1 ano de Médio Oriente – O motor de crescimento

Desenganem-se aqueles que pensam que o desenvolvimento do Dubai se deve às receitas do petróleo. As receitas do petróleo são hoje insignificantes no total do PIB do Dubai. Com um dos aeroportos mais ocupados do Mundo, o Dubai é hoje uma plataforma giratória para negócios nos países do Médio Oriente, África e Subcontinente indiano. Um ambiente business-friendly, um estilo de vida ocidentalizado e, mais uma vez, a não existência de impostos sobre o rendimento, fazem com que executivos do Uganda ao Afeganistão, passando pela Arábia Saudita, Iraque e até a Rússia, optem por estabelecer residência nesta cidade. Da mesma forma, as empresas a operar nesses países preferem estabalecer as suas sedes no Dubai. Algumas gerem mesmo as suas operações a partir daqui.

Outra das fontes de receita da Cidade é o turismo, provavelmente a menos previsível de todas, tendo em conta a falta de belezas naturais ou interesse histórico do Dubai. Já tendo passado pela experiência de ter que mostrar a cidade a visitantes, posso assegurar que é extremamente complicado encontrar atractivos semelhantes aos que se encontram noutras cidades do mundo. Todos os atractivos deste país são artificiais e construídos nos últimos 10 anos: lagos artificiais, ilhas artificiais, montanhas de neve artificiais, hotéis esplendorosos e edifícios que batem um qualquer record. Também assim se compreende a procura incessante de novas formas de surpreender e manter-se sob as atenções do Mundo. É neste contexto que surje a Falconcity of Wonders que se prepara para revolucionar o turismo mundial, concentrado num só local réplicas em tamanho real da torre Eiffel, do Taj Mahal, Torre de Pisa, Pirâmides de Gizé, etc. O Dubai, não tendo qualquer tipo de passado para oferecer ao turista, está a construí-lo hoje. Não se pense porém que estas ideias são financiadas por dinheiros públicos. Na altura em que escrevo este post, ainda este desenvolvimento imobiliário está só no papel e já foi pago quase na íntegra por investidores privados. Hotéis, moradias e apartamentos das duas primeiras fases do empreendimento foram todos vendidos ainda no papel. Claro que tal só é possível com uma administração pública ágil a aprovar projectos, que tenha em maior consideração qualidade de vida dos seres humanos que de outros seres vivos. Em Portugal qualquer um dos empreendimentos que fazem furor no Dubai demorariam anos, décadas, a ser analisados e muito provavelmente seriam rejeitados pelos seus efeitos perversos no crescimento do Eucalipto de Rio Maior, no stress da abelha preta ou na reprodução do salmão. Veja-se como exemplo o caso da Nautilus, um projecto que seria vulgar no Dubai, mas se revelou demasiado ambicioso para o Algarve.

24 pensamentos sobre “1 ano de Médio Oriente – O motor de crescimento

  1. CN

    CGP: A tese de Hoppe sobre a superioridade da monarquia absoluta (o monarca como proprietário do Reino está interessado em rentabilizar e manter eficiente o seu Reino ao mesmo tempo que está consciente que para manter o seu convenant não pode ser arbitrário nem injusto com os seus cidadãos) em relação à democracia parece aqui amplamente demonstrada. Podemos falar aqui de uma monarquia absoluta iluminada (numa entrevista ao “60 minutes” disse que adorava a america a os americanos onde investe e passa muito tempo mas não gostava da sua política externa).

  2. CN, discordo em geral com a tese. O problema das monarquias absolutas é que o seu destino depende sempre do entendimento do monarca sobre o que é positivo para o reino. Todos os países do golfo são monarquias absolutas ou algo próximo e no entanto as diferenças são extraordinárias entre o Dubai, o Bahrain, ou o Qatar e a Arábia Saudita ou o Yemen, por exemplo. Aliás, dentro dos próprios EAU, existem grandes diferenças entre Emiratos. Dito isto, é evidente para mim que o desenvolvimento do Dubai, Bahrain ou Qatar não teria sido possível em democracia e, não surpreendentemente, dos Emiratis com quem vou falando, nenhum sente falta dela.

  3. CN

    “O problema das monarquias absolutas é que o seu destino depende sempre do entendimento do monarca sobre o que é positivo para o reino.”

    Uso o termo “absoluto” no sentido que a monarquia tem poderes executivos e é proprietário, não no sentido “absoluto” com conotações totalitárias (de resto, o totalitarismo é mais característica das repúblicas). Assim, uma monarquia “absoluta” é compatível com noções de representação tipo parlamentar mas não com as características universais (tende a ser proprietários e/ou pagadores de impostos ou taxas).

