a sua importància com as suas asneiras diplomáticas. A estrutura de poder Alemã foi criada por Bismarck e reforçada pela displicência e frivolidade do Kaiser.

    “Que “militarismo” era esse quando os Franceses com metade da população tinha o mesmo número de soldados que os alemães?”

    Antes da mobilização sim, mas é irrelevante.
    O militarismo é o grau de influência que os apoiantes de conquistas bélicas têm num Governo.
    Além disso os Militares Alemães tinham uma % da fatia do Orçamento comparado com outros países, superior á França.

    “Conte as guerras feitas pelos alemães pós-napoleão até há WWI = 3 (de curtíssima duração e pouquíssimas vítimas e sem conquistas territoriais no seu final)”

    Não anexou a Alsácia-Lorena na Guerra de 1870?!

    “Os alemães tinham voto universal (masculino) desde 1871 (Bismark) para uma das Câmaras, muto antes que os ingleses.”

    Não é bizarro estar a falar de voto universal com tantos elogios á Monarquia? Bismarck pode passar por cima do Monarca por exemplo e Governou como um corruptor e manipulador estendendo o Estado que de volta ás mãos da Monarquia e a Guilherme colocou a Alemanha na Primeira Guerra.

    “Foi Churchill e não a monarquia inglesa que insistiu com a entrada na WWI. Felizmente já temos o “mainstream” Niall Fergusson a confirmar (apenas disse o que outros já diziam há muito tempo) que foi o maior erro da história inglesa.”

    Pois deixar a Alemanha conquistar a França era do Interesse da Monarquia Inglesa assim como deixar intacta a frota Alemã…

    “E os menos culpados são os primeiros, os mais culpados os que nada tinhma que se meter.”

    Os Alemães podem defender os seus aliados, mas os Ingleses não…Porquê?

    “As monarquias já tentavam a paz quando entra o maluquinho do Woodrow Wilson a impedir o que sempre as monarquias fizeram: chegar a um acordo e status quo aceitável para todos.”

    Pois os Alemães queriam a Bélgica e mais um bocado da França. Está-se mesmo a ver…
    Os EUA entraram na Guerra depois de os submarinos Alemães deixarem de ter limites na sua campanha.
    Isso enfureceu Wilson.
    Estranho como a tentativa de paz não sucedeu antes de começar a Guerra com Monarquias tão inteligentes…

  6. CN

    lucklucky

    Isso são apenas considerações suas que a realidade nua e crua não demonstra.

    Pelos factos quem era imperialista e militarista (conte os navios e o exército e o número de conflitos, o orçamento claro, veja os campos de concentração na guerra dos Boers… ninguém nega as virtualidade do Império mas … era um Império!) em toda a linha era o Império Britânico.

    O Kaiser não tinha praticamente colónias nem nunca na vida quis qualquer conquista da França. Essa qualificações e adjectivos não passam de especulações sobre vontade e intenções do Kaiser em nada demonstráveis.

    Alsácia-lorena é um pormenor – a França fez a guerra com Bismark e perdeu e foi o elemento necessário (A-L sempre teve população alemã) para manter intacta a soberania territorial da França, tal como pequenas coisas nas outras (2) guerras (com a Àustria e Dinamarca – nada saiu de relevante em termos absolutos dessas duas … muito menos comparando com o que fizeram com a Alemanha e Áustria em Versailles)

    “Não é bizarro estar a falar de voto universal com tantos elogios á Monarquia? ”

    Diga me lá quantos parlamentos existem na Europa que não foram construidos pelas Monarquias?

    “Pois deixar a Alemanha conquistar a França”

    Mas que “conquista da França”? Os Franceses e os Russos é que mobilizaram contra a Alemanha em duas frentes. Se os alemães quisessem conquistar a França tinham feito isso em 1870 quando ganharam a guerra.

    “Pois os Alemães queriam a Bélgica e mais um bocado da França. Está-se mesmo a ver…
    Os EUA entraram na Guerra depois de os submarinos Alemães deixarem de ter limites na sua campanha.
    Isso enfureceu Wilson.
    Estranho como a tentativa de paz não sucedeu antes de começar a Guerra com Monarquias tão inteligentes…”

    Só nevoeiro quando os factos são conhecidos e (já) sem disputa. o Lusitânia afundado por submarinos tinha armamento. Loucos e de baixa moral são quem utiliza navios com passageiros civis para o fazer.

    Mas nem seria isso que poderia justificar a intervenção na EUropa. WIlson era anti-monárquico (como aparentemente o Lucky) e protestante (não ia na bola dos Habsburgos como representantes da contra-reforma católica contra o protestatismo) e completamente ingénuo e de idealismo baboco como só um americano consegue ser (eu gosto disso neles, mas é uma razão para se manterem quietos).

    Foi fazer a “guerra para acabar com as guerras” e o “mundo mais seguro para a democracia” quando de um lado e outros estavam impérios com rivalidades históricas e onde nada de ideológico estava em causa, apenas real politik.

    Quanto ao seu anti-monarquismo, o que caracteriza a “WWI” é que é precisamente a primeira guerra onde os aparelhos de Estado já tinham ultrapassado a estrutura directa de decisão monarquica.

  7. lucklucky

    “Pelos factos quem era imperialista e militarista (conte os navios e o exército e o número de conflitos, o orçamento claro, veja os campos de concentração na guerra dos Boers… ninguém nega as virtualidade do Império mas … era um Império!) em toda a linha era o Império Britânico.”

