O que se vê e o que não se vê

Segundo a RTP (a mostrar como está sempre pronta a fazer propaganda), um estudo do Observatório do QREN chegou à conclusão de que empresas que recebem apoios públicos criam em média mais dois postos de trabalho, e que nos últimos três anos, cerca de 8000 postos foram criados por empresas beneficiadas por estes “incentivos”. O tom da coisa era grandioso, como se com um singelo minuto e meio de reportagem o estatismo tivesse sido redimido e provado verdadeiro, em toda a sua glória.

Se fosse vivo, um certo senhor francês (imagine-se) faria a gentileza de lhes explicar como o dito estudo fala apenas do positivo efeito “que se vê”, mas ignora olimpicamente o negativo custo “que não se vê”. Satisfeitos por verem os “incentivos” públicos permitirem às empresas que os receberam criar empregos, tendemos a esquecer que o dinheiro para pagar os ditos “incentivos” teve que vir de qualquer lado – tendo em conta que o “negócio” do Estado é obter receita dos cidadãos, todo e qualquer “apoio” que este dê é proveniente do dinheiro dos indivíduos e empresas que, com os seus impostos, financiam a “generosidade” pública. Esse dinheiro que tanto jeito deu aos que dele beneficiaram terá certamente feito alguma falta aos que dele tiveram de abdicar. Infelizmente, o estudo não diz quantos empregos se perderam por um restaurante ter perdido dinheiro com a subida do IVA, ou por uma empresa não poder suportar os descontos para a Segurança Social de um dos seus empregados.

O estudo ignora também um outro aspecto pernicioso desta aparentemente positiva criação de postos de trabalho: ela resulta apenas e só da decisão política de atribuir a esta ou àquela empresa o “apoio”, em detrimento de outra. Enquanto que numa “normal” situação de “mercado”, uma empresa é “premiada” através da preferência individual de cada um dos “clientes” que a ela recorrem, sempre que o Estado escolhe dar o seu “apoio” a uma e não a outra, está a fazê-lo independentemente dessas livres preferências das pessoas. A obtenção do “apoio” depende assim, não da satisfação dos interesses dos potenciais clientes, mas (na melhor das hipóteses) da navegação eficaz no mar burocrático que o Estado português traz para tudo o que faz, ou (na pior das hipóteses) na satisfação dos agentes do “mercado” de “influências”, que pelos vistos nunca está em crise no nosso país. Aqueles 8000 postos de trabalho são, é verdade, 8000 pessoas que estão empregadas e têm a sua vida melhorada em resultado disso. Mas as incontáveis que viram o seu rendimento diminuir ou o seu emprego desaparecer também. E não é por não darem jeito à propaganda que têm menos importância.

9 pensamentos sobre “O que se vê e o que não se vê

  1. João

    A conclusão deste estudo devia ser “empresas públicas, têm, em média, 2 empregados a mais”

  2. Euro2cent

    > da navegação eficaz no mar burocrático que o Estado português traz

    Ah, pois, isso também cria emprego. Há empresas de consultores que se dedicam à produtiva tarefa de preparar candidaturas aos subsídios.

    É claro que esse dinheiro não vai para produzir sapatos ou beterrabas que se comam ou exportem, mas pelo menos ficamos com uns PDFs catitas, com uns quadros demonstrativos muito bem preenchidos.

    (Se houver “fundos comunitários” ao barulho, então é que é ver deitar dinheiro à rua a sério. Sim, porque os “fundos” pagam metade do que se deitar fora, dá lucro!)

  3. Sérgio

    O estudo que chega à conclusão de que a criação de 1 emprego público destrói 2 no privado, também nunca é referido!

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