    Nesse sentido, vejo Hoppe “vindicado” – os lugares mais estáveis no médio oriente são monarquias absolutas. É essa comparação intra-cultural que deve ser feita.

    As democracias (no sentido “macro” e voto universal) também têm o mesmo problema que aponta para muito pior.

    Mas a dimensão aqui conta muito. è um dado pouco equacionado em ciência política. Numa pequena soberania, o tipo de regime nem é muito importante, dado que a sua pequena dimensão combate os males próprios de cada tipo de regime (na monarquia absoluta, da democracia, da república, da autocracia).

    E assim, se a Arábia Saudita será menos bom, é porque a sua dimensão é maior e a família muito mais alargada (o Rei teve de casar com todas as linhas tribais para unir à volta de um Estado e isso conduz a problemas).

  4. CN

    Já agora, o argumento de Hoppe não é pela monarquia absoluta (no sentido que referi) mas pelo mau menor desta em relação a democracias republicanas de voto universal cuja consequência inevitável será sempre o centralismo social-democrata. E o argumento parece-me validado se olharmos para todos as pequenos Principados que (ainda) existem e existiram. Como já disse, neste argumento, o “pequeno” é um factor grande.

  5. “Não se pense porém que estas ideias são financiadas por dinheiros públicos. Na altura em que escrevo este post, ainda este desenvolvimento imobiliário está só no papel e já foi pago quase na íntegra por investidores privados.”

    A ideia que eu tinha era que grande parte do desenvolvimento imobiliário do Dubai era por iniciativa de empresas mais ou menos estatais (se calhar estava completamente enganado).

    É verdade que iniciativa estatal e investimento privado não são necessariamente contradiórias (podemos ter empresas estatais a lançar projectos e a arranjar sócios privados para entrarem com o capital).

    Será que o Carlos poderia dar-me alguma luz sobre o assunto?

  6. Diga-se de passagem que, quando vejo imagens do Dubai na televisão, acho aquilo horroroso (faz-me lembrar Vilamoura, de que também não gosto), mas eu provavelmente tenho gostos estético-urbanisticos um bocado peculiares (após visitar outro país árabe, uma amiga disse-me – a respeito desse outro país – “aquilo é muito desorganizado, muito sujo, tu devias adorar!”)

  7. Diga-se que, quando vejo imagens do Dubai na televisão, acho aquilo horroroso (faz-me lembrar Vilamoura, que também não gosto), mas talvez seja eu que tenha preferências estetico-urbanisticas um bocado peculiares (a respeito de outro país árabe, uma amiga uma vez disse-me “aquilo é muito desorganizado, muito sujo, tu devias adorar!”)

  8. JC

    Tanto entusiasmo com o Dubai, esquece que este emirado é apenas a porta de negócios dos EAU e que a sua prosperidade é uma espécie de labareda cuja perenidade é igual à de todas as labaredas.
    É justamente pelo Dubai que passa o grosso dos negócios com os quais o Irão vai fugindo às sanções. Neste preciso momento o emirado está a ser encostado à parede por causa disso. De facto vive do petróleo e dos negócios com ele relacionados e a maior parte dos 400 000 iranianos que vivem nos EAU estão precisamente no Dubai. O Dubai é de resto o principal parceiro comercial do Irão.
    Quando e se o petróleo deixar de ser o paradigma, o Dubai terá areia, como sempre, porque os negócios com o petróleo deixarão de ser tão lucrativos.

    E quando as coisas aquecerem com o Irão, o Dubai vai tb por água abaixo. As empresas ocidentais que aqui se estabeleceram, já estão a sentir o lume a aquecer debaixo do rabo, devido ao endurecimento das sanções.

    O Dubai é um mero castelo de cartas, assente em areia…

  9. ferro

    não sei até que ponto -o carlos guimarães saberá dize-lo- os “empreendimentos” serão descaracterizadores/perturbadores da paisagem. A minha ideia do dubai é aquilo deve parecer uma disneylandia do betão.

