Em resposta a este meu post, o Vasco Campilho acusa-me de não fazer “análise política”, mas sim um “processo de intenção”, a propósito da entrevista de Passos Coelho, perguntando-me se não me ocorria que a posição de Passos Coelho representava o seu verdadeiro pensamento acerca da questão do TGV. Aparentemente, não ocorreu ao Vasco que essa hipótese me tenha ocorrido a mim, apenas não me tenha parecido plausível, por razões que não são difíceis de explicar.
Quando se candidatou à liderança do PSD, Passos Coelho apareceu com uma retórica de “ruptura”, apresentando-se como “liberal” e pretendendo propôr uma série de reformas profundas no país. Depois, andou aos abraços com Menezes. Aos meus míopes olhos, estas duas atitudes não “batiam certo”. A não ser que nenhuma delas representasse uma visão política de Passos Coelho acerca dos problemas do país e do PSD, e ambas representassem, isso sim, uma postura mais lata de Passos Coelho, que tentando colher apoios aqui e ali, estaria sempre pronto, como Zelig, ser o que o seu interlocutor queria que ele fosse: para os “liberais” da blogosfera, Passos Coelho ia à televisão dizendo-se liberal; para os “menezistas” receosos das “elites” de Ferreira Leite, um candidato pacificador que não queria “romper” com nada nem ninguém. O meu “processo de intenção” a Passos Coelho, longe de ser uma tentativa de “criar factos políticos a partir de ar puro, de forma a despoletar uma dinâmica de luta faccionalista que favoreça a purga” que supostamente desejo para o PSD (o que tenho dito não expressa propriamente um “desejo” de purga, apenas acho que dentro do PSD convivem duas agendas incompatíveis, e uma delas terá forçosamente de se impôr à outra, nem que seja apenas de forma provisória. Se ele quiser que eu explique outra vez exactamente o que penso, não tenho problemas em fazê-lo), decorre, ao contrário, dessa minha percepção dos tempos da eleição da liderança: é verdade que posso estar enganado, mas penso genuinamente que a declaração de Passos Coelho acerca do TGV é meramente táctica, porque isso “bate certo” com a interpretação que fiz de outras atitudes suas.
Até porque ao contrário do que o Vasco pensa, eu não coloco Passos Coelho como o “cordeiro sacrificial da purificação do PSD”. Eu não acho que Passos Coelho faça parte do tal “partido autárquico” que penso ser incompatível com um PSD que faça, a nível nacional, as reformas que o país precisa. Não acho que Passos Coelho seja como Menezes. Acho que é alguém que, como Marcelo Rebelo de Sousa, diz o que for preciso para promover a sua agenda pessoal, e que, das duas uma, ou não percebe a natureza do problema do PSD (e portanto não tem condições para ser um bom líder), ou percebe e não quer saber (o que também não o recomenda especialmente).
O problema de Passos Coelho não é ser como Menezes, não é o de ser uma ameaça ao futuro do PSD, é o de não acrescentar nada, mas ao mesmo tempo, ser alvo de uma atenção desmedida, que, por não se traduzir em nada que contribua para resolver os problemas do PSD e do país, só contribui para os agravar. Passos Coelho é como Di Maria no Benfica: obviamente, não é um pé torto como Binya ou uma nódoa como Balboa, e até sabe fazer umas fintas e marcar uns golos bonitos. Mas como a comunicação social e quem só vê os dois minutos dos resumos dos jogos pensam que ele é um génio, há uma certa pressão para pô-lo a jogar. No entanto, como ele não faz mais do que uns meros fogachos, a sua entrada na equipa, embora rendendo um outro golo de vez em quando e um outro momento mais espectacular, significa, na maior parte do tempo, que o Benfica joga com um a menos (a maior parte das vezes que a bola vai parar aqueles pézinhos, acaba por ser igual a fazer um passe para o adversário). E se o Benfica até pode lucrar com a ilusão de que Di Maria é um grande jogador, vendendo-o ao Real Madrid (que tem o triste hábito de cair nestas esparrelas), o PSD só tem a perder com a injustificada atenção de que Passos Coelho é alvo. Se fosse devolvido à sua verdadeira dimensão, ele não seria qualquer problema. Passos Coelho não precisa de ser “sacrificado”. Apenas seria preciso que as pessoas abrissem os olhos e percebessem bem o que tem à sua frente, para ele deixar de ser um problema.
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