“há pessoas que deviam ser diabéticos”

Tomas Vasques, no seu Facebook, sobre Diabetes:

O Ministério da Saúde está muito preocupado porque, em 2013, se gastaram 575 mil euros por dia em medicamentos para diabéticos. Sabendo que existem cerca de 1 milhão de diabéticos, em Portugal, significa que cada doente, em média, consumiu em medicamentos 60 cêntimos por dia. Repito 60 cêntimos. Se se preocupassem com os milhões consumidos pelas PPPs, swaps e outras benesses dadas aos bancos, os diabéticos deste país agradeciam.

Comecemos pelos números: Tomas Vasques aponta para este artigo do Público (não riam, vá) para justificar o seu “1 milhão de diabéticos”. Se ele visse o relatório “Diabetes: Factos e Números – 2013”, aqui disponível na página da DGS, ele saberia 2 coisas:

  1. Dos supostos “1 milhão”, como é visível na página 10 do relatório e vem mencionado no artigo do Público, 44% são “não diagnosticados”. Gostava de saber quanto dinheiro é gasto com esses 44% não diagnosticados.
  2. Sobre os 575 mil Euros por dia (ou 210 Milhões por ano): como é visível na página 63 do relatório, esse é apenas um dos custos que o Estado tem com a diabetes, que é estimado ser entre 1250 a 1500 Milhões por ano – 8 a 9% dos gastos com saúde em Portugal.
  3. Se vai usar o argumento do rácio “gasto por cidadão”, porque usar um numerador menor e um denominador maior? Dá mais “pontos” por os números não serem já antes relevantes?

Gostando de ter os números corretos, chamei a atenção. A resposta? Podem ler aqui.

Vou-me ditar, mas antes digo: há pessoas que deviam ser diabéticos.

Superioridade moral? Certo, certo…

E eu, o que desejo para este Jurista, “liberal à moda antiga”? Desejo apenas tempo. Tempo para pensar. Para ser coerente. E porque a questão de fundo aqui é muito mais preocupante que a dos números, ficam algumas questões para ajudar o Tomás a pensar:

  1. Eu também não concordo com os “milhões consumidos pelas PPPs, swaps e outras benesses dadas aos bancos”. Mas o que tem isso a ver com o caso aqui? Então “se se gasta mal em A, tem que se compensar gastando mal em B”?
    Isso é argumento, mesmo para um jurista?
  2. Assumindo que ele não tinha puxado pela e-nésima vez do argumento falacioso anterior, qual é a perspectiva do Tomás sobre a despesa estatal com a saúde? Uma vez criada a rubrica da despesa, é sacrossanta e indiscutível? Nunca se pode descer um cêntimo ou sequer se mostrar preocupação com os valores gastos?
  3. Assumindo que os cortes são impossíveis, a subida da despesa é inevitável. O que acontece quando ela atingir 20% do PIB? E 30%? E 50%? Qual é o limite?
  4. Há alguma preocupação com o modo como o dinheiro é gasto, ou apenas com o atirar mais dinheiro para a rubrica? É discutível em que são gastos os fundos para a saúde em Portugal, ou dá-se sempre preferência ao uso anterior dos fundos?
  5. Assumindo que a preocupação é honesta e não apenas uma jogada para se posicionar, se se preocupa tanto com o tema, o que é que alguma vez fez para ajudar a debelar o problema? Ou o seu apoio é apenas o apelo à “caridade forçada”?

Eu sou da opinião que numa sociedade democrática tudo deve ser discutido.
Eu sou da opinião que numa sociedade de recursos limitados tudo deve ser pesado, e que muitas vezes é possível oferecer mais com menos gastos.
Eu sou da opinião que numa sociedade inclusiva todos devem ser apoiados – e não apenas os diabéticos, e não apenas com o subsidiozinho.
Eu sou da opinião que numa sociedade eficiente, em que o Estado deixasse a sociedade resolver os problemas, mais cuidados de saúde seriam oferecidos a mais pacientes.

O Tomás é da opinião que eu deveria ser diabético.