  10. Carlos Guimarães Pinto

    Miguel,

    É verdade que algumas das empresas imobiliárias que iniciam estes projectos são, pelo menos parcialmente, públicas. Mas os projectos são vendidos a privados ainda em plano. O papel dessas empresas é apenas o de criar o conceito dos desenvolvimentos e, claro, ter a reputação de concluir os conceitos que imagina. De resto, concordo, o mais semelhante em Portugal aos desenvolvimentos imobiliários do Dubai será Vilamoura. Claro que isto refere-se apenas aos empreendimentos mais simples…

  11. “Demasiado ambicioso para o Algarve”!!!
    Sou um leitor ocasional deste blog e como algarvio que ama a sua terra vejo-me obrigado a sair a terreiro em defesa de um pormenor ao qual me parece o Sr Carlos Guimarães Pinto dá pouca importância.
    Refiro-me claro está, à Verdade.
    Parabéns pela sua estada no Dubai, mas os efeitos secundários dos petrodólares e a isenção fiscal parecem estar a fazer-se sentir.
    O Nautilus nunca foi uma possibilidade séria. Quer em termos de engenharia civil, solos arenosos e as correntes atlânticas. Quer em termos ambientais, implantar uma estrutura destas no Parque Natural da Ria Formosa?
    Curioso seria falar com os técnicos que efectuaram os desenhos e o projecto que foi alvo de uma grande publicidade e reportagens no Expresso. Visto que entretanto O Vale do Lobo foi vendido à CGD. Já era sabido que não seria possivel mas entretanto cravou-se mais uns milhõies a uns gestores públicos
    incautos e irresponsáveis.

    “Claro que tal só é possível com uma administração pública ágil a aprovar projectos, que tenha em maior consideração qualidade de vida dos seres humanos que de outros seres vivos.”

    Sabe o quão mal classificados estão aos EAU em termos de Desenvolvimento Sustentável e o Dubai?
    O Sr saberá melhor do que eu que mesmo com todos os benefícios que os cidadãos têm do seu “déspota iluminado” há cada vez mais fricção face aos estrangeiros?

  12. Carlos Guimarães Pinto

    “Sabe o quão mal classificados estão aos EAU em termos de Desenvolvimento Sustentável e o Dubai?”
    Sabe o quanto se preocupam com isso os habitantes da cidade?

    “O Sr saberá melhor do que eu que mesmo com todos os benefícios que os cidadãos têm do seu “déspota iluminado” há cada vez mais fricção face aos estrangeiros?”
    Sinceramente a única fricção que noto é entre os estrangeiros, à noite. Daquela fricção que também o Algarve tem no Verão: a boa, se é que me faço entender.
    Mais a sério, fricção com estrangeiros existe em todo o lado. No entanto, no Dubai cerca de 90% dos cidadãos são estrangeiros. Nos EAU, apenas um emirato tem mais emiratis que estrangeiros. E a tendência é para aumentar. Se chama a isto fricção…

  13. Caríssimo aceito (uma vez infelizmente não conheço o Dubai) que os emiritis amam os estrangeiros!Sem problemas, na boinha…
    Também aceito, que os emiratis estejam a fazer “maravilhas” na urbanização Dubai! Aliás se não fossem os constrangimentos ambientais que a UE impõe, baseados nas melhores práticas de certos países da Escandinávia, e do Centro da Europa. Ainda bem que nos EAU não existem esses bloqueios ao desenvolvimento!
    Apenas que para o argumento que defendeu o projecto Nautilus não se adequa.
    Aliás aquilo nunca deveria ter sido chamado de projecto, pois quem olhasse para aquilo com olhos de ver via que por várias razões não tinha pernas para andar. Pela qualidade da desinformação que temos tido nos últimos anos mais uma vez a comunicação social apanhou as coisas pela rama, indizundo muitos em erro.

    Demasiado ambicioso sou eu e mais uns poucos que estão fartos deste modelo de desenvolvimento associado ao cimento para o Algarve. Aliás, fui (sou) sócio de uma empresa de construção civil. É que por rimarem, não significa que sejam sinónimos.
    O Algarve quer mais, o Algarve merece tudo, o Algarve pode e deve ser melhor.
    Saudações Remexidas.

  14. lucklucky

    Só se cresce fazendo todos os passos. Países ricos podem colocar mais exigências, há mais riqueza para se tolerar crescer menos. Mas é completamente idiota Portugal mais pobre colocar as mesmas restrições que se colocam em países mais ricos.

  15. Caro lucklucky, eu reconheço que sou um idiota, não sei considera a Costa Rica um país rico mas têm um modelo de desenvolvimento sustentável.
    Concordo que países em diferentes estados de desenvolvimento devem ter restrições diferentes. Conheço o trabalho de Chang o “Kicking away the ladder” e
    fortalece esse argumento, no entanto não considero que se aplique às políticas
    ambientais devido às externidades(à portuguesa) negativas.
    Políticas económicas diferenciadas sim, aplicando o princípio da subsídiaridade.
    Realmente tenho de concordar a toda a linha com Dorean Paroxales.