    Eu nunca disse que a Inglaterra não era um império e que não tinha coisas condenáveis, mas como estamos a falar da Europa e da 1ªGuerra Mundial . Não me viu a falar da expansão imperial Alemã desde África ás Ilhas Marschall no Pacifico, não havia muito mais para imperialisar também…

    “O Kaiser não tinha praticamente colónias nem nunca na vida quis qualquer conquista da França. Essa qualificações e adjectivos não passam de especulações sobre vontade e intenções do Kaiser em nada demonstráveis.”

    Leia o que escrevi. Foi mais por ineptitude e inconsciência.O desastrado comportamento publico do Kaiser, o seu apoio a uma muito maior militarização da Alemanha e a influência que deixou estado-maior ter assegurariam uma Guerra mais tarde ou mais cedo.

    “Alsácia-lorena é um pormenor – a França fez a guerra com Bismark e perdeu e foi o elemento necessário (A-L sempre teve população alemã) para manter intacta a soberania territorial da França, tal como pequenas coisas nas outras (2) guerras (com a Àustria e Dinamarca – nada saiu de relevante em termos absolutos dessas duas … muito menos comparando com o que fizeram com a Alemanha e Áustria em Versailles)”

    Nem Bismarck, que tenho criticado aqui por muitas razões, pensava assim. Era da opinião que se devia devolver a Alsásia-Lorena para a França não ser o eterno inimigo.

    “Diga me lá quantos parlamentos existem na Europa que não foram construidos pelas Monarquias?”

    Sim. E isso não tira poder ás Monarquias, enfraquecendo-as na sua opinião? Como tem tanto elogiado as Monarquias era de esperar que não elogiasse algo que lhes tira poder de facto.

    “Só nevoeiro quando os factos são conhecidos e (já) sem disputa. o Lusitânia afundado por submarinos tinha armamento. Loucos e de baixa moral são quem utiliza navios com passageiros civis para o fazer.”

    Sim, mas devia informar-se mais sobre o episódio do Lusitânia e de como Wilson tentou que não desse em Guerra.

    “Mas nem seria isso que poderia justificar a intervenção na EUropa. WIlson era anti-monárquico (como aparentemente o Lucky) e protestante (não ia na bola dos Habsburgos como representantes da contra-reforma católica contra o protestatismo) e completamente ingénuo e de idealismo baboco como só um americano consegue ser (eu gosto disso neles, mas é uma razão para se manterem quietos).”

    Longe disso. Wilson tentou a Paz em 1916. Foi Wilson que sugeriu a Paz sem Vencedores. http://www.mtholyoke.edu/acad/intrel/ww15.htm

    “Fortunately we have received very explicit assurances on this point. The statesmen of both of the groups of nations now arrayed against one another have said, in terms that could not be misinterpreted, that it was no part of the purpose they had in mind to crush their antagonists. But the implications of these assurances may not be equally to all–may not be the same on both sides of the water. I think it will be serviceable if I attempt to set forth what we understand them to be.

    They imply, first of all, that it must be a peace without victory. It is not pleasant to say this. I beg that I may be permitted to put my own interpretation upon it and that it may be understood that no other interpretation was in my thought. I am seeking only to face realities and to face them without soft concealments. Victory would mean peace forced upon the loser, a victor’s terms imposed upon the vanquished. It would be accepted in humiliation, under duress, at an intolerable sacrifice, and would leave a sting, a resentment, a bitter memory upon which terms of peace would rest, not permanently but only as upon quicksand. Only a peace between equals can last. Only a peace the very principle of which is equality and a common participation in a common benefit. The right state of mind, the right feeling between nations, is as necessary for a lasting peace as is the just settlement of vexed questions of territory or of racial and national allegiance.”

    “Quanto ao seu anti-monarquismo, o que caracteriza a “WWI” é que é precisamente a primeira guerra onde os aparelhos de Estado já tinham ultrapassado a estrutura directa de decisão monarquica.”

    É o que tenho dito não? E também o que a caracteriza é a Tecnologia.

  8. CN

    Lucky:

    Não existia nenhuma tratado dos Ingleses com a França (Nial Fergusson).

    A Alemanha não podia fazer outra coisa que não reagir perante duas frentes: derrotar os franceses em tempo recorde e deslocar as tropas para leste para se defender da Rússia.

    Quem não tinha nada que se meter foram os ingleses, mas devem isso à germanofobia crónica e hiper-imperialismo de Churchill (e com um gosto particular por guerras, embora tenha sempre desencadeado desastres como nos Boers, como foi destituído na WWI, como pensava que os velhos couraçadas seriam ainda arma válida na WWII, etc).

  9. lucklucky

    Então subitamente a realpolitik deixou de ter valor? Um Continente dominado pela Alemanha era do interesse dos Ingleses?

  10. CN

    Como disse no post acima (já agora leia os outros comentários anteriores):

    Em retrospectiva, se os alemães tivessem ganho na WWI, teriam com toda a certeza sido efectuadas mudanças minimalistas territoriais.

    Existiria monarquia na Alemanha e Áustria, e os comunistas não teriam conquistado o poder na Rússia (assim tivesse feito paz mais cedo). E depois, nem na China.

    Imagine that.

    PS: não sou germanófilo (será germanista?). A WWI representa sim o princípio do fim do Ocidente (ou o suicídio da civilização cristã como avisou o Papa Bento XV) tal como as guerras intra-Grécia foram o início do seu fim.

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