Tenho andado distraída ou é função da AR fiscalizar o governo?

Eu gostava que os detentores de cargos públicos tivessem alguma vergonha. Penso eu, que sou uma ingénua, que magistrados e políticos com cargos executivos deveriam ter alguma reserva no que dizem e na forma como comunicam com as pessoas. Porque, claro, as formas mais subtis podem conter – e contêm tantas vezes – pressões. José Sócrates a enviar um fax para o director da universidade onde estudava em papel timbrado do ministério do ambiente pode ser um simples abuso do dinheiro dos contribuintes (gastar papel e comunicações em proveito próprio) ou pode ser um lembrete “não me chumbe ou há represálias; olhe que eu falo todas as semanas com o ministro da educação”. Pela possibilidade de más interpretações, estas acções (porventura intencionalmente inocentes, vamos acreditar na bondade humana por momentos) devem ser evitadas por detentores de cargos públicos.

Com o caso Freeport, pelo melindre, as precauções deviam ser redobradas. Não faço ideia que conversas tiveram lugar entre o ministro da Justiça, Lopes da Mota e os procuradores responsáveis pela investigação. No entanto até as palavras que Lopes da Mota admite ter proferido (a comunicação da vontade de Sócrates, que quer o assunto resolvido rapidamente) são desadequadas e não podem ficar sem consequências. Mas as notícias dos recados do ministro e de Lopes da Mota, de tão graves, não podem ser ignoradas e esparar-se por um inquérito da PGR que, desconfia-se de antemão, não terá nenhumas conclusões. A actuação de Pinto Monteiro é lastimável: garante que não há pressões, contudo vai investigar e ameaça com processos disciplinares; quer saber se as pressões não passaram de uma “bricadeira”, como se alguma vez uma bricadeira tivesse lugar num caso que pode envolver um primeiro-ministro em suspeitas de corrupção; noticia-se que tentou que os procuradores que se dizem pressionados assinassem um documento afirmando não existirem pressões.

Li que o CDS quer ouvir o ministro da justiça. Está sozinho? O que espera o maior partido da oposição? E não pretendem ouvir também Lopes da Mota, Cândida Almeida, Pinto Monteiro, Vítor Magalhães, Paes de Faria? Há suspeitas do poder executivo a pressionar e condicionar o poder judicial e a AR faz nada? O tempo de não aproveitar politicamente o caso Freeport para não darem razões a vitimizações de Sócrates já passou; agora não agir é ser conivente com uma possível perversão do sistema democrático. Se isto continuar assim o meu boletim de voto das próximas legislativas leva com escritos não recomendáveis ou nem vou votar. Para quê?

7 pensamentos sobre “Tenho andado distraída ou é função da AR fiscalizar o governo?

  1. Clara França Martins

    Você ou é completamente ignorante ou finge-se de inocente. Porquê?
    1º Porque está a partir do princípio que há pressões governamentais, quando isso já foi desmentido e foram accionados os respectivos processos.
    2º Porque está a partir do princípio que o Presidente do Sindicato está a falar verdade, o que é tudo menos líquido.
    3º Porque a AR deve efectivamente fiscalizar o governo ,mas não lhe compete fiscalizar o Ministério Público.
    4º Porque o Ministro da Justiça já desmentiu as supostas pressões. Portanto, o que é que ele vai fazer à AR? Desmentir outa vez? Andamos a brincar?

  2. Está a ver, Maria João, porque é que concordámos um dia, na sua amável resposta a um comentário meu, ainda no blogue Atlântico, que só com “uma nova geração de políticos”, com uma nova mentalidade, é que isto lá vai?
    E quem diz os políticos, diz a administração pública em geral, os lugares-chave, que está quase toda politizada…
    Quanto a votar: pessoalmente, só por motivos de força maior é que não votaria. Mesmo sem quaisquer expectativas, para não sofrer decepções, mas é o único acto cívico que posso exercer e de que vejo resultados quase imediatos. Dos outros, podem esperar-se décadas.

  3. Luís Lavoura

    “magistrados e políticos com cargos executivos deveriam ter alguma reserva no que dizem e na forma como comunicam com as pessoas”

    Muito bem, concordo, absolutamente.

    Em especial a procuradora Cândida Almeida, que passa a vida a falar para os mídia, a falar muito, a falar de mais, quando deveria estar calada, se é que quer ter como profissão aquela que tem e não uma outra qualquer.

  4. Nuno Gouveia

    Interessante o primeiro comentário. A ignorância é de facto inimiga da razão.

    A ‘expert’ afirma que “Porque está a partir do princípio que há pressões governamentais, quando isso já foi desmentido e foram accionados os respectivos processos.”

    Ora, foram desmentidas as pressões, mas na dúvida, abriu-se um processo para averiguar se de facto existiram as mesmas pressões. A ‘expert’ Clara França Martins nessa mesma frase assume uma contradição e nem sequer o percebe. Enfim…

  5. Maria João Marques

    Clara França Martins, o seu comentário é tão absurdo que quase me custa responder-lhe – além de, bem ao jeito da esquerda, atacar a pessoa em vez da opinião. Se não leu, eu repito: não sei se houve pressões; sei que os desmentidos dos que supostamente pressionaram valem muito pouco. Ou a Clara acha suficiente que alguém afirme categoricamente que não fez determinada acção para ser acreditado de imediato pela sociedade? Seria uma teoria bonita para os tribunais e para a investigação criminal, sim senhora. Sei também que é preciso investigar, e à séria e sem ser só fogo de vista. Sei, ainda, que Cândida Almeida e Pinto Monteiro têm sido lamentáveis neste processo. Sei, por último, que a AR deve fiscalizar o governo e, neste caso, para isso, é necessário ouvir o que os alegados magistrados pressionados dizem sobre o assunto.

    Ana, eu também vou acabar por ir votar. Conheço-me. Mas garanto que muitas vezes acho que os meus eleitos não merecem.

  6. nem estranho não estranhar

    Concordo em absoluto com a Maria João, até no pensar que não deve votar mas tem de ir votar. Por mim, é para acabar de vez com o Centrão. Estou farto desta corja. Toda. Voto no contra. Mais uma vez. Lamento tê-lo feito na última, pecador me confesso. Mas se não sei que caminho seguir, sei que não vou por ali. Embora não acredite ser fácil, num estalar de dedos ou com uma cruz no boletim, mudar muito. Muito menos, mudar de imediato. Mas desfalecer, nunca. Ou é o abismo.

    Parabéns.

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