  16. Caro CGP, existem comparações que nem sempre funcionam. Repare que em Portugal, felizmente, vivemos num sistema democrático de constante fiscalização do governo (admito que por vezes isto seja preverso, mas é uma conversa para outra altura) enquanto o Dubai é uma monarquia (eles têm um nome específico, emirado ou coisa assim), ou seja, as decisões só dependem de uma pessoa. O Dubai até pode ter enormes investimentos e não sei o que mais, mas coloco dúvidas à sustentabilidade do caminho que eles estão a seguir, aliás, como o próprio CGP referiu, eles não têm tradição nenhuma e a única atracção que têm é um monte de empreendimentos com menos de dez anos…

  17. lucklucky

    “Conheço o trabalho de Chang o “Kicking away the ladder” e
    fortalece esse argumento, no entanto não considero que se aplique às políticas
    ambientais devido às externidades(à portuguesa) negativas.”

    Não se consegue fazer nada sem afectar o ambiente, mais ou menos existe sempre uma perda e um ganho, por vezes desiguais , mas sem o carvão nunca teríamos chegado ao desenvolvimento económico onde chegámos, sem o petróleo também não, as torres de betão existem por causa da nossa pobreza, senão toda a gente tinha vivendas… são só exemplos . Os Holandeses por exemplo passaram o Séc XX a afectar o ambiente, veio daí mal ao mundo? Resumindo somos pobres mas fazemos tudo para que a nossa produção seja cara. Queremos estar na frente do desenvolvimento económico mas a rigidez a todos os níveis é norma.

    Faça um exercício imagine-se no Séc XIX e tente imaginar a sua atitude em relação ao carvão e a chaminés fumegantes.

  18. Carlos Guimarães Pinto

    Caro Tiago,

    Os monumentos que hoje apreciamos em muitas cidades pelo Mundo fora, já foram todos “empreendimentos com menos de 10 anos”. Existe mais valor numa atracção turística do que a sua idade. Quando a FalconCity estiver terminada, certamente haverá muitos turistas a querer visitá-la. Estarei errado?

  19. CN

    “vivemos num sistema democrático de constante fiscalização do governo (admito que por vezes isto seja preverso, mas é uma conversa para outra altura) enquanto o Dubai é uma monarquia”

    Ser uma monarquia (principalmente num pequeno país) é uma enorme vantagem, um príncipe sabe que tem de deixar o seu “real state” à geração seguinte e em contínuo, isso aumenta em muito a sua capacidade de pensar a longo prazo procurando rentabilizar por um lado e não explorar os cidadãos por outro precisamente porque a sustentação do seu poder é baseada mais num “convenant” do que num processo eleitoral, as democracias de voto universal têm todos os incentivos para pensar a curto prazo e à tentativa de exploração (ainda que inconsciente) de uns aos outros.

  20. Lucklucky: Nem iria pensar nisso, dado que devido aos meus antecedentes, teria de trabalhar do nascer ao pôr-do-sol.
    Não existiam soluções tecnológicas energéticas alternativas ao carvão, talvez só a madeira, que era mais cara.
    A questão é que hoje estamos na segundo lustro do século XXI e temos informação que não estava disponível no século XXI. Hoje há “liberdade para escolher” como dizia Friedman.
    Existe sempre como diz, e muito bem um custo-benefício ambiental. A questão e creio que é neste ponto que divergimos
    é que na minha opinião quando a relação é demasiado assimétrica em desfavor do ambiente devem existir, regulamentações, restrições, ou mesmo até proibições.

    “Os Holandeses por exemplo passaram o Séc XX a afectar o ambiente, veio daí mal ao mundo?”
    Será que o progressivo aumento do nível médio do mar se deve apenas ao aquecimento global, ou ganhar terra ao mar, tem efeitos negativos.

    Quanto à rigidez, ela existe a alguns níveis, mas não é para todos. Vejam-se por exemplo os projectos PIN ou a “falta de rigidez” no sector segurador. A regra parece ser quanto maior e abonado o agente menor a rigidez.

  21. CGP a questão da sustentabilidade era secundária, a questão essencial era que o Dubai é uma monarquia em que o poder é absoluto para uma só pessoa. Como tal, é incomparável à realidade portuguesa em que tudo é sujeito a debate. Acho estranho que se considerem essas políticas boas aqui no Insurgente que é o blogue que conheço que melhor defende os valores do liberalismo (dos quais partilho).

    um abraço

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